Por unanimidade, o conselho de administração da Aes Tietê (BOV:TIET11) rejeitou a oferta de combinação de negócios feita pela Eneva (BOV:ENEV3) por concluir que os termos e condições da proposta, classificada como “hostil”, são inadequados ao melhor interesse da companhia e do conjunto de seus acionistas.

Em fato relevante divulgado na noite deste domingo (19), a empresa destacou que a partir de análises de assessores financeiros, técnicos e jurídicos contratados, a empresa viu ‘incompatibilidade’ existente entre negócios e estratégias da Tietê e Eneva.

AES tem um planejamento estratégico em que consta a busca por geração de energia limpa e sustentável e a Eneva “tem seu modelo de negócios centrado na geração, exploração e produção de hidrocarbonetos, com foco na geração térmica baseada em gás natural e carvão mineral”, diz o comunicado.

O documento também cita “incertezas e riscos relacionados às atividades da Eneva, aos quais os acionistas da AES Tietê ficariam expostos” se houvesse a fusão.

Um deles é a possibilidade de a exploração dos campos de hidrocarbonetos não atingir os resultados esperados. Para a companhia, a operação também deixaria os acionistas expostos a mais riscos regulatórios.

“Na visão do conselho de administração, a relação de troca proposta pela Eneva não compensa a assunção de tais riscos.”

A AES afirma ainda que foi subavaliada pela Eneva e que a avaliação feita superestima as sinergias que seriam atingidas com a fusão.

Além disso, diz que a operação poderia comprometer a distribuição de dividendos.

Aberta a contraproposta

A companhia realizará uma teleconferência nesta segunda-feira, dia 20, às 11h, para explicar os motivos da rejeição da proposta.

A AES Tietê afirma estar aberta a receber uma contraproposta da Eneva, mas pondera que uma série de melhorias seria necessária, como “a possibilidade de liquidez integral para os acionistas da companhia que não desejem migrar para a Eneva”.

Apresentada em 1º de março, antes da deterioração das condições de mercado por causa da pandemia da covid-19, a oferta da Eneva envolve a incorporação da AES Tietê por R$ 6,6 bilhões, sendo que cerca de R$ 2,7 bilhões seriam pagos em dinheiro, e o restante, em participação na nova empresa. Se consumada, a operação poderia criar uma das maiores geradoras privadas de energia de capital predominantemente nacional, com capacidade instalada de 6,1 mil megawatts (MW) e faturamento anual de R$ 5 bilhões.

O conselho de administração da geradora se comprometeu a convocar uma assembleia geral extraordinária (AGE) após analisar a oferta final da Eneva. Mas aos conselheiros cabe apenas recomendar ou não a operação, e, na prática, a posição do controlador pode ser vencida por minoritários preferencialistas na reunião.

 Isso é exigido porque a Tietê é listada no Nível 2 de governança da B3, o que dá direito de voto aos acionistas detentores de papéis preferenciais em alguns casos, como o de propostas de aquisição.

Entre os acionistas minoritários, destaca-se o BNDES, com 28,3% do capital total da Tietê — fatia maior do que a da AES Holding, subsidiária da americana, com 24,3%. O grupo americano, no entanto, detém mais de 60% das ações ordinárias da geradora.

Na semana passada, Luiz Barsi, acionista minoritário da AES, havia se posicionado contra fusão, dizendo que a empresa seria um “passarinho prestes a ser devorado” e a Eneva seria o predador.

Estudo a pedido da Eneva calcula ganho de R$ 3,1 bi para acionistas com a fusão, diz Valor

A combinação de negócios entre as geradoras de energia Eneva e AES Tietê criaria R$ 3,1 bilhões em valor aos acionistas da empresa resultante da operação. A conclusão é de um estudo encomendado pela Eneva à Tendências Consultoria Integrada, ao qual o Valor teve acesso com exclusividade na sexta-feira.

