A Smiles (BOV:SMLS3) fechou um acordo de adiantamento à Gol (BOV:GOLL4) de R$ 1,2 bilhão, que será usado nos próximos três anos para compra de passagens de emissão da GLA, controlada da Gol. A Smiles estima um ganho de R$ 85 milhões com o acordo. A operação, no entanto, é questionada por acionistas minoritários da Smiles, que consideram o acordo ilegal. Para especialistas em governança, a transação tem uma relação entre risco e retorno desfavorável para a Smiles.

O acordo, o 15º fechado pela Smiles desde que a empresa abriu seu capital em 2013, foi aprovado por unanimidade pelo conselho de administração da Smiles e pelo comitê independente. A Smiles fará o adiantamento em uma única parcela. Em contrapartida, a Gol vai oferecer à Smiles um desconto médio de 11% nos preços das passagens adquiridas no resto deste ano. E, até 30 de junho de 2023, a Gol vai garantir a venda de um percentual de passagens com tarifas promocionais à Smiles. O saldo do adiantamento que não for usado na compra de passagens será remunerado a uma taxa equivalente a 115% do Certificado de Depósito Interbancário (CDI) – em torno de 3,5% ao ano, segundo a Gol.

As empresas também vão desenvolver produtos para fortalecer a geração de receita da Smiles.

O valor do acordo equivale ao saldo de caixa da Smiles no fim de março e se soma a um crédito de R$ 1,183 bilhão que a empresa já tinha para compra futura de passagens da Gol.

“É todo o caixa da Smiles, que será transferido para a Gol em uma compra antecipada de passagens. A Gol tem 52% da Smiles e usa esse controle em benefício próprio”, afirmou Márcio Louzada Carpena, do escritório Carpena Advogados. O advogado representa os fundos de investimento Samba Theta, CSHG Suprassumo e Centauro I.

Esses acionistas, donos de 4,03% das ações ordinárias da Smiles, notificaram a Gol e a Smiles, pedindo uma assembleia geral para discutir “irregularidades e ilegalidades” na antecipação da compra de passagens aéreas. A empresa tem oito dias para realizar a assembleia. Caso contrário, os minoritários podem acionar as empresas na Justiça. Os acionistas estudam pedir uma liminar para impedir que o acordo de ontem se concretize.

Os minoritários alegam que ao fazer adiantamentos para a Gol em março no total de R$ 425 milhões, a Smiles violou seu estatuto, que prevê aprovação dessas operações pelo conselho e pelo comitê independente. Os acionistas também afirmam que a taxa praticada é bem inferior à que a Gol obteria se buscasse crédito no mercado.

Um advogado ouvido pelo Valor, que não quis ser identificado, considerou o valor da operação muito alto e a taxa muito baixa, levando em conta o potencial risco de recuperação judicial da Gol. “A Smiles continua sendo usada como caixa da Gol nos momentos de dificuldade”, disse.

“A relação de risco e retorno do investimento é assimétrica. A prova disso é que as ações da Smiles estão abaixo do valor do caixa que ela tem”, afirmou um especialista em governança corporativa, que também pediu anonimato.

André Fehlauer, presidente da Smiles, disse que todas as operações de adiantamento para a Gol seguiram à risca o estatuto da Smiles e que não vê risco do negócio ser barrado. Sobre a alegação dos minoritários que o adiantamento feito em março teria que ser aprovado pelo comitê independente, Fehlauer disse o aval do comitê só é exigido quando o valor da compra supera a média dos 12 meses anteriores, o que não ocorreu.

Fehlauer disse ainda que a operação não vai zerar o caixa da empresa. “A Smiles gerou mais de R$ 300 milhões de caixa no segundo trimestre e vai continuar gerando caixa nos próximos meses. Além disso, somos uma empresa muito enxuta, com um custo fixo médio de R$ 30 milhões por mês”, disse o executivo.

Eduardo Bernardes, vice-presidente comercial e de marketing da Gol, disse que o acordo deve ajudar a estimular as vendas de passagens aéreas. Historicamente, a Smiles responde por 10% a 12% das vendas de passagens da Gol mas, durante a pandemia de covid-19, a maioria das passagens foram obtidas com o resgate de milhas. “Com o acordo, a perspectiva é que mais clientes usem milhas acumuladas para adquirir mais passagens”, afirmou Bernardes.

A Gol ampliou a oferta em julho de 100 para até 250 voos por dia. Em junho, a Gol apresentou aumento de 95,4% na demanda por voos em comparação com maio. Bernardes acrescentou que a companhia espera que o governo federal publique nos próximos dias o edital para compra antecipada de passagens aéreas. O governo avalia comprar antecipadamente 12 meses de passagens aéreas. “No caso da Gol, as vendas para o governo no ano passado chegaram a R$ 100 milhões”, disse Bernardes.