A queda dos juros para um dígito de maneira sustentável era um movimento esperado há muito tempo, demorou mais do que se imaginaria, mas está mais perto do que nunca, devendo trazer mudanças importantes para o investidor, afirma Fabricio Tota, responsável pelo home broker da Corretora Socopa. Ele lembra que há muito se fala que um dia essa redução dos juros aconteceria. Ela chegou a ocorrer no governo Dilma Rousseff, com a Selic recuando para 7,25% ao ano, mas não se sustentou pela falta de fundamentos da economia. “A situação se deteriorou bastante e as taxas tiveram de subir de novo”, lembra.
Agora finalmente a queda das taxas está ocorrendo em uma velocidade maior que a prevista, diz o executivo, citando o relatório Focus, que traz as projeções do mercado. Em um ano, as estimativas para os juros despencaram de 14% para uma taxa básica Selic de 8,5% já no fim deste ano.
Moleza vai acabar
Nesse novo ambiente, o comportamento do investidor deverá ser de procurar alternativas com risco um pouco maior para poder ter retorno mais interessante, acredita Tota. “Com a taxa a 14% ao ano, o investidor não precisava se preocupar, era muito cômodo ficar estacionado nos juros em qualquer prazo ou aplicação”, diz.
Agora, com menos de 10% ao ano, o natural é procurar por papéis privados, saindo um pouco dos títulos públicos. Mas o investidor terá de avaliar melhor as condições das aplicações. “Rentabilidade, liquidez e nível de risco, tudo tem de ser levado em conta na hora de aplicar, pois um fator mexe com os outros”, explica.
Hora de repensar investimentos
Esta pode ser também uma oportunidade para o investidor repensar os investimentos, avalia o executivo. Não só pela flutuação de taxas em si, mas pela mudança estrutural que a queda dos juros trará sobre a economia como um todo. Talvez seja o momento de alongar um pouco as aplicações ou até ir para a renda variável, desde que se tenha apetite para o risco.
LCI e LCA, oferta menor
E há um leque interessante de opções para o investidor, afirma o executivo. Há as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e imobiliárias (LCI), que são atrativas pela isenção de imposto de renda para pessoas físicas, mas têm oferta restrita pela falta de operações de crédito agrícola e imobiliário para lastreá-las. “Enquanto o crédito não retornar, a oferta dos incentivados de emissão bancária, LCA e LCI vai continuar bastante restrita em relação a 2 ou 3 anos”, avalia Tota.
Ele diz que há uma retomada gradual, com mais lastro de crédito aparecendo um pouco mais, “mas não é coisa que vai ter todo dia muitos papéis e com taxas muito altas”, alerta. Por isso, o investidor que não quer pagar imposto tem de fazer as contas para ver quando vale a pena comprar um papel com uma taxa muito baixa ou optar por um CDB de um banco menor, por exemplo, que pague mais que o CDI e que, após o imposto seja mais vantajoso e conte com a garantia do Fundo Garantidor de Crédito até R$ 250 mil.
Mais papéis incentivados de empresas
Ao mesmo tempo, começa a haver procura por outros papéis incentivados cuja oferta está crescendo, caso dos Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) . “Vemos muitas ofertas de empresas de CRA indo a mercado neste ano e a lista de operações em preparação está grande para este semestre”, afirma Tota. O papel tem o entrave de não contar com a proteção do FGC, como ocorre com as LCI e LCA emitidas pelos bancos.
Em compensação, os CRA que estão sendo emitidos hoje são de devedores de boa qualidade, o que reduz um pouco o receio do investidor. “São empresas de grande porte e saudáveis e que obtêm recursos baratos, na faixa dos 95%, 96% do CDI, menos do que pegariam num banco, e mesmo assim são boas taxas para o investidor, pois são líquidas de imposto”, observa Tota.
Só para qualificados
Um dos limitadores do crescimento desses papéis é o fato de eles só poderem ser comprados por investidores qualificados, com mais de R$ 1 milhão para investir, o que deixa de fora o varejo, apesar de as ofertas permitirem aplicações a partir de R$ 1 mil. A expectativa é que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regulamente os CRA de varejo, mas isso só deve ocorrer no fim deste ano.