A cifra bilionária, que corresponde à praticamente metade do valor de mercado da AES Tietê à época do anúncio da proposta, em 1º de março, foi calculada com base num conjunto de sinergias previstas na junção das duas empresas. “Esses R$ 3 bilhões não existem com as empresas separadas. A nossa proposta forma uma empresa mais eficiente e cria um círculo virtuoso de criação de valor”, afirma o diretor financeiro da Eneva, Marcelo Habibe.

O estudo aponta que a nova empresa teria uma estrutura de capital melhor do que têm hoje Eneva e Tietê separadas. Segundo Frederico Estrella Valladares, diretor da área de finanças corporativas da Tendências e responsável pela análise, a redução do custo de capital viria, principalmente, do portfólio complementar de ativos das empresas e das estratégias de financiamento.

Sob a ótica do portfólio das empresas, a combinação de ativos de geração hídrica e térmica minimizaria riscos e tornaria o fluxo de caixa mais previsível. Estima-se que a nova empresa teria um risco menor de volatilidade na geração de caixa, na faixa de 5%, ante 11,88% calculados para a Eneva e 13,30% para a AES Tietê.

Nas previsões, também foi considerada a possibilidade de a empresa combinada passar a compor o Ibovespa. De acordo com o estudo, com o crescimento da base acionária após a incorporação da Tietê, a Eneva cumpriria os requisitos necessários para ser incluída no índice. Isso, em tese, traria uma série de benefícios ao papel, como maior liquidez diária.

Outro ganho relevante aos acionistas viria das estratégias de financiamento, tanto da própria operação – o pagamento da parcela em dinheiro aos acionistas será integralmente financiado com recursos de terceiros -, quanto do aumento da alavancagem financeira da AES Tietê.

Com a operação – que já teve vários embates entre as duas empresas até ontem -, são previstas ainda eficiências tributárias, com aproveitamento mais rápido de prejuízos fiscais acumulados na holding da Eneva; melhor desempenho de contratação de energia; e maior eficiência de despesas gerais e administrativas.

Anunciada há 50 dias, a proposta à AES Tietê envolve R$ 6,6 bilhões, sendo que 60% seriam pagos em ações da Eneva e 40% em dinheiro. Habibe considera que a oferta já era boa e ficou “ainda melhor” diante da crise atual. Ele destaca que, além de um portfólio complementar, a nova empresa teria um mix de contratos “equilibrado”. E diz que ela alia a estabilidade das térmicas da Eneva, que estão praticamente todas contratadas no mercado regulado, com o fato de que a AES Tietê tem pouca energia vendida no longo prazo.

O executivo da Eneva afirmou ainda confiar na aprovação do negócio, mas ressaltou que a Eneva não está disposta a entrar em “guerra de preços” caso apareça um concorrente, como aconteceu no episódio da venda da então AES Eletropaulo, que acabou arrematada pela Enel numa disputa ferrenha com a Iberdrola.

Válida até 30 de abril, a oferta da Eneva até ficou em “banho maria” durante semanas, enquanto a Tietê cobrava informações adicionais que considerava essenciais. A ofertante, por sua vez, dizia já ter apresentados todas e que a AES fazia isso para ganhar tempo na sua análise.

 Apesar do impasse entre as companhias, a americana AES Corporation, controladora da Tietê, não tem o poder de vetar a transação. Isso porque a Tietê é listada no Nível 2 de governança da B3, o que confere aos acionistas preferencialistas o direito de voto, nesse caso, numa Assembleia Geral Extraordinária. Entre os minoritários, se destaca o BNDES, com 28,3% do capital total da Tietê – fatia maior do que a da AES Holding, subsidiária da americana, com 24,3%.

Posições contrárias à operação têm surgido de vozes importantes. Na semana passada, Luiz Barsi Filho, maior investidor pessoa física da AES Tietê, divulgou uma carta aberta dizendo que votará “veementemente contra a proposta hostil”. Como argumentos, ele cita a “omissão” sobre política futura de distribuição de dividendos e a tendência mundial de busca por negócios sustentáveis, que entra em conflito com os negócios de geração termelétrica da Eneva.

(Com informações do Valor)