Com muito dinheiro no caixa após uma série de captações, o setor
de saúde no Brasil passa por uma transformação, algo que já ocorre
há mais tempo em outros mercados onde a atuação de empresas
privadas é robusta, como nos EUA.
Nos últimos dois anos, o setor de saúde lidera o ranking de
fusões e aquisições e reúne as maiores operações de compra de
empresas no Brasil. Apenas do início de 2021 até agora, foram cerca
de 150 transações, que movimentaram mais de R$ 20 bilhões – mesmo
com a perspectiva de desempenho fraco da economia para este
ano.
Duas das maiores transações ocorreram nesse período: a fusão,
por meio de troca de ações, entre as operadoras de planos de saúde
Hapvida e a NotreDame Intermédica – um negócio que cria uma empresa
com valor de mercado de mais de R$ 80 bilhões -, e a compra da
seguradora SulAmérica pela operadora de hospitais Rede D’or, um
acordo de mais de R$ 10 bilhões.
Disputa
O surgimento de grupos gigantes, que leva a uma maior
concentração de mercado, é acompanhado de perto pelos participantes
do setor, que avaliam os efeitos desse avanço das empresas em seus
próprios negócios. Mesmo antes de se juntarem, Hapvida (BOV:HAPV3)
e NotreDame Intermédica (BOV:GNDI3) já vinham protagonizando
aquisições em série, com o objetivo de se tornarem empresas
verticalizadas, o que significa que o cliente de seus planos de
saúde é atendido pela rede de hospitais e clínicas da própria
empresa.
Na Hapvida, a estimativa é de que quase a totalidade das
cirurgias eletivas (as não emergenciais) será feita na rede de
hospitais própria, algo que dá à empresa um maior controle de seus
custos. Donas da maior fatia do mercado, com mais de 20% entre os
planos individuais, a Hapvida e a NotreDame Intermédica atendem ao
segmento mais básico e conseguem ter preços competitivos. Com isso
crescem até em momentos de crise. O receio de concorrentes é que
com o tempo o grupo, agora com mais musculatura, avance em outros
segmentos, como os de clientes de renda mais alta.
Por trás das fusões está o caixa recheado dessas empresas, que
abriram capital na Bolsa em 2018 (Hapvida e Notre Dame Intermédica)
e 2020 (Rede D’Or). No mesmo sentido, no ano passado os grupos
hospitalares Mater Dei (BOV:MATD3) e Kora Saúde (BOV:KRSA3) também
foram ao mercado buscar recursos, embora ainda não tenham aberto o
capital.
O assunto está tão efervescente que recentemente um acionista em
comum da Mater Dei e da Kora, a gestora de investimentos Polo
Capital, defendeu a união das empresas, tanto para participar da
consolidação do setor quanto para se proteger da onda
concentradora. Por enquanto sozinha, a Mater Dei deu um passo e
comprou o controle de um hospital em Minas, aumentando a presença
no Estado. Nenhum grupo com caixa está ficando parado.
Negócios estão só no início
Do lado dos planos de saúde, a fusão de grandes grupos começa a
incomodar, porque já existe a leitura de que as companhias que
estão cada vez mais encorpadas irão avançar em mais segmentos no
setor de saúde – e com potencial de atrair clientes de
concorrentes. Analistas de bancos de investimento afirmam que há
mais negócios para sair.
O sócio da consultoria PwC Brasil, Leonardo Dell’Oso, destaca
que a consolidação está apenas no início, mesmo após um ano de
recorde de transações para o setor no ano passado. “O que explica
essas aquisições de hospitais não é apenas que os grandes grupos
estão com robustez de caixa, mas também que as empresas estão
querendo ganhar massa e racionalizar custos”, afirma ele, que
lidera a área de fusões e aquisições na consultoria.
Dell’Oso lembra que hospitais sofreram no início da pandemia,
com a suspensão de cirurgias eletivas (as não emergenciais), e as
empresas que entraram na crise menos preparadas se tornaram alvo de
aquisição de grupos maiores. “Muitos hospitais tiveram de buscar
uma alternativa estratégica”, diz.
Ainda de acordo com o especialista em fusões, uma próxima onda
de aquisições envolverá as healthtechs (as empresas de tecnologia
do setor de saúde), um crescente alvo das empresas tradicionais do
setor.
A perspectiva de que novas transações no setor devem acontecer é
compartilhada pelo sócio da Ondina Investimentos, Ítalo Miranda.
“Os níveis de transações tendem a continuar bastante elevados, os
compradores estão com pressão por verticalização”, diz.
Segundo ele, um movimento que pode começar a ser observado é o
de aquisições por fornecedores de serviços, caso de redes de
laboratórios, que estão mais pressionadas pelos grandes grupos
concorrentes e podem começar a olhar também por exemplo, as
operadoras de planos de saúde.
Para dentro
A Rede D’Or (BOV:RDOR3), conhecida por ser agressiva em
aquisições, tem feito anúncios de compras de hospitais
periodicamente, se fortalecendo na primeira posição dos grupos de
hospitais. Mas, ao incorporar a SulAmérica (BOV:SULA11), colocando
para dentro uma operadora de planos de saúde, a ideia não é fazer
uma verticalização dos negócios, apostando no atendimento em uma
rede própria. Isso não seria possível no segmento que ela atende,
afirma um executivo próximo da empresa, que não quis ser
identificado.
Segundo ele, no segmento mais acima da pirâmide, onde a Rede
D’Or atua, não dá para verticalizar, mas dá para aumentar o mercado
de atuação. A razão disso é que, no mercado de saúde de renda mais
alta, o cliente não quer ser tratado apenas nos hospitais São Luiz,
da Rede D’Or, mas em hospitais considerados topo de linha como o
Albert Einstein ou o Oswaldo Cruz, ambos na capital paulista.
Por isso, a mensagem tem sido que a compra da SulAmérica não é
um sinal de que a empresa se verticalizará, apesar do negócio
trazer uma nova frente de crescimento.
Há ainda outras razões por trás do negócio que analistas de
mercado ainda não computaram. A ideia da Rede D’Or com a transação
é aumentar a sua oferta de serviços, ganhar mais eficiência
(especialmente na estrutura corporativa) e acompanhar de forma
ativa a saúde do cliente. E mais: quando a empresa abrir um novo
hospital, esse sim o negócio que é o carro-chefe da Rede D’Or, o
empreendimento já terá um plano de saúde em que estará credenciado,
trazendo rentabilidade logo na largada.
O efeito em cadeia deverá mexer com os demais concorrentes. A
operadora de saúde Amil, que repassou seus planos individuais para
outra empresa – outro imbróglio do setor – ainda é grande em planos
corporativos e possui alguns hospitais próprios, para os quais
busca comprador. É por isso que tanto a Rede D’Or como a Bradesco
Saúde, conforme fontes, estão de olho nesses ativos.
Informações Broadcast
Hospital Mater Dei S.A ON (BOV:MATD3)
Gráfico Histórico do Ativo
De Mar 2024 até Abr 2024
Hospital Mater Dei S.A ON (BOV:MATD3)
Gráfico Histórico do Ativo
De Abr 2023 até Abr 2024