Sabemos que a COVID-19 afetou o planeta inteiro, e isso nem precisava estar aqui, neste texto. Porém, entre todos os setores que foram afetados diretamente, o de varejo foi o que mais despertou interesse e ligou o sinal de alerta. Agora, com os resultados do último trimestre da Via Varejo (BOV:VVAR3), podemos entender o que está acontecendo de fato.
Nos números frios do 3T20, o Ebitda da Via Varejo foi de R$ 609 milhões, com aumento de 280,6%, resultado bem acima da expectativa. A margem ficou em 7,8%, contra 2,8% no 3T19, justificada pela abertura das lojas, aumento de vendas principalmente no meio on-line, da diluição de custos e da boa gestão que alavancou a eficiência das operações.
A Via Varejo encerrou o período com caixa de R$ 7,9 bilhões e caixa líquido de R$ 3,4 bilhões, entrando nessa conta a carteira de recebíveis não descontados no valor de R$ 5,8 bilhões.
Para quem analisa o lucro líquido das empresas, vale destacar que a Via Varejo reportou reversão de prejuízo para o lucro líquido contábil no período, ou seja, a empresa saltou de R$ 346 milhões para R$ 590 milhões, apresentando ainda reversão de prejuízo ajustado de R$ 208 milhões (3T19) para incríveis R$ 100 milhões de lucro líquido ajustado no 3T20.
Voltando no tempo…
Para entender melhor como esses números foram possíveis, precisamos voltar um pouco no tempo, até setembro deste ano, quando diversas ações começaram a surtir efeitos. A integração das Casas Bahia ao app banQi fez com que milhares de clientes conseguissem pagar seus carnês de maneira on-line, o que era um problema antes da pandemia, pois eram oferecidos exclusivamente nas lojas físicas. Com essa mudança estratégica, a receita começou a melhorar, pois os clientes passaram a pagar nessa opção. Entrou em cena, também, o Retira Rápido, muito bem aceito pelo cliente que paga on-line e retira suas compras nas lojas físicas. Em tempos de pandemia, a Casas Bahia virou um “drive-thru” de pedidos.
Outra grande sacada foi a incorporação do WhastApp com o “Me Chama no Zap”, em que os colaboradores das lojas físicas puderam seguir com suas vendas de forma remota durante o isolamento social.
O reflexo dessas iniciativas que aceleraram o processo de digitalização dos vendedores se converteu em consultores de venda on-line para os clientes e, em especial, para aqueles que nunca fizeram uma compra virtual até então, antes da pandemia.
A aquisição da start-up curitibana ASAP Log, voltada para logística de e-commerce, selou de vez essa integração com a tecnologia, ajudando na diminuição do tempo de entrega dos produtos dos canais on-line – tanto da rede Casas Bahia quanto do Pontofrio.
O mercado gostou?
O resultado do 3T20 pode ser considerado excelente por estar acima das expectativas, com entrega de crescimento operacional e aumento de margens? Para Lucas Carvalho, analista da TORO Investimentos, os resultados são bastante sólidos, uma vez que a empresa vem surpreendendo positivamente o mercado desde o 1T20, seguido por um 2T20 acima das expectativas – e não diferiria neste 3T20. Segundo o analista:
“Os resultados mostram uma melhora na expansão de margem, Ebitda crescendo de uma forma muito importante, revertendo prejuízo em lucro líquido. Percebemos uma maior consistência na execução da estratégia, que é a de aumentar as vendas on-line. A empresa vem com essa bandeira desde meados de 2019 justamente para avançar no e-commerce, que é onde estão as maiores margens e vendas em larga escala. Resultado bem agradável, dentro da nossa visão para a empresa e para os setor em larga escala”.
O lucro líquido da Via Varejo entre julho e setembro foi de R$ 590 milhões, resultado muito interessante que reverteu o prejuízo registrado no mesmo período do ano passado, de R$ 346 milhões, o que é impressionante por estarmos em um ano pandêmico.
