A Comissão de Negociação de Contratos Futuros de Commodities (CFTC, na sigla em inglês) apresentou uma queixa no Tribunal Distrital em Illinois contra a Binance, maior corretora de criptoativos do mundo, seu cofundador, Changpeng Zhao (CZ), e seu ex-diretor de compliance, Samuel Lim. O processo civil movido pela agência reguladora dos Estados Unidos acusa a empresa de ter violado uma série de regras do mercado norte-americano, entre elas aquelas previstas na lei e na regulamentação da própria CFTC.
As ações da bolsa de criptomoedas, a Coinbase Global, caíram 7,8% nas negociações de hoje, junto com Bitcoin (BTC) e ethereum (ETH), depois que a CFTC apresentou a denúncia contra a Binance. De acordo com a plataforma CoinDesk, perto das 18h (horário de Brasília), o BTC recuava 2,75% nas últimas 24 horas, valendo pouco mais que US$ 27 mil, e o ETH desvalorizou 3,04%, a US$ 1.705,89.
Na última semana, uma reportagem da emissora norte-americana CNBC relatou que funcionários da Binance trabalhavam para subverter os controles de compliance na China (onde a negociação de criptomoedas é proibida), usando algumas das mesmas técnicas que a CFTC agora alega que a corretora usou para atrair clientes dos EUA.
No país da América do Norte, apenas a subsidiária Binance US tem permissão para captar clientes, que, por sua vez, têm acesso a uma plataforma local, construída com base nos regulamentos do mercado, em vez de ingressarem na plataforma global.
Mas os réus teriam realizado atividades de negociação de derivativos nos EUA de julho de 2019 até o presente com o objetivo de burlar a regulamentação do mercado, como estruturar intencionalmente suas entidades e transações para evitar os requisitos de registro junto à agência de controle.
Segundo a CFTC, a corretora instruía os clientes do país sobre como contornar os controles da plataforma, usando, por exemplo, VPN para proteger os dados de localização e ter acesso aos serviços não permitidos em solo norte-americano.
As regras de compliance da empresa, portanto, funcionariam apenas de “fachada”, já que havia direcionamento interno para driblá-las, segundo o regulador.
Nas mensagens analisadas pela emissora CNBC, os próprios funcionários da Binance e voluntários treinados compartilhavam técnicas para burlar os sistemas de residência e verificação da plataforma local. Assim o cliente da corretora poderia ocultar seu país de residência ou origem.
A agência reguladora dos EUA alega que a Binance, CZ e Lim violaram oito disposições básicas do arcabouço regulatório do mercado norte-americano, incluindo as leis que exigem os devidos controles “para prevenir e detectar lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo.”
Por isso, na ação, o agente regulador alega que o programa de compliance da corretora foi ineficaz e, sob a direção de Zhao, a empresa instruiu seus funcionários e clientes a driblar as leis para maximizar os lucros corporativos.
Procurada pela reportagem, a Binance alega por meio de posicionamento que a “reclamação apresentada pela CFTC é inesperada e decepcionante, pois trabalhamos em colaboração com a CFTC por mais de dois anos”. A corretora diz ainda no texto que pretende “continuar a colaborar com os reguladores nos EUA e em todo o mundo. O melhor caminho a seguir é proteger nossos usuários e colaborar com os reguladores para desenvolver um regime regulatório claro e criterioso.”
Mais adiante no posicionamento, a companhia informa que fez “investimentos significativos nos últimos dois anos para garantir que não tivéssemos usuários dos EUA ativos em nossa plataforma”, no caso do sistema global, não liberado no mercado norte-americano.
O que isso significa para a Binance?
O processo tem o potencial de derrubar as operações da Binance e é possivelmente apenas a primeira moção de uma repressão regulatória mais ostensiva à maior corretora de criptomoedas do mundo, informa da CNBC.
Além da possível restituição de lucros conquistados de forma indevida e obtidos em virtude de contratos nulos e de quaisquer custos diretos e indiretos causados à sociedade e a indivíduos, o processo da CFTC pede à Justiça dos EUA que imponha outras medidas necessárias, incluindo proibições de comércio e registro das transações.
A denúncia alega que os dois executivos da Binance acusados no processo teriam cultivado ativamente clientes “VIPs”, aqueles de lucrativos e comercialmente importantes, incluindo clientes institucionais localizados nos EUA.
“A Binance está ciente das identidades e localizações geográficas de seus ‘VIPs’ porque monitora suas fontes de transações de volume e de receita baseada nos impostos como algo natural na condução de suas operações”, acusa o regulador.
Os VIPs da Binance receberiam privilégios especiais quando os agentes reguladores os investigavam ou tentavam congelar seus ativos, ainda de acordo com a CFTC. A denúncia alega que a corretora avisou esses clientes sobre as investidas do governo e sugeriu que retirassem seus ativos da plataforma.
“Não diga diretamente ao usuário para fugir”, a Binance teria instruído sua equipe de atendimento VIP, de acordo com o documento. “Se o usuário for um grande negociador, ou pelo menos alguém inteligente, ele/ela vai entender a dica.”
Leia o posicionamento da Binance na íntegra
A reclamação apresentada pela CFTC é inesperada e decepcionante, pois trabalhamos em colaboração com a CFTC por mais de dois anos. No entanto, pretendemos continuar a colaborar com os reguladores nos EUA e em todo o mundo. O melhor caminho a seguir é proteger nossos usuários e colaborar com os reguladores para desenvolver um regime regulatório claro e criterioso.
Fizemos investimentos significativos nos últimos dois anos para garantir que não tivéssemos usuários dos EUA ativos em nossa plataforma. Durante esse período, expandimos nossa equipe de compliance de aproximadamente 100 pessoas para cerca de 750 funcionários em funções principais e de suporte de compliance atualmente, incluindo quase 80 funcionários com experiência anterior em aplicação da lei ou regulação e aproximadamente 260 funcionários com certificados profissionais em compliance.
Gastamos ainda $80.000.000 em parceiros externos, incluindo provedores de serviços KYC (Know your customer, ou conheça seu cliente), monitoramento de transações, vigilância de mercado e ferramentas investigativas que apoiam nossos programas de compliance.
Consistente com as expectativas regulatórias em todo o mundo, implementamos uma abordagem robusta de “três linhas de defesa” para risco e conformidade, que inclui, mas não se limita a:
- Exigir KYC obrigatório para todos os usuários em todo o mundo;
- Manter bloqueios de país para qualquer pessoa residente nos EUA;
- Bloquear qualquer pessoa identificada como cidadã dos EUA, independentemente do país em que esteja vivendo;
- Bloqueio para qualquer dispositivo usando um provedor de celular dos EUA;
- Bloquear logins de qualquer endereço IP dos EUA;
- Evitar depósitos e saques de bancos dos EUA para cartões de crédito.
*Informações da CNBC e Valor