As empresas de saneamento voltaram aos holofotes do mercado após os decretos do governo federal sobre mudanças no marco legal do setor (que foram vistos como negativos para investimentos do setor privado) e com as últimas notícias sobre reajustes tarifários de empresas do setor listadas na Bolsa brasileira.

Com todo esse noticiário no radar, o JPMorgan elevou a recomendação para as units da Sanepar (BOV:SAPR11) de underweight (exposição abaixo da média do mercado, equivalente à venda) para neutro. O banco levou em conta um desempenho significantemente inferior dos ativos frente aos seus pares nos últimos dois anos, o que a deixou sendo negociada a 0,5 vez o múltiplo de Valor da Firma (EV) em relação à Base de Ativos Regulatórios (RAB), ou EV/RAB, um desconto acentuado em relação às empresas brasileiras de água e energia elétrica.

O banco acredita que a conclusão da segunda revisão tarifária da Sanepar no segundo trimestre de 2023 (2T23) deve eliminar as incertezas e colocar a empresa em um ambiente de fluxo de caixa mais previsível e estável pelos próximos 2 anos.

Além disso, conforme aponta a análise, o governo do Paraná está adotando um ambiente mais favorável ao mercado, incluindo um processo de privatização para a estatal paranaense de energia Copel (BOV:CPLE6).

O JPMorgan estima que o reequilíbrio tarifário aprovado neste segundo trimestre de 2023 (2T23) como resultado da revisão tarifária (retroativa a 2021), levará a uma expansão do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) de 23% neste ano e em relação ao ano anterior e um adicional de 11% em 2024. O novo preço-alvo em dezembro de 2023 passou de R$ 20 para R$ 22.

A Sanepar, cabe lembrar, divulgou nesta semana que o processo de revisão tarifária organizado pela agência reguladora do Estado (Agepar) indicou um índice de aumento dos valores cobrados dos clientes de 8,47%. O percentual aponta para uma tarifa no valor de R$ 6,4524 por metro cúbico. A Agepar vai realizar em 18 de abril audiência pública sobre o resultado dos estudos de revisão tarifária (assim, os números ainda não são definitivos).

A Genial, por sua vez, apontou em análise sobre a revisão tarifária que os dados publicados pela Agepar são decepcionantes, ainda que razoavelmente esperados tendo em vista as informações divulgadas pela própria empresa sobre qual base seria submetida a para sua revisão tarifária (R$ 15,6 bilhões versus R$ 18,9 bilhões, de acordo com as suas estimativas para 2020).

“O anúncio ratifica os vícios replicados ao longo dos últimos meses: o não reconhecimento pleno dos investimentos e inflação acumulada ao longo do período, ocasionando em uma base de remuneração regulatória abaixo do que deveria ser. Consequentemente, a tarifa que a empresa deverá deve ficar abaixo das nossas estimativas”, avaliam os analistas da casa, com uma visão mais negativa sobre o processo.

Para eles, incertezas quanto a reajustes/revisões tarifárias não apenas têm ocasionado uma destruição de valor explícita da empresa como também trazem um aumento da percepção de risco de se investir em um negócio que tem (ou deveria ter) como ponto forte exatamente a previsibilidade. “Por último, é importante lembrar que, por se tratar de um primeiro ano pós eleições estaduais vis-a-vis os múltiplos deprimidos da empresa, a possibilidade de um reajuste mais robusto não era descartada”, avalia.

Para a Genial, a “fotografia” da empresa não é ruim, uma vez que ela tem boa rentabilidade (maior do setor, inclusive), boas margens, distribuição de dividendos razoável, serviços de água universalizada, entre outros.

Entretanto, a maior percepção de risco regulatório – que foi escalado à medida que a interferência migrou para o processo de revisão tarifária para além dos reajustes anuais – deve fazer com que o desconto histórico que o valuation da empresa tem em relação aos seus pares permaneça, avalia. A recomendação da Genial para os ativos SAPR11 é de manutenção, com preço-alvo de R$ 24.

Na mesma linha, o JPMorgan também ressaltou esperar que a Sanepar deve manter um desconto em relação aos pares Sabesp (BOV:SBSP3) e Copasa (CSMG3) devido a um risco regulatório mais elevado e com a falta de perspectivas de privatização.

A Sabesp, por sua vez, continua sendo a escolha principal do JPMorgan no setor devido a melhor assimetria de risco, catalisadores positivos (reforma operacional com nova administração e desdobramentos sobre a privatização).

O JPMorgan mantém assim recomendação overweight (exposição acima da média do mercado, equivalente à compra), mas reduziu preço-alvo de R$ 55 para R$ 54, pois o ajuste tarifário de 9,56% da companhia paulista ficou aquém das expectativas. Os resultados do 4T22 da Sabesp também ficaram aquém das expectativas do banco, mas, por outro lado, as perspectivas parecem mais positivas.

“A nova equipe de gestão ainda não está fornecendo orientações para corte de custos e/ou melhoria operacional, mas já incorporamos algumas dessas estimativas. O maior potencial de alta da Sabesp continua sendo a conclusão do processo de privatização – um processo binário. Temos um cenário otimista de privatização (Bull Case) com preço-alvo de R$ 100”, diz o relatório do banco.

O BTG Pactual, por sua vez, apontou que, embora o número final de sua revisão tarifária extraordinária tenha ficado aquém do número preliminar divulgado em dezembro, isso ajuda a reduzir o risco de parte da tese de investimento, pois reduz fortemente a lacuna entre a receita real da Sabesp e sua ‘receita regulatória’ (ou seja, o nível almejado definido pela Arsesp). A recomendação da casa para as ações também é de compra, com preço-alvo de R$ 63, com os analistas também avaliando que os múltiplos da empresa não parecem precificar o cenário potencial de privatização.