Debênture de infraestrutura
Outro papel incentivado que também está ganhando espaço com a queda dos juros é a debênture de infraestrutura, que também conta com isenção de imposto de renda sobre o rendimento para pessoas físicas. Como os CRA, as debêntures também não contam com garantias do FGC ou do governo, mas apenas do seu emissor. A vantagem é que elas podem ser compradas por investidores de varejo também. As ofertas desse tipo de papel também cresceram este ano, com empresas conhecidas, especialmente do setor elétrico, captando recursos no mercado.
Prazos mais longos
O investidor nesses papéis deve estar atendo também com relação à liquidez já que, para sair da aplicação antes do vencimento, é preciso vender o título a outro investidor. “Não é tão simples e o investidor fica sujeito ao preço do papel no mercado naquele momento”, diz Tota, lembrando que isso também ocorria com as LCI e LCA, que eram vendidas sem liquidez.
Por isso, o ideal é que a aplicação seja feita com recursos de longo prazo, 5, 10 anos, para evitar a necessidade de resgate antecipado. “Essa é outra mudança dos novos tempos, o investidor precisa abrir mão da liquidez imediata para ter mais rentabilidade”, afirma o executivo. “E é bom diversificar, comprando vários papéis de diferentes empresas, como forma de diluir o risco de crédito”, alerta.
Juros caindo mais, mas com solavancos
Tota diz que as pessoas já estão se movimentando, buscando alternativas, prevendo a queda mais forte dos juros. “Vamos ver nas próximas reuniões se o BC acelera a queda dos juros, o que deve ser bem possível, pois a inflação está caindo rápido”, explica. “Vamos ver também se essa queda se sustenta ou teremos outros solavancos”, diz referindo-se ao cenário político com a Operação Lava Jato e a aprovação das reformas, em especial a da Previdência.
Tesouro Direto ainda atrai investidor
Se a procura por papéis privados tende a aumentar, os títulos públicos devem continuar atraindo investidores para o Tesouro Direto, afirma Tota. “A base de investidores do Tesouro Direto ainda é tímida e tende a crescer”, avalia. “Não sabe se taxa menor vai desestimular a aplicação em títulos federais, mas esse mercado ainda tem muito espaço para crescer”, afirma. Segundo Tota, apesar de o Tesouro Direto ter mais de 1 milhão de cadastrados, os que têm investimentos são bem menos, cerca de 400 mil.
Tesouro concorre com fundos caros
Um dos fatores que pode ajudar o Tesouro Direto é o fato de os fundos de renda fixa ficarem mais pressionados com a queda dos juros pela concorrência dos papéis isentos e da própria caderneta de poupança. “E os absurdos, como fundos renda fixa DI que cobram 3%, 4%, 5% ao ano de taxa de administração devem sumir”, afirma.
Segundo ele, esses fundos com taxas de 4% ao ano são uma loucura, mas passam despercebidos quando os juros estão altos, na casa dos 14%. Agora não mais. “Alguém vai ter de fazer alguma coisa, ou realinha a taxa de administração para baixo e busca maior retorno ou perde clientes”, acredita.
Liquidez também com Tesouro Selic
Ele dá o exemplo do Tesouro Direto. “Não vejo vantagem em um fundo de renda fixa que dá liquidez no mesmo dia, mas cobra 5% ao ano, em relação a uma aplicação em Tesouro Selic, ou LFT, que rende o mesmo, dá resgate em um dia, ou D+1, e cobra menos de 1% ao ano”, afirma Tota. Segundo ele, um planejamento financeiro que permita sacar um dia antes o dinheiro não é tão complicado assim.
Além disso, a maior parte dos recursos não é para o dia a dia e deve ficar em aplicações mais longas e mais rentáveis. “Não há motivo para o dinheiro de investimento ficar aplicado em um fundo com D+0 rendendo menos”, observa.
