A resposta da Totvs não demorou a aparecer. “A Totvs falou: quer
brincar no meu parquinho. Tá bom: eu vou brincar no seu também”,
diz uma fonte do setor que está acompanhando esse movimentação.
No começo deste ano, a Totvs criou a divisão Eleve, um área que
herdou o software Bemacash, voltado a micro negócios, que havia
ficado de fora da venda da Bematech para a Elgin, por R$ 25
milhões, em maio de 2019.
A divisão começou a atuar com módulos de vendas para o varejo e
para o setor de saúde. Em meados de junho, a Totvs lançou um módulo
de gestão, com foco na parte financeira e voltado para contadores,
exatamente o público na qual a Omie atua.
Até aí, nada demais. O que chamou a atenção no mercado foi a
estratégia comercial da companhia. A Totvs está oferecendo uma
comissão de até 50% aos contadores que venderem assinatura de seu
sistema aos seus clientes. Algo que, segundo algumas fontes com
quem o NeoFeed conversou, pode ser
considerado bastante incomum – não a comissão, mas sim o tamanho
dela.
Tubino acrescenta que essa movimentação de startups com foco no
pequeno negócio e no contador para atender um cliente maior deixou
um canal desassistido e o cliente abandonado. “É uma oportunidade
para nós”, diz.“Não é uma resposta”, afirma Juliano Tubino,
vice-presidente da Totvs. “O nível de comissionamento é ímpar e não
é temporário. Queremos ter o contador como nosso ‘influencer”.
De acordo com o executivo, o objetivo é ter o contador como um
canal de vendas, atraindo seus clientes à plataforma da Totvs. É um
universo gigante, com mais de 500 mil profissionais, segundo dados
do Conselho Federal de Contabilidade. Para atrai-los, além da
comissão, a Totvs dá ainda acesso gratuito ao sistema para o
contador.
A Eleve já conta com dezenas de milhares de clientes, por conta
de parte deles terem sido herdados do antigo Bemacash. Eles pagam
um assinatura que varia de R$ 79 a R$ 169 ao mês, segundo
Tubino.
A maioria deles é dos módulos de vendas para o varejo e de
saúde, que estão há mais tempo no mercado. O de gestão, que acabou
de ser lançado, está começando a tracionar agora. “Fizemos um
projeto-piloto e o feedback foi positivo”, afirma Tubino.
A entrada da Totvs nesse segmento com mais força comercial tem o
potencial de provocar um abalo sísmico nas empresas da área. Em
especial, as startups que contam com um sistema na nuvem atuando
com clientes de pequeno porte.
A Totvs já detém uma participação de mercado de 48% entre as
empresas de pequeno porte, aquelas com até 170 funcionários,
segundo a pesquisa “Uso de TI nas Empresas em 2019”, da Fundação
Getulio Vargas, de São Paulo. Mas ficava à margem de micro
negócios, o público da maioria das startups de computação em
nuvem.
Nesse seu movimento mais recente, a companhia mira diversos
alvos. Sua estratégia de atrair contadores para o seu lado pode
afetar, além da Omie, startups como ContaAzul, que tem
investimentos dos fundos de venture capital Monashees e Tiger
Global, e Contabilizei, apoiada por Quona Capital, Kaszek
Ventures e e.bricks ventures, entre outros.
Em sua visão, há milhões de empresas que ainda não usam nenhum
solução digital. “O meu concorrente número um é a Tilibra e o
Excel”, diz Lombardo, referindo-se ao fato de as micro e pequenas
empresas preferirem usar o papel e a famosa planilha de cálculos da
Microsoft para fazer a gestão financeira da empresa.“Se uma empresa
do porte da Totvs começa a educar esse segmento, no fundo, vai me
ajudar a andar mais rápido”, diz Marcelo Lombardo, fundador e CEO
da Omie.
Sobre o avanço da Totvs para cima dos contadores, o empreendedor
diz que, no passado, tentou transformá-los em um canal de vendas.
Mas que a estratégia não funcionou. “O contador não é um vendedor
de software. Foi um grande erro que cometi”, afirma Lombardo.
Hoje, a estratégia da Omie é ter o contador como parceiro, que
indica clientes, mas sem o pagamento de comissão na maioria dos
casos. “Os contadores de maior porte e bem estruturados se sentem
conflitados. Ele não pode ser visto como um balcão de
negócios.”
No começo de abril, a Omie notou que suas vendas iriam
desacelerar por conta da paralisação da economia e que os pequenos
negócios seriam os mais afetados.
Rapidamente, a startup reformulou sua estratégia e foi buscar um
novo cliente que estivesse numa faixa de faturamento maior. Foi
assim que a Omie “pivotou” seu modelo, sem deixar de atender aos
pequenos negócios.
Ao mesmo tempo, a startup criou uma campanha publicitária em que
brincava com as soluções de seus concorrentes, chamando-as de
dinossauro. “Antes, eu tinha um percentual de 3% a 5% de clientes
maiores. Hoje, eles já estão na faixa de 30%”, afirma Marcelo
Lombardo, fundador e CEO da Omie.
De acordo com ele, no mês passado, aproximadamente 100 clientes
da Totvs migraram para a sua plataforma online.