Pioneira em colheita mecanizada de cana no Brasil, a São Martinho anuncia nesta quarta-feira uma parceria inédita com a sueca Ericsson para implementar a tecnologia 5G em suas operações, primeiramente na unidade de Pradópolis (SP), onde está a usina que tem o recorde mundial de moagem de cerca de 10 milhões de toneladas em uma safra.

A expectativa é que a conectividade 5G, que permite a automação desde colhedoras de cana até de equipamentos nas unidades de moagem, seja ativada na usina do grupo, um dos maiores produtores de açúcar e etanol do Brasil, já a partir da próxima safra de cana do centro-sul, em 2021.

O movimento também é visto pela Ericsson, reconhecida como líder em plataformas digitais e redes móveis, como uma forma de o agronegócio encurtar a distância em relação a outros setores, como varejo e bancário, que estão muito à frente da agricultura em digitalização, embora o país seja uma potência agrícola.

Os ganhos de produtividade e redução de custos que podem ser obtidos pela São Martinho com a rede 5G ainda são difíceis de se dimensionar, até porque essa tecnologia deve estabelecer novos paradigmas, disse à Reuters o presidente da São Martinho, Fábio Venturelli, que não revelou investimentos no processo.

“Quando tudo isso é viabilizado por uma conectividade que em alguns casos pode até superar a reação humana, fica até difícil imaginar quão mais conseguimos tirar… O acordo nos dá a possibilidade de sonhar com o impossível, e esse é o nosso objetivo”, afirmou Venturelli.

Segundo ele, é difícil dizer quanto o 5G pode agilizar os trabalhos, ainda mais considerando as dimensões da unidade de Pradópolis, uma das quatro plantas industriais do grupo, com capacidade aproximada de 24 milhões de toneladas/ano de cana.

 O CEO ressaltou que nessa unidade, com suas 52 colhedoras, 282 caminhões, 241 tratores, em 7.500 km de estradas próprias da usina de Pradópolis, o total rodado pelos veículos pode chegar a mais de 87 mil km ao dia, o equivalente a duas voltas ao redor da Terra.

Neste universo em que muitas vezes a colheita é realizada de madrugada, se um caminhão que transporta cana erra o caminho, pode perder cerca de três horas até encontrar a rota correta, observou ele, explicando o que a conectividade pode evitar.

“Preciso ter o caminhão conversando com a tecnologia de tal forma que o melhor caminho seja passado para esse caminhão, para otimizar o trajeto”, exemplificou.

CENTRO DE INOVAÇÃO

O acordo, que marca primeira parceria da Ericsson neste ambiente do agronegócio, também prevê um centro de inovação para desenvolver aplicações para o 5G no setor.

O centro de tecnologia será instalado no município paulista onde está situada a usina de mesmo nome da São Martinho, localizada na região de Ribeirão Preto, coração da produção de cana do Estado líder brasileiro em açúcar, etanol e bioenergia.

A tecnologia 5G, que deve aumentar eficiência em processos que requerem alta velocidade de transferência de dados e baixíssima latência (tempo de resposta), permitindo o controle inteligente de pragas e plantas daninhas, deve ser estendida para outras usinas do grupo e mais tarde estar disponível para outras companhias e outros setores do agronegócio.

“Desse trabalho conjunto pode sair muita coisa, como tecnologias, produtos e aplicações novos. Um dos primeiros candidatos seriam as outras usinas da companhia, e dependendo dos formatos serão novos produtos de inovação que a Ericsson e a São Martinho poderão disponibilizar para o mercado”, disse o CEO do grupo sucronergético.

A tecnologia também pode auxiliar o grupo a identificar a localização de incêndios em suas áreas agrícolas, dentre outras atividades que requerem processamento de dados e imagens em alta velocidade, além de antecipar a necessidade de manutenções de equipamentos, evitando que as operações tenham de ser paralisadas. A empresa também espera que o 5G viabilize o que o CEO chamou de “princípios da robótica” dentro da usina.

“Com certeza vamos aplicar a outras partes do agronegócio, o bacana da parceria é que a São Martinho tem viés de empreendedorismo e viés tecnológico muito forte, e isso ajuda a extrapolar para outras áreas do agronegócio”, completou o presidente da Ericsson para o Cone Sul da América Latina, Eduardo Ricotta, que espera ter uma operadora telefônica e a chamada de startups, para ajudar no projeto, no próximo ano.

 De acordo com as empresas, o fato de a São Martinho já ter uma rede 4G privada, em projeto “4.0” há mais de dois anos, ajuda na implantação do 5G, assim como o fato de a companhia ser considerada líder em eficiência, com índices de colheita de até 1.000 toneladas/máquina por dia, o dobro da média do setor.

Uma análise setorial da Ericsson mostrou que a conectividade no campo trará uma “disrupção” semelhante à gerada nos anos 60 do século passado com o trator, com benefícios significativos em todos os aspectos da agricultura.

Nos próximos cinco anos, segundo as empresas, a cobertura de internet celular de alta capacidade (4G e 5G) no campo deve cobrir uma área correspondente àquela que as tecnologias 2G e 3G levaram 20 anos para atingir.

Dessa forma, o desenvolvimento da cadeia do agronegócio por inteiro com o advento do 5G pode tornar o Brasil ainda mais produtivo do que é atualmente, afirmaram os executivos.

Ricotta explicou que, embora o 5G não esteja acessível à população em geral, já se pode usar a frequência para fins científicos e experimentais, em uma rede privada. E que, quando ela estiver disponível para todos, bastará à São Martinho ativar sua rede na mesma frequência ou fazer um ajuste por software.