A dose dupla de comunicados dovish foi o grande destaque desta quarta-feira. As decisões de política monetária do FED (Federal Reserve – Banco Central dos Estados Unidos) e do Banco Central do Brasil, anunciadas na tarde de hoje, são drivers fundamentais para o cenário macroeconômico de curto e médio prazo.
No Brasil, o Banco Central confirmou as expectativas do mercado ao cortar novamente a taxa Selic em 1 p.p., para 9,25% ao ano. Importante ressaltar que na última reunião realizada no mês de maio, a autoridade monetária brasileira havia sinalizado que o ritmo de cortes seria reduzido no encontro de dois dias encerrado nesta quarta-feira.
Entretanto, ao notar que o Brasil conseguiu se manter dentro da onda de apetite ao risco observada nas principais praças financeiras mundiais, mesmo após o estouro da crise política local, a expectativa de redução do ritmo de cortes foi logo sendo deixada de lado em entrevistas e discursos dos integrantes do Comitê ao longo deste mês.
Além do clima positivo no mercado, o Banco Central destacou que “os efeitos de curto prazo do aumento da incerteza quanto ao ritmo de implementação de reformas e ajustes na economia não se mostram inflacionários nem desinflacionários”, o que, muito possivelmente, contribuiu para abrir a janela de corte de 1 p.p. na reunião deste mês.
A desinflação difundida e o cenário base de lenta recuperação econômica também proporcionam condições para manutenção de uma política monetária ainda muito dovish. Em paralelo, o Banco Central conta com o apoio positivo das expectativas do mercado para a inflação de 2017 e 2018, ambas abaixo da meta a ser perseguida.
Diferentemente do comunicado apresentado no mês de maio, o Banco Central optou por não criar expectativa quanto ao ritmo de corte para a próxima reunião. Mesmo com a taxa Selic em 9,25% ao ano, a autoridade monetária não parece estar enxergando proximidade com o fim do atual ciclo de afrouxamento e quer deixar todas as opções abertas para a próxima reunião, inclusive para cortar novamente em 1 p.p.
O Banco Central se limitou apenas em afirmar que “o ritmo de flexibilização continuará dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos, de possíveis reavaliações da estimativa da extensão do ciclo e das projeções e expectativas de inflação”.
O fato de o comunicado apresentar a ideia de reavaliação da extensão do ciclo de flexibilização mostra uma pré-disposição para que a taxa Selic possa cair abaixo do patamar de 8% ao ano e/ou retornar à mínima histórica registrada aos 7,25% ao ano em 2018.
O viés dovish apareceu também no comunicado do FED, divulgado na tarde desta quarta-feira após encerramento da reunião de dois dias do Comitê de Política Monetária. O Banco Central dos Estados Unidos afirmou esperar começar a implementar seu programa de normalização do balanço patrimonial relativamente em breve.
A expressão relativamente em breve não transmite a sensação de que a desalavancagem está para começar no curtíssimo prazo (ou seja, já na próxima reunião de Comitê a ser realizada em setembro). Se a normalização do balanço estivesse pronta no gatilho, o FED teria optado por utilizar a expressão em breve (ao invés de relativamente em breve) para, assim, sinalizar ao mercado início da estratégia no mês de setembro.
A sinalização de maior cautela por parte do FED adiciona viés dovish até então inexistente para a normalização do balanço patrimonial de quase 4,5 trilhões de dólares. Respalda esse tom moderado o fato de a inflação estar desacelerando neste ano, causando incerteza em alguns membros do Comitê. O núcleo de inflação recuou de 1,8% em fevereiro para 1,4% em maio, distanciando-se da meta de 2% a ser perseguida.
A inflação mais branda não estava nos planos da autoridade monetária e pode postergar o início da fase da desalavancagem ou mesmo reduzir o volume estimado das operações, o que certamente agradaria o mercado. Nesta quarta-feira, o rendimento da Treasury de 10 anos recuou de 2,33% para 2,29%, ainda com boa distância sobre a máxima do ano registrada em 2,62%.
O quadro cambial também requer um viés mais dovish por parte do FED. O dólar contra cesta de moedas globais segue apanhando feio como há muito tempo não se via no mercado. Influenciados pelos vexames da administração Trump, e por um começo de ano hawkish na política monetária, investidores estão vendendo dólar e buscando títulos e moedas em outras praças financeiras.
O tombo do dólar chegou ao ponto crítico, na principal linha de suporte de uma congestão de pouco mais de dois anos, juntamente com a média móvel simples de 200 períodos semanal. Essa é a principal base de sustentação da moeda norte-americana e um rompimento descendente seria dramático, pois aumentaria o potencial vendedor e reafirmaria nascimento de um ciclo bearish.
Sendo assim, o FED pode estar adotando um tom mais dovish agora para, também, defender o dólar em zona de ponto crítico para o mercado. O perigo, no entanto, continua restrito apenas ao mercado cambial. No mercado de ações, os principais índices de Wall Street seguem fortemente bullish, renovando máximas históricas.
No Brasil, o Ibovespa (BOV:IBOV) criou zona de resistência na região dos 66,5k, mantendo o mercado pressionado na venda no curtíssimo prazo, mas ainda sem apresentar perigo à perna de alta iniciada na região dos 60k.