Em meio à toda polêmica sobre a aquisição da Linx (BOV:LINX3),
disputada pela Stone e Totvs (BOV:TOTS3), a Associação de
Investidores no Mercado de Capitais (Amec) se pronunciou
oficialmente sobre o caso.
Criada em 2006, a Amec reúne cerca de 60 grandes investidores,
entre gestoras de recursos e fundos de pensão, com uma carteira
somada de ações da ordem de R$ 700 bilhões. Seu maior propósito é
preservar os interesses dos minoritários.
A polêmica em torno da operação ocorre em meio às críticas ao
modelo proposto para a fusão entre Linx e Stone. Dias depois da
proposta ter se tornado pública, em meados de agosto, a gestora
FAMA Investimentos divulgou uma carta destacando que ela
beneficiaria injustamente os diretores da Linx, em detrimento aos
demais acionistas.
A Amec, em nota, destacou ainda que o Conselho de Administração
da companhia estabeleceu contrato que traz restrições à atuação dos
acionistas, inclusive prevendo penalidades que limitam a decisão da
Assembleia. Assim, houve demonstração de que não se tratava de
“business as usual”.
Nos termos originalmente apresentados, a proposta para
incorporação da Linx foi avaliada em cerca de R$ 6 bilhões, sendo
ajustada depois para aproximadamente R$ 6,3 bilhões, enquanto a
chamada multa compensatória por eventual desistência foi
estabelecida em R$ 605 milhões, representando algo em torno de 10%
do valor do negócio.
Conforme aponta o texto da Amec, o contrato foi realizado em
condições que lançam dúvidas sobre a alçada decisória do Conselho,
especialmente quando impõe cláusulas inovadoras que geram
incertezas sobre sua legitimidade, uma vez que alcançam direitos
soberanos dos demais acionistas na decisão sobre a operação.
“Nesses processos, os acionistas devem receber tratamentos
equânimes, não podendo ser alijados da decisão sobre o mérito
dessas operações”, avalia.
“O documento teve ainda o condão de dificultar, ou mesmo
impedir, que fossem analisadas propostas alternativas que
eventualmente trariam condições mais vantajosas à empresa”, aponta
a Associação ao fazer referência à proposta apresentada pela Totvs
e tornada pública posteriormente. A Totvs fez uma oferta mais
vantajosa aos minoritários, mas que teria, a princípio,
sido ignorada pela diretoria da Linx.
Decisão é dos acionistas
Em meio a esse cenário, a Amec pontua que a decisão a respeito
da aceitação de uma operação de
reorganização societária deve ser deslocada aos acionistas, não
podendo os administradores da companhia ou qualquer outra parte
envolvida na operação tomar medidas que visem a frustrar a
soberania da decisão da assembleia.
“Os administradores, portanto, devem agir de modo a não criar
obstáculos à deliberação dos sócios, particularmente quando se
considera a existência de intersecções nas diferentes competências
de algumas partes interessadas, sob pena de serem levantados
questionamentos indesejados sob a ótica do conflito de interesses”,
ressalta a associação.
A Amec ainda ressalta que, como princípio de governança, é
preciso separar o papel do gestor e do Conselho, o que não estaria
ocorrendo no caso da Linx, já que o CEO, Alberto Menache, não só
atua no Conselho, como também é acionista relevante.
O caso se agrava quando elementos de benefícios particulares
estão presentes, uma vez que os três acionistas fundadores
(Menache, Nércio Fernandes e Alon Dayan) receberiam contratos
avaliados em R$ 215 milhões em contrapartida à vedação de
competição no futuro.
Assim, o pagamento de benefícios indiretos ou a adoção de
relações de troca que gerem assimetrias entre os acionistas da
companhia alvo, na avaliação da Amec, devem ser interpretados
como formas aptas para impor a restrição de direitos dos
acionistas. “É inquestionável e inegociável o fato de que ações de
uma mesma classe, e em condições de equilíbrio, devem receber
propostas idênticas em processos de incorporação”, ressalta.
Além disso, a associação avalia que, se houver o pagamento de um
prêmio a apenas um grupo, “haverá um precedente perigoso e
indesejado no país”, especialmente por se tratar do mais alto nível
de listagem da bolsa brasileira (Novo Mercado), que a princípio
deveria garantir tratamento equânime a todos os sócios. “Agir de
forma diferente é nocivo ao mercado local pela maneira como a
operação foi desenhada”, afirma.
A expectativa dos investidores é de que os conselheiros
independentes da Linx, que já renegociaram os termos iniciais da
proposta da Stone e agora apreciam a oferta da Totvs, coloquem as
duas propostas para a votação em assembleia.
Em nota enviada ao InfoMoney quando a
polêmica ganhou destaque, a administração da Linx informou que
“procederá em acordo com seu dever fiduciário e analisará a nova
oferta, por meio de processo formal a ser conduzido sob
responsabilidade exclusiva de seus conselheiros independentes.”
Vale ressaltar que, após a polêmica, os conselheiros
independentes da Linx renegociaram a proposta da Stone, reduzindo
multas e elevando o valor da oferta, enquanto os fundadores
revisaram os acordos de não competição, com redução de valores.
Fundadores processam gestor da FAMA por calúnia
Em meio a disputa pela compra da Linx, os
fundadores da companhia, Alberto Menache, Nércio Fernandes e Alon
Dayan, estão processando o co-fundador e portfólio manager da FAMA
Investimentos, Fábio Alperowitch, por calúnia e difamação.
“Em meio a uma disputa acirrada em relação a compra da Linx, um
processo nesse âmbito soa um pouco estranho e pode abrir margem
para uma interpretação de perseguição”, disse uma fonte com
conhecimento do assunto.
Apesar da relação com as empresas, o processo por crimes contra
a honra é realizado no âmbito das pessoas físicas. O código penal
brasileiro prevê que crimes contra a honra atentem contra a “honra
subjetiva ou a honra objetiva, seja ofensa a dignidade pessoal ou a
fama profissional, retirando do indivíduo seu direito ao respeito
pessoal”.
A FAMA Investimentos possui 3% da Linx e, desde o início das
negociações pela aquisição da empresa, se demonstrou contrária aos
termos de uma possível aquisição da Linx pela Stone.
O entrevero entre a FAMA e a Linx teve início justamente em
relação a participação dos três fundadores na negociação de venda
da companhia de empresa de softwares para o varejo para a
Stone.
No início de agosto, a FAMA divulgou carta aberta em que
apontava que a proposta de R$ 6,04 bilhões da Stone previa
que os principais executivos da Linx iriam receber cerca de R$
46 por ação, valor cerca de 35% maior do que o recebido pelos
minoritários.
Para a FAMA, o valor maior era um prêmio “disfarçado” para os
fundadores da Linx, o que prejudicaria os acionistas minoritários.
Na carta, a FAMA afirma que os prêmios “ferem nitidamente os bons
princípios de governança corporativa, bem como a conduta moral e
ética que não apenas esperamos mas exigimos das companhias”.
Caso a proposta da Stone fosse aceita nesses termos,
especialistas previam que a disputa entre minoritários e os
fundadores da Linx poderia parar na Justiça. Com o processo por
crime contra a honra, a judicialização da disputa parece ter
começado.