A Gol iniciou a reestruturação financeira na justiça americana. A Gol e suas subsidiárias estão entrando voluntariamente com pedido de Chapter 11 no Tribunal de Falências dos Estados Unidos para o Distrito Sul de Nova York (Tribunal dos EUA).

O Chapter 11 é um processo legal dos Estados Unidos utilizado pelas empresas para levantar capital, reestruturar as finanças e fortalecer operações comerciais no longo prazo, enquanto continuam a operar normalmente.

A Gol (BOV:GOLL4) disse que inicia o processo legal nos Estados Unidos com um compromisso de financiamento de US$ 950 milhões, na modalidade debtor in possession (DIP) por membros do Grupo Ad Hoc de Bondholders da Abra e outros Bondholders da Abra.

O DIP é uma modalidade de financiamento que permite à empresa arcar com as despesas operacionais durante a proteção judicial.

A companhia buscará acesso a esse financiamento como parte da audiência do Primeiro Dia com o Tribunal dos EUA, prevista para os próximos dias.

O financiamento está sujeito à aprovação judicial e, juntamente com o caixa gerado pelas operações em curso, fornecerá liquidez substancial para apoiar as operações, que seguem normalmente, durante o processo de reestruturação financeira.

“Com o suporte do processo supervisionado pelo Tribunal e com a liquidez adicional do financiamento DIP, os voos de passageiros da Gol, os voos de carga da GOLLOG, o programa de fidelidade Smiles e outras operações da companhia continuam normalmente”, afirmou a companhia no fato relevante enviado ao mercado.

O programa Smiles não terá alterações, assim como os acordos de codeshare e interline, que continuarão disponíveis para os clientes.

Em comunicado ao mercado, a companhia diz que buscará acesso a esse financiamento como parte da audiência, prevista para os próximos dias. A operação de crédito está sujeita à aprovação judicial e, segundo a Gol, com o caixa gerado pelas ações em curso, fornecerá liquidez substancial para apoiar as operações, que seguem normalmente, durante o processo de reestruturação financeira.

A companhia afirma que, com o suporte do processo supervisionado pelo tribunal e com a liquidez adicional do financiamento DIP, todas as suas operações continuam normalmente. Os voos estão operando conforme programado e as passagens aéreas e reservas permanecem em vigor.

“A Gol utilizará esse processo para reestruturar suas obrigações financeiras de curto prazo e fortalecer sua estrutura de capital para ter sustentabilidade no longo prazo. A companhia espera sair desse processo com um investimento significativo de capital, incluindo os novos US$ 950 milhões em financiamento DIP, posicionando-a para expandir sua posição como companhia aérea líder na América Latina”, diz o documento.

  • Governo

O CEO da Gol, Celso Ferrer, afirmou ontem que as empresas do setor aéreo conversam com o governo para garantir um preço de combustíveis competitivo e um custo de crédito mais baixo.

“Os programas do governo que acontecerem daqui para frente vão acelerar o processo de reestruturação”, disse o executivo em entrevista à imprensa. “O setor aéreo demanda crédito, e o acesso à capital a custo baixo é fundamental para a companhia”, afirmou.

O governo federal discute um plano de apoio às companhias aéreas para garantir uma redução nas tarifas (mais informações nesta página).

Ferrer disse que a Gol não prevê redução das operações após a decisão de entrar com Chapter 11.

“O Chapter 11 não terá impactos para passageiros e agentes de viagem”, afirmou. O executivo disse também que a empresa não planeja reduzir frota, rotas ou demitir funcionários.

“A proteção do Chapter 11 é justamente para não afetar a malha aérea”, explicou. Ele afirmou que a empresa deve continuar a renovação da frota. “Estamos recebendo uma aeronave agora”, complementou.

  • Prazo

O CEO disse ainda que é cedo para dar uma meta de endividamento, mas o objetivo é reduzir a alavancagem. “Esperamos sair desse processo com a estrutura de capital correta”, explicou.

Ferrer não deu prazo esperado pela companhia para concluir o processo na Justiça americana, mas disse acreditar que dure “significativamente menos” do que o de outras companhias aéreas da América Latina. A Latam e Avianca, por exemplo, demoraram cerca de dois anos.

Ferrer avaliou o processo de reestruturação das duas empresas como bem-sucedido, mas avalia que o momento atual é mais favorável para a Gol. “Não estamos em uma pandemia, é um cenário de demanda consistente”, disse. Para ele, a operação da Gol é mais simples, com apenas um tipo de aeronave, o que deve também contribuir para agilizar a conclusão do Chapter 11.

