Aprovada na Câmara dos Deputados na última quinta-feira, dia 28 de maio, a Medida Provisória (MP) 936 completa dois meses nesta segunda-feira (dia 1º), com o propósito de conter o aumento desenfreado do desemprego em meio à pandemia do novo coronavírus.
Desde 1º de abril — data da edição da MP pelo governo federal —, a estimativa é que 8,1 milhões de trabalhadores, vinculados a mais de 1,2 milhão de empresas, tenham tido seus contratos de trabalho suspensos ou as jornadas e os salários reduzidos.
Para economistas, o aumento do desemprego no Brasil é inevitável e atingirá seu pico em junho, mas medidas como essa ajudam a mitigar os efeitos da crise e evitar que haja uma queda ainda maior do número de empregos formais.
Em abril, primeiro mês de vigência da medida, o governo deixou de arrecadar R$ 3,3 bilhões de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o que representa uma perda de 32% em relação a abril de 2019. Já a receita previdenciária, ou seja, o recolhimento de contribuições ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), caiu 31,49% no mês, deixando de arrecadar R$ 10,7 milhões.
Essas perdas ocorrem porque, enquanto os contratos estiverem suspensos, não há recolhimento de FGTS nem de INSS por parte do empregador. Além disso, nos casos em que houver redução salarial, o Fundo de Garantia e as contribuições previdenciárias serão proporcionais ao salário que o funcionário receber da empresa neste período.
O relatório da Receita Federal que analisou as arrecadações em abril ressaltou ainda que esse desempenho da receita previdenciária é explicado pelo adiamento do prazo para pagamento da contribuição patronal ao INSS — mesmo para as empresas que não alteraram contratos.
Uma portaria publicada no dia 3 de abril permite que os recolhimentos de março e abril sejam pagos em julho e setembro, respectivamente.
A diminuição na arrecadação do governo, neste momento, é mais vantajosa do que o aumento do desemprego, explicou Mário Avelino, presidente do Instituto Doméstica Legal.
— O objetivo da MP é evitar demissões, que causariam um efeito dominó na economia muito mais grave do que essa perda de receita momentânea. Em abril e maio deste ano, tivemos menos demissões de empregadas domésticas do que nos mesmos meses do ano passado, por exemplo. Isso reforça o quanto a MP é positiva.
A Medida Provisória 936 é um instrumento com força de lei. Por isso, já está em vigor, mas ainda precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional para que se torne definitiva.
O texto, que segue agora para o Senado, permite redução de jornada e salário de trabalhadores em 25%, 50% ou 70%, durante três meses, ou a suspensão do contrato por até dois meses.
Durante esse período, os trabalhadores receberão um pagamento do governo, chamado de Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm). Até o momento, cerca de cinco milhões de trabalhadores no país já receberam esse complemento salarial.
Indústria do Rio é a favor da prorrogação
A Câmara dos Deputados autorizou que o governo federal prorrogue, por decreto, o período de vigência da redução de jornadas e salários e da suspensão dos contratos.
Para Luis Augusto Azevedo, gerente-geral de Competitividade da Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan), o ideal é que os prazos fossem prorrogados por, pelo menos, mais três meses.
— É importante que esses prazos sejam prorrogados, porque a pandemia está aí. Mesmo em lugares onde seja possível retomar a atividade, o retorno será progressivo. A gente não pode imaginar que depois de estar com a atividade paralisada a indústria volte de uma hora para a outra com 100% de sua capacidade. Talvez com mais 90 dias seja possível — explicou.
Segundo Azevedo, 30% das indústrias fluminenses estão paradas desde o início da pandemia, e 48% estão com a capacidade produtiva reduzida. A Firjan não tem dados sobre a adesão do setor à MP 936.
No comércio fluminense, entre os empresários que têm funcionários, 40,4% reduziram as jornadas de trabalho e os salários, e 32,4% suspenderam temporariamente os contratos, de acordo com dados da Federação do Comércio do Rio (Fecomércio-RJ).
Desemprego atingirá o pico em junho
Para Bruno Ottoni, pesquisador da FGV Ibre e do IDados, a estimativa é que haja um aumento da taxa de desemprego este ano, passando dos 15%. Mesmo no ano que vem, embora haja uma expectativa de melhora, o índice não deverá ficar abaixo dos 10%.
— O que vai acontecer no mercado de trabalho vai depender muito da recuperação da economia. Nossas estimativas, baseadas nas projeções de crescimento econômico do Boletim Focus (do Banco Central), é que o pico do desemprego no Brasil ocorra em junho, com 15,2% da população desocupada (hoje está em 12,6%). Em setembro, esse percentual cairia para 14,8% e, em dezembro, se manteria em queda, com 13,3%, mas ainda num patamar acima do atual — explicou.
Segundo ele, a forma como forem conduzidas as políticas de saúde pública e de retomada das atividades econômicas no Brasil durante a pandemia vão nortear os índices de desemprego.
Estabilidade no emprego
A MP 936 garante estabilidade pelo dobro do período em que teve o salário reduzido. Ou seja, caso a redução seja de três meses, a estabilidade será de seis meses. Mas, para Ottoni, não há garantias de que as empresas vão manter os empregos após esse período.
— O risco sempre existe. Ninguém está protegido. Num cenário mais otimista, passado o segundo trimestre do ano, se começar a haver a abertura do comércio, e os números do vírus melhorem, havendo recuperação da atividade econômica, a chance de os empregos serem mantidos é maior. Mas, num cenário mais pessimista, com aceleração da propagação da doença e mais isolamento, e com a crise sendo postergada até o quarto trimestre, é possível que haja mais demissões — avaliou Ottoni.
Adesão baixa nos empregos domésticos
A baixa adesão dos empregadores domésticos às possibilidades criadas pela MP 936 surpreendeu o presidente do Instituto Doméstica Legal, Mário Avelino.
Em abril, apenas 9,53% dos contratos cadastrados na plataforma haviam sido incluídos na suspensão ou na redução de jornada. Em maio, o percentual subiu para 18,83%, mas ficou abaixo do que Avelino havia previsto.
— Diferentemente de uma empresa que é muito pragmática, empregadores pessoas físicas têm a preocupação de não gerar um prejuízo para a relação com a empregada. Então, muitos deles, por desconhecimento, preferiram dar férias ou até continuar pagando o salário para que a funcionária fique em casa sem trabalhar. Mas não há necessidade de fazer isso, pois o governo vai pagar por esse período em que o contrato estiver suspenso. A MP está em pleno vigor. Quem ainda não aderiu pode fazer agora a suspensão por 60 dias, por exemplo, sem que haja qualquer prejuízo para ambas as partes — esclareceu.
Avelino explicou ainda que a adesão à MP 936 pode ser feita pelo site servicos.mte.gov.br, e ressaltou que é preciso também informar a suspensão do contrato ou a redução da jornada no eSocial. Não é necessário fazer nenhuma anotação na carteira de trabalho.