A capitalização da Eletrobras, que resultará na diluição da participação da União no capital da empresa e sua transformação em uma corporação, deixará menos espaço para eventuais manobras governamentais ou ingerência política na elétrica, segundo especialistas.

Embora a expectativa com a operação seja de que a União mantenha aproximadamente 45% do capital votante da companhia – abaixo dos atuais 77%, mas se mantendo como o maior acionista -, o estatuto da empresa passará a prever que cada acionista só poderá exercer voto correspondente a até 10% do capital votante.

Neste sentido, o modelo adotado difere do da Petrobras, que também passou por processo similar de capitalização, mas manteve sua característica de empresa de economia mista. Ali, a União, com 50,26% do capital votante, manteve efetivamente o poder de controle e comando, com maior poder de decisão de fato sendo exercido.

Embora em ambos os casos a União tenha adotado ofertas de ações para capitalizar a empresa, os objetivos são distintos: na petroleira, o Estado visava garantir recursos para investimentos na exploração do pré-sal, enquanto no caso da Eletrobras (BOV:ELET3) (BOV:ELET5) (BOV:ELET6) a intenção é na privatização da empresa. Os recursos que serão levantados serão direcionados, principalmente, para o pagamento de outorgas de novas concessões das hidrelétricas da companhia, em substituição aos contratos atualmente vigentes, ou seja, irão para os cofres da União.

“São situações um pouco diferentes. Apesar da relevância no seu setor, a Eletrobras tende a ter uma governança um pouco mais blindada de intervenções do governo, de acordo com o modelo atual de privatização”, diz o analista da Control Risks Gabriel Brasil. “Isso deve evitar um pouco das pressões que sofre atualmente a Petrobras.”

O presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso, também afasta a possibilidade de um paralelo entre a atuação que a União terá na Eletrobras e a que exerce na Petrobrás. Para ele, os direitos da União, pós-capitalização da Eletrobras, serão bastante limitados e a estrutura de capital levará ao modelo “corporation”, no qual o governo terá menos poder de ação do que possui atualmente na petroleira. “Sempre tem risco do governo querer criar confusão em reunião de conselho, administração, assembleia…. Mas não acredito”, disse.

Para o advogado especializado em Infraestrutura e Direito Administrativo e sócio do escritório Castro Barros Advogados, Paulo Henrique Spirandeli Dantas, o modelo que está sendo utilizado se aproxima mais da privatização de empresas como Vale e Embraer, leiloadas na década de 1990. Ele se refere em particular ao fato de que também nessas empresas o Estado manteve participação, mas sem voz de comando.

“Não será mais a União que vai determinar o comando da empresa, vai para uma lógica privada, perde a condição de empresa de economia mista e se transforma em empresa privada que tem participação do Estado… a União seguirá um acionista relevante, mas estará sob as regras da nova companhia e terá uma limitação do que pode fazer, ainda que seja sócia com grande parte das ações”, disse.

Sinal de alerta

Gabriel Brasil, da Control Risks, diz que, como o tema da energia tende a seguir “politicamente saliente” no Brasil, “é difícil imaginar uma blindagem completa para a Eletrobras, mesmo que o governo reduza seu controle sobre a empresa”.

O sócio do Madrona Advogados Rodrigo Machado chama a atenção para o fato de a União manterá a participação de 45%, com direito de voto de apenas 10%. Para ele, embora possa ser positivo, do ponto de vista dos cofres públicos, manter uma fatia maior da empresa, para receber mais dividendos, do ponto de vista societário a situação é “difícil”.

“Não é comum ter uma ação ordinária só pelo dividendo, sem o direito que vem com aquilo; não vejo sentido que o acionista tenha participação de 45% e não tenha o direito político atrelado.” Para ele, embora essa situação não seja uma ilegalidade, uma vez que há uma lei que prevê essa estrutura, existe uma “incoerência intrínseca”. “Potencialmente, no longo prazo, pode dar um problema, como uma pretensão de ingerência maior”, afirmou.

Ele se refere ao fato de uma possível manobra, em um futuro governo, visando alterar a regra de limitação do poder político, tendo em vista a posição acionária, ainda que o movimento dependa de uma alteração nas leis.

Neste sentido, vale lembrar que candidatos à Presidência da República nas eleições deste ano e representantes de seus respectivos partidos já se colocaram contrários à privatização. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já declarou diversas vezes não concordar com a privatização da Eletrobras, e seu partido, o PT, chegou a entrar com uma ação na Justiça contra a operação. Já o candidato do PDT, Ciro Gomes, afirmou que a privatização “é um crime”.

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