  • Gol enfrentará situação diferente da Latam

A empresa enfrentará uma situação diferente da Latam, que em 2020 também fez o processo de renegociação de dívidas na justiça norte-americana. Se por um lado o momento operacional é mais favorável à Gol, a demanda por aeronaves antigas no mundo, num momento em que há dificuldade das fabricantes cumprirem as entregas, complica a negociação com credores.

A opção pelo Chapter 11 tem relação com a estrutura da dívida da Gol. Os credores estão concentrados fora do país, com os arrendadores de aeronaves, também chamados de lessores, e detentores de títulos emitidos no exterior, afirmam especialistas ao Broadcast. “Diferentemente da legislação brasileira, a lei nos Estados Unidos impede a execução de dívidas de leasing, um dos principais calcanhares de aquiles da Gol”, explica Kleber Bissolatti, advogado especializado em recuperação judicial do Bissolatti Advogados.

As dívidas da Gol somam cerca de R$ 20 bilhões, com R$ 3 bilhões vencendo dentro de um ano. Cerca de metade do valor total é detido por 25 lessores. “A negociação com lessores está evoluindo, e em diferentes estágios, alguns estão nos apoiando muito”, afirmou o CEO da Gol, Celso Ferrer, em entrevista nesta tarde.

Para Fabio Melo, advogado da equipe de Recuperações e Falências do escritório Goulart Penteado, a opção pelo Chapter 11 foi essencial para garantir o sucesso do plano de recuperação da Latam, que conseguiu manter suas atividades durante o processo. “A justiça norte-americana é mais madura e previsível em casos de recuperação judicial, além de estar mais habituada a lidar com instrumentos como o DIP financing”, afirmou.

Ao anunciar o pedido de Chapter 11, a Gol informou que bondholders da Abra se comprometeram a um empréstimo de US$ 950 milhões no modelo DIP. Esse tipo de injeção de capital visa garantir a continuidade da operação da empresa durante a recuperação. Pela lei, os credores do DIP Financing têm preferência no pagamento frente às outras dívidas.

  • Maior demanda

Ainda que a demanda por passagens aéreas esteja abaixo dos níveis pré-pandemia, a tendência nos últimos meses é de alta. Em 2023, a demanda de voos, medida em RPK (receita por passageiro por quilômetro) teve alta de 15,3%, em relação a 2022, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

O cenário é bem diferente de quando a Latam entrou em recuperação, na pandemia. Em maio de 2020, quando a empresa chilena entrou com Chapter 11, a demanda de voos no mercado doméstico teve queda de 90,9%, na comparação anual. Em 2020, a demanda teve o menor patamar da série histórica da Anac, que começou em 2000, e recuando 48,7% no mercado doméstico, ante 2019.

A Gol estima que o processo dure “significativamente menos” do que o de outras companhias aéreas da América Latina. A Latam e Avianca, por exemplo, demoraram cerca de dois anos. Ferrer avaliou o processo de reestruturação das duas empresas como bem-sucedido, mas avalia que o momento atual é mais favorável para a Gol. “Não estamos em uma pandemia, é um cenário de demanda consistente”, afirmou.

O ambiente do setor também é visto como favorável por analistas. “O cenário atual é bem mais favorável para geração de caixa das empresas, com uma tendência de manutenção do crescimento da demanda e custos fixos mais estáveis”, avalia Ygor Araújo, analista da Genial Investimentos.

Em relatório, os analistas do Goldman Sachs, Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Martins apontam que, em 2024, as aéreas também terão mais poder de precificação com a dificuldade de aumento da oferta.

  • Problemas na oferta

A quebra na cadeia de suprimento das fabricantes de aeronaves está atrasando a entrega de novos aviões desde o ano passado. Por um lado, o descompasso entre demanda e oferta tem permitido que as tarifas atinjam o maior patamar dos últimos 14 anos. Em outubro, a tarifa média ficou em R$ 741,47, segundo o dado mais recente da Anac.

A falta de novas aeronaves, no entanto, dificulta a negociação da Gol com os lessores. “Quando a Latam entrou com Chapter 11, ninguém queria avião, então havia mais disposição dos lessores para negociar”, argumenta Alberto Valerio, analista do UBS BB. Até o ano passado, as aéreas, incluindo a Gol, estavam aproveitando a retomada na demanda para comprar novos aviões e substituir a frota por modelos com menor gasto de combustível e manutenção. “Nesse cenário a Gol vinha conseguindo negociar extensão de prazos”, explica Valerio.

O atraso dos fabricantes para entregar novas aeronaves, no entanto, acabou aumentando a demanda por aeronaves antigas. “Isso deixa a Gol numa situação mais complicada para negociar com os lessores”, explica Melo. “Mas o Chapter 11 muda um pouco o equilíbrio das negociações porque blinda a Gol temporariamente da execução de dívidas e retomada de aeronaves”, complementa o advogado.

