O novo alerta do Fundo Monetário Internacional reacende a preocupação com a trajetória fiscal brasileira e lança luz sobre um diagnóstico com reflexos diretos sobre crescimento, inflação, juros e o comportamento dos principais ativos financeiros. No cenário-base mais atualizado, o FMI projeta a dívida bruta geral do governo brasileiro estabilizando próxima de 99% do PIB nos próximos anos — um avanço significativo em relação às estimativas anteriores e um patamar muito acima da média das economias emergentes. Com isso, o Brasil permanece entre os países de maior risco fiscal dentro do seu grupo de comparação.

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Esse nível elevado deriva de um tripé que se tornou desconfortável para analistas e investidores: juros reais persistentemente altos, déficit primário recorrente e baixo crescimento potencial. Nesse ambiente, o diferencial entre juros e atividade (J-C) segue desfavorável. Quando J>C, o setor público precisa assegurar superávits primários constantes apenas para impedir o avanço da dívida; sem isso, a curva de endividamento inevitavelmente se inclina para cima.

Os dados mais recentes ajudam a explicar essa dinâmica. A dívida bruta calculada pelo Banco Central chegou à faixa de 76% do PIB em 2024. Já pelo critério do FMI — que inclui títulos do governo detidos pelo próprio BC — o número se aproxima de 90%. Essa diferença metodológica é crucial para investidores globais que avaliam risco com base em padrões internacionais. O avanço da dívida decorre, principalmente, do custo nominal de rolagem em um ambiente de Selic elevada e inflação resistente, que obrigou a manutenção da política monetária restritiva por um período maior. Embora o resultado primário tenha mostrado melhora no curto prazo, ainda é insuficiente para alterar a tendência da dívida sem medidas adicionais do lado da despesa.

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O cenário internacional adiciona mais pressão. O Fiscal Monitor projeta a dívida global retornando ao patamar de 100% do PIB até 2029, nível comparável ao observado no pós-guerra. Isso significa maior competição global por poupança e, portanto, pressão adicional sobre os prêmios de risco — especialmente nos países onde a credibilidade fiscal já é limitada. Para o Brasil, o reflexo imediato é uma curva de juros longa inclinada, CDS acima de pares e prêmios mais altos exigidos por investidores estrangeiros para financiar o Tesouro Nacional. Não por acaso, agências de classificação de risco têm reforçado que a “história fiscal” do país precisa ir além de metas anunciadas: é necessária execução clara e consistente. E esse risco aumenta conforme se aproxima 2026, ano eleitoral, quando medidas populistas tendem a ganhar espaço e podem fragilizar ainda mais o quadro fiscal.

O mapa de riscos desse cenário é evidente: a) crowding out do investimento privado devido ao custo de capital elevado; b) compressão do espaço orçamentário pelo peso dos juros, reduzindo margem para investimentos; c) maior vulnerabilidade a choques de termos de troca ou desaceleração global, como eventuais quedas adicionais na economia chinesa. Ainda assim, existem oportunidades. Em renda fixa, o prêmio elevado combinado com possibilidade de reancoragem fiscal cria espaço para estratégias táticas de duration em momentos de desinflação. Na renda variável, setores com forte capacidade de repasse de preços e geração de caixa em moeda forte tendem a sustentar múltiplos mesmo em ambiente de juros altos.

Na dívida soberana, títulos indexados à inflação ganham protagonismo como proteção caso a consolidação fiscal demore mais do que o esperado. E, se o governo entregar um ajuste primário factível — com revisão de despesas obrigatórias, redução de subsídios ineficientes e aperfeiçoamento da governança do arcabouço fiscal — o país ganha um opcional valioso: a redução estrutural do prêmio de risco, o que tende a revalorizar a bolsa de valores, apreciar o câmbio e alongar a dívida pública a custos menores.

A mensagem final é clara: uma dívida próxima de 100% do PIB não é uma sentença inevitável, mas sim uma escolha política reafirmada dia após dia. Em um país com baixa poupança doméstica, a credibilidade fiscal é o recurso escasso que determina o preço do futuro. Sem ela, o custo permanece elevado; com ela, o mercado encontra espaço para uma tese de re-rating da economia. O FMI apenas aponta a direção — o destino depende das decisões que Brasília tomará nos próximos trimestres ou… não.

 

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