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Artigo: Darwin, o mercado de capitais brasileiro e os anfíbios

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Desde a década de 1980, tem se registrado um dramático declínio das populações de anfíbios em todo o mundo, caracterizado por colapsos nas populações e extinções maciças localizadas. No ano de 1993, as populações de mais de 500 espécies de rãs e salamandras dos cinco continentes apresentavam declínio.

No seu relatório de 2008, a UICN (International Union for Conservation of Nature) estima que 23% das espécies de anfíbios está ameaçada ou extinta e que 43% do total de espécies teve diminuição significativa. Em um primeiro momento, estas tendências não alarmaram a grande maioria dos biólogos, pois presumia-se que variações nas populações de anfíbios eram comuns e parte de um ciclo natural.

À medida que a queda se intensificava, parte da comunidade científica passou a dedicar mais esforços às pesquisas que não demoraram em comprovar que alterações ainda sutis no habitat dos anfíbios eram as causas do fenômeno. A pele altamente permeável destes animais os torna muito mais vulneráveis à contaminação por toxinas e poluentes do que os demais vertebrados. Infelizmente, as evidências têm apontado para um quadro ainda mais grave, pois “o desaparecimento dos sapos” pode ser o primeiro sintoma de um ecossistema já condenado de forma irreversível.

As corretoras e os sapos

Infelizmente, o mercado de capitais brasileiro está cada vez mais parecido com este ecossistema em que os anfíbios não conseguem mais sobreviver. As corretoras, assim como os “sapos”, vêm antecipando os sintomas de um ambiente cada vez mais hostil aos negócios e que agora também começam a ser observados em agentes com menor dependência do mercado de capitais.

Os negócios encolheram, reduzindo o espaço para novas captações. O volume médio diário na Bovespa em 2015 estava no menor patamar desde 2011, com RS 6,8 bilhões, em comparação com R$ 7,3 bilhões em 2014.  O Ibovespa fechou 2015 em 43,3 mil pontos, abaixo dos 50 mil em 2014 e bem distante do recorde de 69 mil em 2010.

Vimos o número de investidores pessoa física cair para 557,1 mil, praticamente o mesmo número de 2009; verificamos apenas um único IPO – Oferta Pública Inicial de ações, contra 23  em 2010 e 59 em 2007, enquanto dezenas de empresas já fecharam o capital e outras tantas apresentaram à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) seus pedidos para fechamento de capital. Dados da CVM revelam que as Ofertas Primárias e Secundárias em 2015 totalizam apenas R$ 57,5 bilhões, contra R$ 194 bilhões em 2010.

Tempos difíceis

Os últimos anos têm sido particularmente difíceis para grande parte dos agentes do mercado de capitais. No cenário interno, caos político, irresponsabilidade na condução da política macroeconômica, escândalos de corrupção, desaceleração econômica, aumento da aversão ao risco dos investidores, elevação dos juros e da inflação. No mercado internacional, influência negativa da inevitável perda de grau de investimento do país pela Standard & Poor’s em setembro de 2015, pela Fitch em dezembro e Moody’s em fevereiro de 2016, a volatilidade na expectativa de alta dos juros americanos e a desaceleração da China.

A superação dos desafios para a reversão deste quadro tóxico depende em larga medida da implementação de medidas e ações estruturais de longo prazo como já demonstraram os planos de desenvolvimento construídos ao longo dos anos por entidades ligadas ao mercado de capitais. Muitas destas importantes iniciativas acabam não sendo executadas, já que há uma dificuldade histórica na conscientização do setor público (Executivo e Legislativo) da importância de se priorizar o desenvolvimento do mercado de capitais.

Fontes de financiamento oficial secaram

Com a atual escassez de recursos do setor público, comprometeu–se a origem das poucas fontes diretas e indiretas de financiamento de longo prazo indispensáveis para a viabilização da grande maioria dos investimentos importantes para o país.

Nestes momentos, fica ainda mais evidente a necessidade de termos um mercado de capitais maduro e cumprindo o seu papel na alocação eficiente de recursos para o desenvolvimento econômico sustentável do país.

Toxinas na economia brasileira

As mais danosas toxinas que afetam economia nacional são evidentes e suas origens e efeitos vêm sendo debatidos de forma recorrente pelos mais renomados economistas, financistas e empresários do Brasil. Nota-se um grande consenso sobre o diagnóstico do quadro atual e o que deveria ser feito para dinamizar a economia e desenvolver nosso Mercado de Capitais.