Realmente superou todas as expectativas, mas Carvalho salienta que esse processo de mudança do turnaround da empresa visando o e-commerce vem desde que se assumiu uma nova gestão na Via Varejo no ano passado, quando o Grupo Pão de Açúcar vendeu a sua participação na empresa:
“Estamos falando da volta da família Klein para a companhia, no conselho de administração. Essa, sim, foi uma mudança muito significativa A bandeira principal, que era a de ir para o e-commerce, foi acelerada pela pandemia. Era algo que já estava em curso e a empresa teve que se adaptar e focar cada vez mais nas vendas on-line, uma vez que já tinha lojas on-line e, ao mesmo tempo, uma grande quantidade de lojas físicas, até mesmo mais que outros pares concorrentes, em vista da restrição social”.
Carvalho ressalta que a receita da venda física teria a tendência de diminuir durante a pandemia de forma importante e a concentração migrou para o on-line, com aplicativos, vendas via WhatsApp: “Havia esse receio em março e abril, sobre a necessidade de fluxo de caixa da companhia, uma vez que ela tinha vencimentos de curto prazo e não estava com um fluxo caixa tão amplo assim. Mas a Via Varejo fez a emissão de novas ações e conseguiu captar mais de quatro bilhões de reais, emitiu debêntures também e obteve valores bilionários, e isso tudo ajudou a fortalecer o caixa dela para que conseguisse tocar a sua atividade operacional, reforçar sua estrutura de capital e avançar nas aquisições de outras empresas”.
Para onde olhar?
Ainda sobre o mesmo tema, no acumulado dos primeiros nove meses do ano, o lucro líquido foi de R$ 667 milhões, contra um prejuízo de R$ 558 milhões registrados no mesmo período do ano passado. Evidente que se esperava algo assim, mas os números superaram até mesmo os mais otimistas. O analista da TORO explica, no entanto, que os investidores precisam olhar para esses números e outras métricas:
“O lucro líquido é uma importante avaliação? Sim, mas recomendo avaliar o lucro operacional e o Ebitda, que é bem similar com o fluxo de caixa da empresa. São esses fatores que nos dão uma noção se a estrutura da empresa está avançando. De nada adianta uma empresa que tenha uma receita que sobe muito, mas com um custo que também sobe muito. Isso diminui um pouco o potencial de margens da companhia. O volume bruto de mercadorias da empresa no e-commerce de lojas cresceu muito e a penetração saiu de 18,5% no 3T19 para 41% neste 3T20”.
Com o volume bruto das mercadorias on-line crescendo mais de 200%, os números são bem chamativos. Tanto que o desempenho da receita bruta totalizou 9,3 bilhões e, desse valor, 5,9% vieram das lojas físicas. Ou seja, o on-line está começando a ganhar mais espaço e já está com aproximadamente 36%.
Lucas Carvalho explica que, se fizer uma avaliação com o 3T19, a receita bruta era de R$ 6,6 bilhões, porém a receita que vinha do on-line era menos de R$ 1 bilhão – ou seja, as vendas on-line subiram 278%, um volume muito importante dentro de um crescimento que vem trimestre após trimestre.
E o 4T20?
Pensando no 4T20, nessa progressão, o que se espera da empresa se considerarmos a recuperação da economia em um cenário de juros e de inflação baixos?
Carvalho percebe que a expectativa é muito construtiva, principalmente nessa época do ano, que é muito boa para o setor de varejo, de uma forma geral, tem Black Friday e Natal: “Essas compras puxam muito e, uma vez que temos taxa de juros na mínima histórica, pessoas pegando financiamento e empréstimos para comprar imóveis – já que precisam de móveis novos – e outros bens, além das festividades, os números podem vir acima do que é esperado pelo mercado. A recuperação da economia está acontecendo até mais cedo do que se esperava, os indicadores do IBGE para vendas no varejo mostram que esse detalhe vem de forma crescente, mostrando uma propensão ao consumo conjuntural da economia”.
Mais um pouco de visão de mercado? Então vamos nessa!
Para o Analista de Investimentos da Mirae, Pedro Galdi, o resultado do 3T20 também foi excelente, acima da expectativa, com entrega de crescimento operacional e aumento de margens. A expectativa também é que a empresa continue apresentando forte crescimento nos próximos trimestres, já que a estratégia da Via Varejo parece estar dando certo nesse novo cenário de recuperação da economia, com juros e inflação baixos.
De acordo com Galdi: “As recentes aquisições devem continuar impulsionando esses resultados. A Via Varejo encerrou o período com caixa líquido muito bom e com plenas condições para continuar fazendo novas aquisições e investimentos em tecnologia”.
Por Aroldo Antonio Glomb Junior – Especial ADVFN