Margem de segurança na prática
06 Outubro 2021 - 11:10AM
ADVFN News
O que vai acontecer com a Evergrande? A empresa dará calote ou
vai ser salva pelo governo chinês? Teremos uma nova greve dos
caminhoneiros em função da subida do preço do combustível? Quem
serão os candidatos para a próxima eleição?
Essas são algumas das perguntas que recebi ao longo
das últimas semanas no Instagram, no e-mail e nas rodas de amigos.
Para não ficar um clima chato com meu interlocutor, em vez de
responder com um sonoro “não sei”, que seria a única resposta
genuína, devolvo o questionamento com outra pergunta: “Dado o
cenário e todas essas dúvidas, que tal pensar no que você deveria
fazer com o seu portfólio em lugar de tentar adivinhar o que virá
pela frente?”.
Essa é uma mudança de perspectiva sutil, mas que
guarda um ponto importante sobre como devemos tratar nossos
investimentos. Mais importante do que tentar prever o desenrolar
dos eventos mundo afora é posicionar o portfólio para os mais
variados cenários que podem acontecer, de modo a não sofrer um
revés grande quando o imponderável ocorrer e se beneficiar quando
as coisas forem bem.
Para os eventos mais recentes, além do aumento das
proteções, voltamos para a prancheta para avaliar se esses
acontecimentos teriam reduzido de forma estrutural o valor
intrínseco dos ativos que sugerimos ou se a queda das ações foi
mais acentuada do que a destruição de valor – o que se traduziria
em uma oportunidade de compra. Abaixo compartilho o exercício
realizado com a empresa NotreDame Intermédica (GNDI3), uma das
várias com que o tenho feito nesses últimos dias.
Fundado há mais de 60 anos, o Grupo NotreDame
Intermédica (BOV:GNDI3) é uma das maiores operadoras de saúde do
país, com cerca de 4,2 milhões de beneficiários de saúde e 2,9
milhões de beneficiários de assistência odontológica. A empresa
opera planos de saúde, planos odontológicos e de saúde ocupacional
e possui um alcance de aproximadamente 68% dos beneficiários de
planos privados no país e uma participação de mercado de
aproximadamente 8%.
Ao longo de 2021, foi anunciada a proposta de fusão da
NotreDame com sua principal concorrente, a Hapvida (BOV:HAPV3).
Caso a transação seja aceita pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade), formará a maior empresa de saúde verticalizada do
país, com posição altamente complementar e infraestrutura
nacional.
Sobre esse aspecto, embora a Superintendência-Geral do
Cade tenha emitido um parecer no último dia 24 em que afirma que a
fusão com a Hapvida é complexa e que é preciso realizar novas
diligências para aprofundar a análise, não nos parece que será
completamente inviabilizada. Do nosso ponto de vista, o processo
provavelmente demorará mais tempo do que o esperado (início do ano
que vem) e alguns remédios deverão ser aplicados para evitar
excesso de concentração em determinadas cidades. Ainda no campo do
M&A, a NotreDame anunciou a aquisição de outras três companhias
entre junho e julho deste ano.
O leitor atento pode argumentar, com razão, que houve
um aumento importante da sinistralidade para a companhia neste ano.
É verdade, ao contrário do ocorrido no ano passado, em que o menor
fluxo de pessoas na rua e o receio de sair de casa provocou uma
melhoria substancial nos resultados da NotreDame, a segunda onda de
Covid ocorrida no início do ano e a retomada das cirurgias eletivas
provocou um aumento da sinistralidade que afetou substancialmente
os resultados da companhia nos dois primeiros trimestres deste ano.
Acreditamos que tal movimento seja excepcional, um acontecimento
conjuntural, e não estrutural para a companhia, que verá seus
índices de sinistralidade voltarem ao patamar anterior à medida que
a vida voltar ao normal.
Passados dez meses do início do ano, a companhia está
sendo avaliada em R$ 44 bilhões (R$ 4 bilhões a menos do que em
janeiro), mesmo com todos os avanços operacionais e aquisições
realizadas.
Se considerarmos um crescimento de receita orgânica da
ordem de 12% ao ano pelos próximos quatro anos e a manutenção do
crescimento inorgânico através da aquisição de players
estratégicos, teremos um crescimento de receita anual médio (CAGR)
de 19% ao ano pelos próximos quatro anos – abaixo dos 32% ao ano
reportados nos últimos três anos. Além disso, considerando-se que o
aumento da sinistralidade foi conjuntural e que a companhia
retornará para o patamar de sinistralidade caixa de 68% entre 2022
e 2023, teríamos uma recuperação do Ebitda (que foi duramente
afetado nos últimos dois trimestres) também entre 2022 e 2023.
Aplicando-se o método de fluxo de caixa descontado, com crescimento
de 6% na perpetuidade, estimamos que a companhia tenha um upside
superior a 40%.
Veja, a despeito do momento turbulento de mercado, dos
riscos fiscais, políticos, da subida da taxa de juros
norte-americana, dos receios com inflação, da crise energética e
dos resgates que os fundos de ações estão sofrendo por aqui, os
fundamentos da companhia seguem sólidos, impulsionados pela
demografia brasileira, o aumento do desejo de possuir um plano de
saúde privado e o seu posicionamento de modo a combater as
ineficiências e fraudes do setor de saúde, fatores estruturais que
seguirão evoluindo ao longo dos anos.
Voltando ao bate-papo com meus interlocutores, não sei
qual será o desenrolar de cada um dos eventos detalhados acima nem
quando o mercado enxergará todo esse valor em GNDI, mas, ao estudar
os fundamentos da companhia e do setor em que está inserida,
acredito que, no patamar atual, a margem de segurança encontra-se
bastante grande. Sob outra perspectiva, dado o cenário atual, a
chance de perda permanente de capital é bastante baixa.
Forte abraço,
Fernando Ferrer
HAPVIDA ON (BOV:HAPV3)
Gráfico Histórico do Ativo
De Mar 2024 até Abr 2024
HAPVIDA ON (BOV:HAPV3)
Gráfico Histórico do Ativo
De Abr 2023 até Abr 2024