Este consenso gravita em torno de cinco fatores amplos: 1) O elevado nível das taxas de juros e sua volatilidade histórica; 2). Os riscos e custos jurídicos, trabalhistas e regulatórios; 3) Tributação elevada e excessivamente complexa, 4) Baixa produtividade e falta de qualificação de mão de obra, 5) Deficiências crônicas em infraestrutura e serviços básicos.

Indiscutivelmente, todos estes entraves representam um grande denominador comum para empresas de quase todos os setores da economia nacional, mas o atual nível de taxa de juros, o ambiente regulatório prudencial e a elevada (e complexa) carga tributária produzem efeitos ainda mais nefastos para o Mercado de Capitais e principalmente, para o setor de Intermediação.

Juros estratosféricos

Crises financeiras internacionais, crises cambiais, políticas para o controle da inflação, desequilíbrios fiscais, baixa poupança interna e outros desafios econômicos históricos têm contribuído para a manutenção de um patamar elevado (e volátil) para a taxa de juros doméstica.

Uma análise comparativa dos retornos acumulados e volatilidade anualizada do índice Ibovespa, o índice Nasdaq, o Dólar e o IGP-M de janeiro de 1995, logo após a implantação do Plano Real, até setembro de 2015, mostra claramente que a nossa taxa livre de risco ou “risk free rate” (Selic ou CDI) é imbatível.

O retorno acumulado da Selic neste período supera, e muito, mesmo em termos absolutos, o Ibovespa (quase 3 vezes), a variação do dólar (mais de 6 vezes), o IGP-M (quase 6 vezes), e ainda deixa marginalmente para trás o índice Nasdaq incorporando a variação cambial. Como a performance absoluta do risk free rate doméstico vem superando sistematicamente os principais índices de mercados nacionais, é razoável o debate se de fato o conceito de “Equity Risk Premium” (ERP) local se aplica por aqui ou em economias com um nível de juros reais historicamente tão altos.

A discussão sobre o ERP, determinação das componentes idiossincráticas e outros fatores que explicam a performance decepcionante do mercado de ações nacional precisa ser aprofundada e tentarei explora estes temas em uma futura oportunidade.

Custo de oportunidade inibe economia real

O histórico custo de oportunidade elevado para os investimentos no Brasil tem um impacto direto na economia real, onerando demasiadamente ou, até inviabilizando bons projetos de longa maturação além de limitar o potencial de expansão de grande parte das empresas ao seu capital próprio e sua geração de caixa.

Por outro lado, os investidores individuais se mantêm compreensivelmente intolerantes a riscos, destinando direta ou indiretamente quase a totalidade de seus recursos para os títulos públicos teoricamente imunes a riscos de credito, preferencialmente sem exposição a prazos longos, índices e, ainda por cima, com liquidez diária.

Os títulos privados salvo poucas exceções precisam de artifícios como a cobertura do Fundo Garantidor de Credito (FGC) e/ou incentivos como isenção tributária para se manterem atraentes sem ter que pagar um spread de crédito proporcional ao seu risco corporativo, prazo de vencimento e iliquidez.

A falta de evolução deste quadro exigirá a introdução de mais incentivos e artificialidades, aumentando distorções que limitam o desenvolvimento do Mercado de Capitais ao que seria compatível com seu potencial.

Ganho alto sem risco ou avaliação

Neste contexto, as corretoras, bem como seus prepostos, os agentes autônomos de investimento, têm um grande desafio para agregar valor não só pela indiscutível falta de atratividade absoluta e relativa do mercado de ações, mas também pela própria percepção de alguns investidores de que as análises de crédito sobre a capacidade de pagamento e rating dos títulos de renda fixa privada se tornaram secundarias em função da cobertura do FGC.

Como consequência deste quadro, investidor “conservador” doméstico vem sendo muito bem remunerado, protegido de riscos, sem abrir mão de liquidez, e ainda é tratado como hipossuficiente, o que é um claro desincentivo à educação financeira.

Ambiente regulatório aumenta custos

A evolução do ambiente regulatório para um modelo cada vez mais prudencial e restritivo vem reduzindo a autonomia e flexibilidade dos modelos de negócios para as corretoras e de seus prepostos, os agentes autônomos. Esta tendência vem elevando os custos de observância do setor com novas exigências de controles, transferências de responsabilidades e obrigações fiscalizadoras aos seus profissionais.

