Imagine receber uma mensagem avisando que você está de parabéns pois reduziu o uso do cheque especial ou do rotativo do cartão neste mês. Ou uma sugestão de plano de telefonia mais barato do que o que você usa e que consome boa parte de sua renda. Ou a oferta de uma linha de crédito mais em conta que aquela na qual você está pendurado. Ou ainda saber que neste mês sobrou um dinheirinho para jantar fora com a família. Essa “dicas” são algumas das funcionalidades que o Guiabolso, site que oferece serviço de controle de orçamento pessoal, passa a oferecer para seus usuários, utilizando sistemas de inteligência artificial.
Segundo Thiago Alvarez, presidente do Guiabolso, a ideia é fazer com o que o sistema passe a ser ativo, buscando traçar o perfil de casa usuário e provoca-lo com mensagens para levar conteúdos e informações de educação financeira ou alternativas que o ajudem a melhorar seu perfil financeiro. “O modelo que desenvolvemos aqui não existe em nenhum lugar do mundo”, afirma Alvarez.
Netflix do orçamento
O sistema funciona a partir da análise das informações de cada usuário e de suas escolhas, expressas em seus gastos e nas movimentações de conta corrente e de cartão de crédito fornecidas pelos bancos e administradoras ao Guiabolso, explica Alvarez.
O sistema é semelhante ao de serviços como Spotify, de música, ou Netflix, de filmes, que hoje já identificam as preferências e oferecem um cardápio de sugestões a partir das escolhas feitas pelo usuário nos sistemas. “O algoritmo aprende o que a pessoa gosta, como ela lida com dinheiro, quais suas principais despesas e investimentos e a partir disso faz sugestões para tentar ajudar”, afirma. O objetivo é evitar modelos prontos, muito usados nas grandes instituições, mas criar soluções próprias para cada perfil de cliente.
Sistema aprende com reações
O sistema tem a capacidade de aprender. Assim, fazer sugestões e guardar as diferentes reações de cada usuário para definir seu perfil e fazer novas sugestões. De acordo com as reações ao que foi sugerido, o algoritmo monta o perfil e seleciona novas alternativas para cada usuário. Ao mesmo tempo, quem entrar no sistema poderá ter seu perfil definido pelos fatores identificados em outros usuários com gostos semelhantes.
Ajuda aos que odeiam falar de dinheiro
Segundo Alvarez, a inteligência artificial ajudará especialmente aqueles que não gostam de pensar em dinheiro. Hoje, 8 em cada 10 dos 4 milhões de usuários do Guiabolso não conseguem guardar dinheiro. Isso quer dizer que eles não têm reservas e, se houver um imprevisto financeiro, acabarão inadimplentes ou usando linhas de crédito de emergência mais caras.
Em muitos casos, as pessoas se desgastam tanto com as dificuldades em lidar com o próprio orçamento que acabam criando um bloqueio para falar de dinheiro. “Enquanto alguns se dão muito bem com planilhas, outros têm medo até de pensar no assunto orçamento pois isso incomoda, seu relacionamento com o dinheiro é muito ruim e acabam fugindo do assunto, não querem saber quanto ganham ou quanto gastam e o resultado é a perda do controle”, explica.
A estratégia do Guiabolso agora é tentar atrair essa pessoa para a educação financeira, por meio das dicas que se tornam uma espécie de guia digital e personalizado, adaptado para cada perfil de usuário. Ele dá o exemplo de uma pessoa que está com problemas de dívidas. “O sistema não vai ficar lembrando isso toda hora, pois a pessoa sabe que a situação é ruim, mas podemos mostrar que ela conseguiu reduzir a dívida este mês ou está melhorando seu orçamento”, afirma Alvarez. “Isso dá motivação para a pessoa continuar o esforço.”
Nota de crédito dá incentivo para melhorar
Outra ferramenta são as notas de crédito atribuídas aos usuários pelo Guiabolso, que vão de A a F. À medida que o usuário for melhorando a gestão de seu orçamento, a nota de crédito subirá, o que também serve de estímulo para a pessoa continuar aprendendo e se esforçando.
As notas servem também para melhorar as condições de crédito dos usuários junto às financeiras que têm parceria com o Guiabolso. “Não digo que somos sempre a opção mais barata, mas podemos pelo menos ser uma alternativa para comparar com a taxa do banco onde a pessoa tem conta”, afirma Alvarez. Segundo ele, em 90% dos casos, as taxas oferecidas pelos parceiros do Guiabolso foram melhores que as dos bancos dos usuários.
Ele explica também que somente as empresas ligadas ao Guiabolso e autorizadas pelo usuário tem acesso aos dados pessoais. “E temos o controle de todos que acessam os dados de cada usuário”, afirma. A vantagem da análise do Guiabolso é que ela inclui não só eventuais dívidas que a pessoa tenha, mas todo seu orçamento, o que permite conferir sua real capacidade de pagamento.
Solução tem de se ajustar ao perfil do usuário
Uma das ideias do novo sistema é que ele seja capaz de identificar os problemas principais no orçamento de cada pessoa e assim possa fazer sugestões para solucioná-los de acordo com o perfil do usuário. “Não é só apontar o problema e dar a solução mais óbvia, não vamos mandar a pessoa parar de tomar o café que tanto gosta para economizar e ficar infeliz”, explica Alvarez. “Para algumas pessoas, o cafe ou a balada ou a viagem são gastos tão necessários quanto outros, então vamos buscar outras formas de ajustar o orçamento”, diz.
Capacidade de ver e comparar despesas
A capacidade de identificar os dados das pessoas e processá-los é a grande vantagem do sistema do Guiabolso. Ele é capaz, por exemplo, de identificar o tipo de plano de telefonia que a pessoa usa e compará-lo com os de outras operadoras para saber se não há uma opção mais barata. Se houver, o sistema poderá sugerir ao usuário a troca. Ou, a partir dos gastos com seguro ou com manutenção do carro, mostrar que pode ser melhor usar o táxi e vender o automóvel. Ou ainda identificar gastos que podem ser trocados, como pessoas que usam demais o táxi e poderiam economizar usando o Uber, mais barato.
Investimentos e baixa renda
O Guiabolso pretende oferecer também opções para os investimentos dos usuários, analisando o perfil e as opções que a pessoa possui. Há também um serviço destinado a pessoas sem conta em banco, de baixa renda, que usam mais dinheiro vivo. “Tornamos o nosso aplicativo mais fácil de usar por meio de celulares e criamos uma conta-carteira para esse público, de menor renda”, afirma Alvarez.
O executivo diz que o serviço se dispõe a ser o mais transparente possível, deixando claro que é remunerado pelos parceiros de crédito ou investimento. “Nosso objetivo é oferecer uma alternativa para o cliente, pois até hoje ele só tinha a opção do banco”, explica Alvarez.
“Pode ser que a linha de crédito ou o serviço do banco seja mais em conta, mas pelo menos o cliente pode ver uma alternativa”, diz. “Hoje também o que temos são pessoas vendendo produtos financeiros para clientes, e há muitos incentivos ruins, conflitos de interesse nesse sistema”, afirma Alvarez. “Por isso, nós criamos algoritmos que vão avaliar melhor o usuário antes de oferecer.”