Os bancos vão apresentar ao Congresso uma contraproposta que
permita cortar as taxas de juros dos cartões e do cheque especial
sem tabelamento de preços. Os estudos ainda estão sendo conduzidos,
mas contemplam uma diminuição dos limites de crédito de parte dos
clientes e do uso do parcelado sem juros, apurou
o Valor.
Bancos na B3: (BOV:BBDC3) (BOV:BBDC4) (BOV:BBAS3) (BOV:ITUB3)
(BOV:ITUB4) (BOV:ABCB4) (BOV:BMGB4) (BOV:BIDI4) (BOV:BIDI11)
(BOV:BPAC11) (BOV:BAPN4) (BOV:SANB11) e muito mais…
A mensagem que as instituições pretendem levar aos parlamentares
é a de que, com limitação dos juros em 30% ao ano, provavelmente 6
milhões de clientes deixarão de ter acesso ao cheque especial – um
terço dos usuários da linha. No caso dos cartões, a questão é bem
mais complexa. A estimativa é que 20 milhões ficarão sem cartão de
crédito, e essas pessoas gastam, por ano, R$ 200 bilhões no
comércio. Mais do que isso, o teto acabará com o parcelado sem
juros, importante vetor do varejo no Brasil.
Por isso, o que os bancos pretendem fazer é sugerir um
meio-termo, de forma que as taxas caiam, mas não de forma tão
abrupta, preservando seus modelos de negócios e também os de
varejistas e credenciadoras que antecipam recebíveis. Nesse
cenário, as instituições abririam mão de parte da receita,
cortariam os limites de crédito de uma parcela menor de clientes e
o varejo reduziria a dependência do parcelado sem juros. “Em vez de
machucar muito, machuca um pouco cada”, diz um interlocutor a par
das conversas.
O parcelado sem juros só existe no Brasil, e acabou se
consolidando não só como um substituto do cheque pré-datado, mas
como um motor para o varejo. A modalidade representa cerca de
metade do volume transacionado com cartão de crédito, segundo a
Abecs, associação das instituições que atuam no setor. Não à toa,
todas as tentativas anteriores dos bancos de mexer nesse ponto
fracassaram.
A questão é ainda mais sensível em meio à crise trazida pela
pandemia de covid-19. Uma mudança no parcelado sem juros agora pode
atrapalhar a recuperação do comércio, diz fonte próxima aos bancos.
Por esse motivo, a ideia é buscar uma solução de longo prazo.
No caso dos cartões, uma consultoria foi contratada pela Abecs
para buscar alternativas, que devem ser discutidas nos próximos 30
dias, segundo outra fonte. Os resultados serão apresentados ao
Banco Central (BC), com quem o setor já discute um aperfeiçoamento
das regras há seis anos. A partir daí, a ideia é entregar uma
proposta ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O deputado
já sinalizou que vai engavetar o projeto de lei aprovado no Senado
que estabelece o teto de juros, mas quer que os bancos mostrem
“soluções”.
O rotativo dos cartões tinha taxa em média de 242% ao ano em
junho. No cheque especial, que já foi alvo de tabelamento imposto
pelo BC, a média é de 110,2% ao ano. A Selic está em 2% ao ano.
O projeto de lei já sofreu modificações no Senado e agora prevê
a redução das taxas a 30% para bancos e a 35% ao ano para fintechs
nas operações contratadas durante o período de calamidade pública –
em princípio, entre março e dezembro deste ano. No entanto, as
instituições financeiras veem uma pressão por mudanças nesses
produtos para além da pandemia, daí o interesse em aproveitar para
tratar de uma revisão mais ampla.
Com isso, o setor deve recolocar na mesa uma discussão antiga
sobre a estrutura do mercado de cartões no Brasil, considerada uma
“jabuticaba”. No país, uma série de subsídios cruzados no produto
encarece as taxas para os clientes. As pessoas pagam juros altos no
rotativo porque estão isentas em outras situações. Primeiro, no
período de carência da cobrança, que ocorre entre a compra e o
vencimento da fatura, que dura cerca de 30 dias. Segundo, porque
existe o parcelado sem juros. Compras à vista e parceladas
representam 76% do volume de transações com cartões de crédito.
O parcelado sem juros implica outra questão para os bancos. Quem
decide se oferece ou não o parcelamento aos consumidores é o
lojista. Mas quem corre o risco da inadimplência é o emissor.
O tema já é debatido entre o setor e o BC há anos. Em 2017,
entrou em vigor regra que limita a 30 dias a permanência dos
clientes no rotativo. Depois disso, as faturas são parceladas como
crédito pessoal – na prática, a taxa de 242% ao ano só é paga
durante um mês.
No ano passado, o setor também lançou uma opção de crediário,
que o cliente pode contratar na maquininha, no ato da compra. O
produto oferece parcelamento mais longo, mas com juros. Houve pouca
adesão, porém. Embora o parcelado tenha uma série de taxas
embutidas, tem um apelo grande para os consumidores.
O caso do cheque especial é mais simples. A linha é rentável
para os bancos, mas representa menos de 3% da carteira de crédito
de pessoas físicas. Neste ano, passou a valer o teto de 8% ao mês
para as taxas da linha. As instituições optaram por não cobrar
tarifas dos clientes, mas a nova regra prevê essa possibilidade.
Outro caminho é restringir o produto a um número menor de clientes,
mas isso afetará sobretudo os de baixa renda.
Matéria do Valor Econômico