Além disto, vem se consolidando uma visão de que todos os agentes do mercado de capitais e financeiro devem criar múltiplas estruturas superdimensionadas de governança, controle, e segregação de atividades, que podem até ser eficazes em grandes conglomerados com escala nacional e internacional, mas o seu peso e redundâncias são desproporcionais aos benefícios para corretoras de pequeno e médio porte e tem inviabilizado atividades de nicho ou regionais.

Supervisão desproporcional

A combinação destes fatores com a proliferação de auditorias e supervisões cada vez mais frequentes, profundas e abrangentes vêm trazendo riscos regulatórios inquantificáveis, desproporcionais ao atual estágio de desenvolvimento do mercado e ao patamar de receitas da atividade de intermediação. É urgente uma adequação baseada na proporcionalidade entre as exigências regulatórias e o porte/nicho de atuação das corretoras tendo como premissa básica a manutenção da segurança do investidor.

A visão equivocada de que apenas grandes conglomerados financeiros oferecem segurança e os melhores serviços ao investidor vêm fomentando este aumento custo de observância o que a médio prazo, pode de fato, limitar as alternativas dos investidores domésticos à poucas e grandes instituições.

Tributação, escala e nicho

Outro desafio histórico para o segmento de intermediação, principalmente para as corretoras e distribuidoras de títulos e valores mobiliários independentes, é adequar o atual regime de tributação para instituições financeiras ao seu porte, nível de receitas e especialização como ocorre em outros setores da economia nacional (exemplo: lucro presumido).

Esta distorção ficou mais explícita com a aprovação da Medida Provisória 675/15, que, entre outras medidas, elevou a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de instituições financeiras de 15% para 20%. Esta elevação de tributos direcionada aos poucos conglomerados financeiros bancários que continuam mostrando lucros expressivos em momentos adversos, é parte de um inevitável esforço fiscal, mas acabou produzindo danos colaterais para o segmento de intermediação.

As corretoras e distribuidoras de valores mobiliários independentes, mesmo não tendo o porte, performance financeira e amplitude de atuação das grandes instituições bancárias, acabaram assumindo o mesmo ônus, em uma situação de viabilidade econômico-financeira diametralmente oposta.

Teoria de Darwin: evolução versus extinção

O segmento de intermediação já enfrentou muitos quadros adversos como o atual, e mesmo diante de tantos desafios estruturais e setoriais, as corretoras e distribuidoras vêm adaptando seu modelo de negócios às condições impostas pelo ecossistema do qual fazem parte. Alguns exemplos destas adaptações estão no importante papel das corretoras na popularização do acesso ao Tesouro Direto, na atuação em colocação de títulos emitidos por instituições bancárias de menor porte como CDBs, LCIs e LCAs e também na distribuição de cotas de fundos de investimento de gestores independentes.

A queda do número de “anfíbios do mercado de capitais” sugere que a combinação de todas estas toxinas e a progressão com que elas se alastram em seu ecossistema já é superior à velocidade necessária para a adaptação das corretoras neste ambiente cada vez mais hostil. Ou seja, a diferença entre evolução (ou adaptação) e a extinção das espécies está na magnitude das mudanças e na velocidade em que elas ocorrem.

Ecossistema ameaçado

A continuidade destas tendências inquietantes causará um grave desequilíbrio no nosso ecossistema no qual os benefícios de escalabilidade, porte e diluição de custos (das toxinas) dos poucos conglomerados financeiros hegemônicos serão continuamente amplificados, trazendo mais concentração de mercado e consequente aumento do risco sistêmico.

Não há como um ecossistema com pouca diversidade de espécies e baixa densidade populacional permanecer viável por muito tempo, portanto, o fortalecimento do nosso mercado de capitais depende de um amplo trabalho de desintoxicação. Precisamos que a maior variedade possível de espécies se viabilize, prospere e contribua proporcionalmente para o desenvolvimento do nosso ecossistema, independentemente de porte, especialização, nicho de atuação ou localização geográfica.

Caio Weil Villares é presidente do Conselho de Administração da Ancord – Associação das Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários Câmbio e Mercadorias, diretor da Concordia Corretora de Valores e co-autor do livro “Armadilhas de Investimento”, da MBooks. As informações e opiniões aqui mencionadas são de responsabilidade do autor. O Blog Arena não se responsabiliza por decisões de investimento tomadas com base nas informações.

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