Por outro lado, avalia o BTG, embora acreditem que a privatização seja necessária para liberar todo o seu potencial, não acha que uma expansão de múltiplos dependa totalmente dela. “Com operações tão ineficientes, ainda há muito o que ser feito, mesmo sendo estatal (turnarounds semelhantes foram feitos na Copel e na Eletrobras). E agora que a Sabesp tem uma nova gestão, liderada pelo CEO André Salcedo, acreditamos que ela está no caminho certo para destravar muitas dessas melhorias operacionais”, avalia.

Nesta semana, o Citi também reiterou recomendação de compra para a Sabesp e elevou o preço-alvo de R$ 70 para R$ 72, de forma a incorporar os reajustes de tarifas e também destacando os múltiplos baratos da empresa. Para o banco, o caso de Sabesp é uma das principais assimetrias em 2023-2024 dentro do seu universo de cobertura.

Enquanto a Sabesp é a preferida do JPMorgan, a Copasa (BOV:CSMG3) é atualmente a “menos preferida” do banco no setor, pois os analistas da casa veem um potencial limitado de alta e uma menor probabilidade de privatização em comparação com a Sabesp.

A Sabesp e a Copasa estão negociando com múltiplos EV/RAB muito similares de 0,7 vez, mas no caso da Copasa, há um obstáculo adicional para desbloquear o potencial de valorização. O governador de Minas Gerais, Romeu Zema, precisa mudar a constituição do estado para poder privatizar a Copasa, por isso o banco acredita que as chances são ainda mais remotas na estatal mineira – pelo menos por enquanto.

Os analistas do JPMorgan elevaram o preço-alvo de CMSG3 de R$ 14,50 para R$ 17, visando refletir a continuidade dos resultados melhores de 2022, o aumento tarifário de 15,70% que entrou em vigor em janeiro de 2023, o fim da sobrecarga do aumento de capital e ajustes finos. No entanto, esses desenvolvimentos positivos já estão precificados, na opinião de analistas.

No entanto, o JP destaca que a Copasa está oferecendo os melhores rendimentos de dividendos no setor, em torno de 9% em 2023 e 2024 com base em um payout de 50%, e a “possibilidade de privatização continua viva”.

Compilação feita pela Refinitiv com casas de análise e bancos também mostra uma preferência por Sabesp. De 17 casas que cobrem SBSP3, 15 recomendam compra da ação e só 2 possuem recomendação neutra, com preço-alvo médio de R$ 71,40. Para as units da Sanepar, de 9 casas que cobrem o ativo, 1 apenas recomenda compra, 7 recomendam manutenção e 1 recomenda venda, com preço-alvo médio de R$ 23,78. Já para CSMG4, 13 casas cobrem o papel, com 5 recomendando compra, 5 manutenção e 3 recomendando venda, com preço-alvo médio de R$ 17,48.

Novo marco legal e privatizações

A Genial aponta que as suas recomendações nos players do setor de saneamento dizem muito mais respeito sobre a possibilidade de privatização das mesmas do que de sobre as expectativas de receita, lucro, dividendos, entre outros.

“Na realidade, se estamos em um momento que os governos estaduais dos estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná têm adotado uma postura pró-privatização, vender as ações das empresas de saneamento pode significar abrir mão de um potencial de valorização expressivo. Cabe a nós entendermos qual desses veículos é o mais interessante e que vale a pena se estar exposto para capturar esses movimentos”, avalia.

Neste sentido, também foram feitas muitas análises sobre o impacto dos decretos modificando o novo marco legal do saneamento no setor. Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou dois decretos que alteram alguns aspectos da lei de saneamento, que, entre outras coisas, permitirá que empresas estatais ineficientes e contratos irregulares/vencidos continuem operando por um período mais longo, segundo destaca o BTG.

A lei do saneamento estabeleceu prazos para que as estatais comprovem sua capacidade econômico-financeira até dezembro de 2021 e para que os municípios se enquadrem às exigências da regionalização até março de 2023. No entanto, algumas estatais, que juntas operam em mais de mil municípios, ainda não comprovaram sua capacidade econômica e financeira, e mais de 2 mil municípios não cumpriram a exigência de regionalização. Esses contratos irregulares deveriam ser novamente leiloados, mas os decretos recentes estenderam esses prazos.

A remoção do limite de serviço de 25% para as estatais assinarem Parcerias Público-Privadas (PPPs) mostra a disposição do governo de promover o crescimento do setor por meio destas versus concessões integrais, avalia.

Contudo, analistas de mercado veem pouco impacto para as privatizações já no radar. “As mudanças estipuladas pelos decretos no Marco do Saneamento podem atrasar o investimento privado, dado que a extensão dos prazos evita que concessões sejam relicitadas por desenquadramento. Por outro lado, nenhuma das mudanças propostas nos dois decretos mudam cláusulas que realmente viabilizam as privatizações, como a continuidade dos contratos de programa em caso de privatização”, avalia a XP Investimentos.

O BTG também aponta que as mudanças mais recentes visam preservar as estatais, especialmente em estados onde os governadores são contra a privatização. “No entanto, apesar do barulho, não achamos que essas mudanças tenham o poder de interromper os processos de privatização em andamento na Sabesp e na Copasa, pois os governadores Tarcísio e Zema têm se manifestado sobre a agenda de privatizações e todas as aprovações necessárias estão nas esferas estadual ou municipal”, avalia.

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