Por Hudson Bessa
Em qualquer roda de conversa no mercado financeiro, ouvimos as reclamações sobre o custo regulatório. De como o “aumento da barra regulatória” encareceu os negócios, por vezes até inviabilizando o equilíbrio econômico financeiro de diversas empresas.
Pesquisa global da PwC feita entre presidentes de bancos, corretoras e demais instituições financeiras aponta o excesso ou custo regulatório como a maior ameaça a seus negócios, inclusive aparecendo à frente de velocidade das mudanças tecnológicas. O que, considerando o atual momento de verdadeira ebulição das fintechs, não é pouco, pelo contrário.
Entre as iniciativas apontadas como “mais um custo” está o suitability, ou o formulário de Adequação do Perfil do Investidor (API). É compreensível, afinal, no curto prazo, é realmente difícil de se medir seus benefícios.
Contudo, em momentos de alta volatilidade, em que dólar, juros e bolsa sobem e descem em ritmo frenético e os limites de risco são recorrentemente extrapolados, um processo de suitability bem feito poderia evitar maiores problemas com a base de clientes.,
Nossa dificuldade de conviver com o incerto é de tal ordem que criamos o conceito de risco, uma incerteza ponderada pelos resultados prováveis. Uma distribuição de probabilidade, sobre o que não conhecemos. Como sentenciou o professor Paul Slovic, risco é um conceito teórico que tenta quantificar a incerteza e, assim, nos trazer algum conforto para que possamos conviver melhor com o desconhecido.
Em situações como a descrita, é fácil encontrar investidores amargando prejuízos. Os mais experientes costumam culpar as mudanças imprevisíveis nas condições do mercado, enquanto os novatos parecem nutrir uma sensação de que foram enganados. Ou seja, todos parecem se colocar como vítimas.
Mas por que estas pessoas estariam tão descontentes? Seria somente por conta das perdas que tiveram de arcar? Com certeza, a perda responde por boa, senão a maior, parcela da decepção e sofrimento.
Contudo, para aqueles que utilizaram os serviços de um consultor de investimentos, este sentimento é amplificado. Afinal, o investidor contava com alguém que deveria reduzir sua vulnerabilidade aos acontecimentos futuros.
Estas pessoas, além da perda, cultivam, no mínimo, uma dúvida: se foram exploradas em sua boa fé ao se permitir ouvir e acompanhar as recomendações de alguém que transmitia conhecimento técnico e experiência e, provavelmente, emanava confiança.
O suitability bem feito, poderia atenuar este risco e, assim, evitar este evento de irreparável quebra de confiança. Afinal, investidores não são obrigados a entender de investimentos, assim como doentes não precisam entender de remédios.
Compreender o perfil de risco do cliente, seu horizonte de investimento, disponibilidade financeiras, conhecimento sobre em que está interessado em aplicar seus recursos é essencial para que se possa fazer uma recomendação de investimentos mais adequada a cada investidor e em cada momento de sua trajetória.
A tal “barra regulatória” pretende proteger o investidor e, para isso quer que ele tenha mais informação, para que possa tomar uma decisão a cada dia mais consciente. O centro do processo de investimento dever ser o investidor. Se o foco está nele, queremos alinhar as expectativas dele, evitar surpresas e danos que possam destruir relações.
Já se o centro está no produto, talvez o mais importante seja indicar alternativas que nossa bola de cristal aponta como sendo as mais rentáveis ao longo do tempo, a despeito da disposição do cliente para suportar perdas.
Um processo de suitability bem feito, de forma que permita entender, de fato, quem é este cliente, o que ele quer, para quando e suas restrições é uma oportunidade ímpar de iniciar uma relação em que tanto a assertividade das recomendações quanto a tempestividade nos rebalanceamentos de carteira podem incrementar a satisfação dos investidores e reforçar o laço de confiança, fundamental para construir uma relação duradoura.
Talvez a forma mais fácil de mensurar os benefícios do suitability seja simular as perdas de volume sob gestão e de número de investidores em situações de estresse. Além das receitas, contabilize os custos necessário evitar as perdas, horas e mais horas tentando convencer os clientes a não resgatar.
Adicione a estas outras tantas dedicadas a recuperar clientes (em geral recuperar é cerca de duas vezes mais caro que conquistar um novo). Mais difícil, mas não impossível, é medir quantos clientes deixaram de ser indicados por aqueles que se foram.
O futuro é incerto, crises surgem de tempos em tempos, e as perdas são inevitáveis. Ter uma base de clientes estável e leal talvez seja uma das alavancas mais poderosas para a sustentabilidade de negócios calcados em serviços aos investidores.
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