A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, gravou ontem um pronunciamento tentando acalmar os ânimos e deter a escalada de violência entre grupos políticos contra e a favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nele, a ministra afirma que o país vive “tempos de intolerância e de intransigência contra pessoas e instituições”. O pronunciamento foi exibido na TV Justiça.
A manifestação da ministra ocorre a dois dias do julgamento no qual a Corte retomará a discussão sobre o pedido de habeas corpus protocolado pelo ex-presidente Lula para evitar a execução provisória da pena de 12 anos e um mês de prisão na ação penal do triplex do Guarujá (SP), um dos processos da Operação Lava Jato.
O processo está pautado para a sessão da próxima quarta-feira, dia 4. A expectativa é que uma multidão acompanhe a votação em Brasília e há o risco de confronto entre grupos a favor e contra o presidente. Em outras capitais, também são esperadas manifestações. A presidente do Supremo também teme novos enfrentamentos e discussões entre os próprios ministros, que estão divididos sobre a questão da prisão de condenados em segunda instância.
Implicações políticas
A votação do habeas corpus tem grande importância política, já que Lula segue como favorito nas pesquisas para a eleição presidencial deste ano. Condenado em segunda instância por órgão colegiado, ele já é considerado ficha suja, mas há uma grande discussão sobre se ele pode ou não registrar sua candidatura e concorrer. Há o risco, inclusive, de ele ser eleito e depois cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), provocando um grande desgaste para as instituições. Caso Lula seja preso, porém, a dificuldade para uma candidatura será maior.
Segunda instância, a favor e contra
Representantes do Judiciário entregaram ao Supremo um documento pedindo a manutenção da prisão em segunda instância, com 5 mil assinaturas de juízes e promotores, incluindo a cúpula do Operação Lava Jato. Já outro grupo, de advogados, entregou pedido com 3,6 mil assinaturas pedindo o fim da prisão, que passaria a vale apenas depois de julgados todos os recursos em todas as instâncias.
No pronunciamento, Cármen Lúcia pede serenidade ao povo brasileiro e diz que, fora da democracia, “não há respeito ao direito, nem esperança de justiça e ética”.
“Problemas resolvem-se com racionalidade, competência, equilíbrio e respeito aos direitos. Superam-se dificuldades fortalecendo-se os valores morais, sociais e jurídicos. Problemas resolvem-se garantindo-se a observância da Constituição, papel fundamental e conferido ao Poder Judiciário, que o vem cumprindo com rigor”, disse a presidente do STF.
Íntegra do pronunciamento
“A democracia brasileira é fruto da luta de muitos. E fora da democracia não há respeito ao direito, nem esperança de justiça e ética. Vivemos tempos de intolerância e de intransigência contra pessoas e instituições.
Por isso mesmo, este é um tempo em que se há de pedir serenidade. Serenidade para que as diferenças ideológicas não sejam fonte de desordem social. Serenidade para se romper com o quadro de violência. Violência não é justiça. Violência é vingança e incivilidade. Serenidade há de se pedir para que as pessoas possam expor suas ideias e posições, de forma legítima e pacífica.
Somos um povo, formamos uma nação. O fortalecimento da democracia brasileira depende da coesão cívica para a convivência tranquila de todos. Há que serem respeitadas opiniões diferentes.
Problemas resolvem-se com racionalidade, competência, equilíbrio e respeito aos direitos. Superam-se dificuldades fortalecendo-se os valores morais, sociais e jurídicos. Problemas resolvem-se garantindo-se a observância da Constituição, papel fundamental e conferido ao Poder Judiciário, que o vem cumprindo com rigor.
Gerações de brasileiros ajudaram a construir uma sociedade, que se pretende livre, justa e solidária. Nela não podem persistir agravos e insultos contra pessoas e instituições pela só circunstância de se terem ideias e práticas próprias. Diferenças ideológicas não podem ser inimizades sociais. A liberdade democrática há de ser exercida sempre com respeito ao outro.
A efetividade dos direitos conquistados pelos cidadãos brasileiros exige garantia de liberdade para exposição de ideias e posições plurais, algumas mesmo contrárias. Repito: há que se respeitar opiniões diferentes. O sentimento de brasilidade deve sobrepor-se a ressentimentos ou interesses que não sejam aqueles do bem comum a todos os brasileiros. A República brasileira é construção dos seus cidadãos.
A pátria merece respeito. O Brasil é cada cidadão a ser honrado em seus direitos, garantindo-se a integridade das instituições, responsável por assegurá-los.”
Com informações da Agência Brasil.