  • Situação de financeira

Para especialistas consultados pelo Broadcast, a situação de caixa da Gol e da Latam não era muito diferente no momento em que ambas entraram com Chapter 11. A composição de caixa (caixa vs receita nos próximos 12 meses) da Gol atualmente é de 10%, segundo Valerio. “O índice de uma empresa saudável é acima de 30%”, explica o analista do UBS BB.

Quando a Latam entrou com Chapter 11, o indicador da composição de caixa era de 14%, no segundo trimestre, mas caiu para 7,5% no terceiro trimestre devido a compromissos devidos em junho, de acordo com dados do UBS BB.

“O mercado de crédito, no entanto, está diferente”, avalia Valerio. Ele aponta que a Latam se beneficiou da maior disponibilidade de crédito relacionado aos estímulos à atividade econômica no pós-pandemia. “A Gol enfrenta um momento de maior aversão ao risco”.

Além do DIP financing, outro tema que pode favorecer as negociações da Gol é o pacote de ajudas que deve vir do governo brasileiro. O BNDES já mostrou disposição em dar suporte às companhias.

O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, optou por não comentar concretamente sobre possíveis medidas do governo para socorrer a Gol. Ele disse, contudo, que tem se reunido com representantes de todas as companhias aéreas e que o Estado irá auxiliá-las como for possível. Conforme apurado pelo Broadcast, representantes da empresa estiveram na sede do ministério, em Brasília, na última terça-feira (16), justamente em busca de ajuda.

VISÃO DO MERCADO

Diversos analistas de mercado, contudo, revisaram as suas projeções para as ações da companhia aérea e também para possíveis outras empresas afetadas após o anúncio, também levando em conta mais detalhes informados pela companhia com o pedido confirmado.

Bradesco BBI

Em meio a esses acontecimentos, o Bradesco BBI reduziu a recomendação para as ações da Gol de neutra para underperform (desempenho abaixo da média do mercado, equivalente à venda) e cortou o preço-alvo em 90%, de R$ 10 para apenas R$ 1 (ou uma queda de 84% frente o fechamento da véspera).

O banco leva em conta, em seu cenário base, que o tribunal de falências dos EUA aceitará o pedido do Chapter 11 da Gol, como aconteceu com a Latam Airlines Brasil em 2020. No entanto, no fim do dia, o saldo de aproximadamente R$ 25 bilhões em reestruturação de passivos provavelmente diluirá os acionistas minoritários devido à conversão dos US$ 2,3 bilhões em dívida em patrimônio: 1) US$ 950 milhões de financiamento DIP, 2) US$ 1,2 bilhão relacionados à “nota garantida sênior” (ESSN) de 2028 e 3) US$ 100 milhões em passivos de arrendamento de aeronaves. Assim, vê uma enorme diluição patrimonial de 99%. No setor, destaca preferir Azul (AZUL4), com recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra), com preço-alvo de R$ 38). Já a Latam Airlines teve a recomendação elevada para equivalente à compra.

Goldman Sachs

O Goldman Sachs, por sua vez, parou de cobrir as ações da empresa após o pedido de RJ nos EUA. A recomendação anterior era neutra.

Citi

O Citi, por sua vez, seguiu com recomendação equivalente à venda para os ADRs (American Depositary Receipts, ou recibo de ações negociadas nos EUA) da Gol, com preço-alvo de US$ 3.

Para os analistas do banco americano, embora não esteja claro como este anúncio pode afetar as percepções dos passageiros, é possível que a Azul, com classificação de compra pelo banco, e a subsidiária brasileira da Laram Airlines, com classificação neutra, possam ver alguma repercussão de maior demanda deste evento. Já a a visibilidade de um potencial IPO da ABRA provavelmente está agora bastante reduzida.

JPMorgan

O JPMorgan também segue com recomendação underweight (equivalente à venda) para Gol. “O anúncio não é uma surpresa após o fluxo de notícias recentes que indicavam que a empresa estava considerando entrar com o pedido ou avaliar outras alternativas de financiamento. A situação financeira da Gol era frágil, uma vez que a empresa ainda aguardava um acordo mais amplo referente aos seus contratos de arrendamento”, avaliam os analistas.

O banco acredita que o Chapter 11 deve ter também um impacto ligeiramente positivo para as rivais Azul e Latam Airlines, provavelmente implicando algum ganho de participação de mercado para seus concorrentes.

Informações Financenews, Infomoney, Broadcast
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