O desespero causado pelos acontecimentos das últimas semanas traz à tona o que talvez seja a última cartada do governo na área econômica. A economia, embora encoberta pela política, é quem dá as cartas. Se fosse bem, não teria tanta gente na rua, na frente do palácio e no Congresso pregando impeachment. Ocorre que, encurralado, o que o governo faz é colocar mais lenha em sua própria fogueira. Se não pôde realizar o ajuste fiscal no primeiro ano de seu segundo mandato, Dilma tenta agora aumentar os gastos do governo para tentar conter a recessão.
Nesta segunda, deverá chegar ao Congresso um pedido de autorização que busca dar à União a possibilidade de fechar 2016 com um déficit primário de R$ 96,7 bilhões. Em fevereiro, o déficit proposto no pedido oficial era de R$ 60,2 bilhões. O pior é que, caso o Congresso não aprove o retorno da CPMF, o rombo deve ser ainda maior, ainda mais que, com a fraca atividade econômica, a arrecadação do governo tem reduzido.
Talvez a medida reflita a chegada de Lula que, sem ministério, assumiu a posição de articulador político que pode impor algumas exigências feitas antes de aceitar a Casa Civil. Poderia ser uma tentativa de unir a bancada – ao menos a do partido e legendas de fato próximas – que tanto criticou a proposta de sanear as contas públicas. O ex-presidente declarou diversas vezes que uma das formas de retirar o país da recessão seria o estímulo ao crédito e mais subsídios.
A ideia apresentada poderia seguir as teses de um dos mais importantes economistas do século XX, John Maynard Keynes, pelas quais o estado deve intervir em momentos de crise para que a economia retome seu giro. Esse tipo de ação já surtiu efeito em vários momentos da história, e também do Brasil, quando a crise mundial de 2009 passou quase que desapercebida por aqui, por conta dos incentivos ao consumo, isenções fiscais e oferta de crédito.
A intenção fica mais explícita nas declarações do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, que ao anunciar a proposta de elevação do déficit, serviria “para que o governo ajude a economia a se estabilizar e fazer com que o emprego e a renda se recuperem mais rapidamente”. Ocorre que tais empurrões, quando um governo tem condições de dá-los – e não parece ser este o caso –, devem ser pontuais.
A situação econômica que o país vive decorre exatamente do fato de o governo não ter cessado os estímulos. Conquistado o efeito de retomada da economia, ele, estado, deve se retirar, conforme Keynes. No nosso caso, os déficits se acumularam ano após ano, mostrando a irresponsabilidade do governo para com o comportamento do endividamento público. Somente os subsídios dados pelo governo, como repasses ao BNDES, descontos de IPI em automóveis e programas como Minha Casa Minha vida, custaram aos cofres públicos R$ 61 bilhões em 2015, cerca de 1% do PIB. Essa ação desestruturou a dívida pública e, indiretamente, é ela, que garantiu vitórias em três pleitos, pode fazer a situação ser retirada do poder.
Há um certo odor de calote no ar e, neste sentido, aumentar gastos é algo mais do que preocupante. Algumas projeções dão conta de que o endividamento público deve atingir cerca de 90% do PIB no próximo ano e a postura atual nada mais faz do que ampliar o pessimismo com relação à capacidade de pagamento do Brasil. Basta lembrar que foi justamente isso que levou ao rebaixamento da nossa nota de risco pelas principais agências internacionais. O déficit é um dos pilares da crise atual. Se não já não havia certeza sobre onde é o fim do poço, a proposta é cavar mais um pouquinho.
Ana Borges e Maurício Palhares, diretores da Compliance Comunicação