Tota lembra que mesmo pagando 0,10% ao ano na corretora e mais o 0,30% da custódia da bolsa B3, a aplicação no Tesouro Direto ganha de um fundo DI com taxa de 0,5% ao ano. “Tem justificativa para mudar de um fundo DI para o Tesouro LFT”, diz o executivo.
A volta dos fundos imobiliários
Há também a possibilidade de o investidor buscar outras opções que ficaram de lado nos últimos anos, como os fundos imobiliários, afirma Tota. Ele se lembra que já houve uma correção recente nos valores das cotas desses fundos, o que fez alguns gestores lançarem carteiras ou fazerem novas captações de fundos antigos. “Isso tende a se intensificar até o fim do ano”, avalia o executivo.
Ele lembra que, na queda passada dos juros para 7,25% ao ano, o grande destaque do mercado foram os fundos imobiliários, procurados por pessoas que não queriam correr o risco das ações. “É produto incentivado e em que houve crescimento grande do mercado na época”, afirma.
Ele espera que esse crescimento se repita agora, mas não na mesma magnitude. “O mercado está mais maduro, havia produtos que não eram tão bons e deram alguns sustos”, observa Tota. Ele aconselha que todo fundo imobiliário seja olhado bem de perto. “Não é renda fixa, é variável, depende do que tem dentro dele, dos imóveis e do mercado imobiliário”, destaca.
Fundos de Crédito
Já os fundos de crédito, que compram papéis de empresas privadas, também devem crescer com a maior procura por mais rentabilidade e risco. Isso valerá também para fundos multimercados.
A vantagem dos fundos de crédito privado é a diversificação de riscos para o investidor, afirma Natasha Reis, analista de crédito da Rio Bravo Investimentos. A gestora lançou uma carteira que tem 30 papéis de empresas diferentes, o que reduz o risco de perdas em caso de alguma inadimplência.
Liquidez maior
A liquidez também é uma vantagem em relação à compra direta de um papel de empresa, destaca a analista. No caso do fundo, o investidor pede o resgate e o gestor busca vender a parcela da carteira que está em papéis públicos ou o papel privado que tiver maior liquidez e melhor preço. Já se tivesse comprado o papel diretamente, o investidor teria se submeter às condições do mercado para aquele título e com menor poder de negociação. Natasha lembra que é importante também pesquisar a taxa de administração do fundo de crédito, que pode corroer o ganho do investidor.
Menor aplicação inicial
A carteira da Rio Bravo busca 103% a 105% do CDI e mantém uma parcela dos recursos em títulos públicos para garantir liquidez para os saques e para aproveitar oportunidades, explica Natasha. Outros 30% estão aplicados em debêntures de empresas que pagam juros acima dos títulos públicos. “Temos um ganho maior e risco diversificado por um valor de aplicação mais baixo”, diz a analista, lembrando que, para participar de cada emissão de debêntures, o investidor teria de investir R$ 10 mil enquanto no fundo ele participa de todas com um valor menor, de R$ 5 mil no caso da Rio Bravo.
O investidor consegue escolher na ampla oferta do mercado aquele fundo de crédito que se ajusta ao perfil de risco dele. Mas é preciso ter alguns cuidados, como ver o rating, a estratégia de alocação do fundo, ou seja, onde está aplicado o dinheiro. “Na CVM há informações de cada fundo com os papéis em que ele aplica”, lembra Natasha.
Um problema desses fundos é a marcação a mercado, já que nem todos os papéis têm grande liquidez no mercado secundário todos os dias. Mas a maior parte das emissões de debêntures é avaliada pela própria Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima).
Menor risco de calotes
Para Natasha, o cenário de inadimplência tende a diminuir com a melhora da economia, que tem impacto positivo para as empresas, reduzindo o risco de calotes nos fundos de crédito. A queda dos juros também ajuda a reduzir as despesas financeira das companhias. “As empresas ficam com menos dificuldades para se financiar e reduzem o custo de capital de giro”, lembra. “E juro mais baixo traz de volta o investimento, o consumo, e isso se reflete nos resultados”.
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