O país mudou de rota, deixando o caminho da insolvência após a troca de governo e de equipe econômica. Mas ainda é cedo para dizer que este é mesmo o momento da virada da economia, alerta Rodrigo Azevedo, ex-diretor do Banco Central (BC) e sócio da gestora Ibiuna Investimentos. Ele acredita, porém, que é possível dar ao novo governo o benefício da dúvida, o que torna a aplicação em bolsa interessante, assim como em títulos do governo. Já o dólar tende a permanecer estável. O grande risco para esse cenário, porém, é a falta de apoio da sociedade e do Congresso para as reformas que o novo governo terá de fazer para deter o crescimento da dívida pública. “Será preciso um grande trabalho de comunicação e convencimento de que os sacrifícios são essenciais para resgatar o país”, alerta.
Ele participou do 37º Congresso Brasileiro dos Fundos de Pensão, promovido pela Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), em Florianópolis.
Para Azevedo, a forte recessão e queda nos preços dos ativos brasileiros foi resultado da política econômica do governo Dilma Rousseff a partir de 2010, com a chamada Nova Matriz Econômica, que colocou a dívida pública em trajetória de insolvência. Com isso, o juro real das Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), que havia caído para 4,5% ao ano, disparou e chegou a 8% ao ano. Com a entrada de uma nova equipe econômica, esse juro caiu para 5,5% a 6% ao ano mais inflação. “Os investidores estão seguros comprando NTN-B para 2050, e ninguém paga juros tão altos quanto os do Brasil, mas tem o risco do principal”, diz, referindo-se à possibilidade de o governo dar um calote na dívida. “Por isso é importante saber se este é o momento da virada, de saber que o governo vai fazer algo para deter o crescimento da dívida”, afirma. Não se sabe, porém, com segurança, que o governo vai realmente conseguir levar adiante as medidas de ajustes. “Há muita informação contraditória, e a decisão do investidor é se ele deve dar o benefício da dúvida ao governo ou não”, avalia Azevedo. “Eu acho que vale a pena dar o beneficio da dúvida.”
Segundo o gestor, o cenário internacional, de lento crescimento global depois da crise de 2008 e inflação baixa e sem perspectiva de subir devem manter o juro baixo e a liquidez internacional alta por um longo período. E, se o ambiente externo for favorável, o país tem tempo para levantar as reformas. “Se não, fica difícil”, afirma, lembrando que Dilma, além dos erros econômicos, pegou um cenário externo desfavorável, que melhorou depois que ela saiu.
“Estamos numa fase de mercado tranquilo, com o mundo crescendo menos que no passado e baixa aversão a risco”, diz. E as projeções de inflação são ainda baixas, apontando para 1,5% nos próximos cinco anos nos EUA. “Por isso os juros estão tão baixos nos países desenvolvidos”, afirma Azevedo. Não deve haver, portanto, alta muito dramática dos juros americanos, apesar das turbulências recentes dos mercados por conta de declarações de dirigentes do Federal Reserve (Fed, banco central americano), falando em subida das taxas. “Vimos nos últimos dias uma reacomodação dos mercados para níveis mais razoáveis”, avalia Azevedo. “Mas a questão básica é que um terço dos bônus soberanos são negociados a juros reais negativos, e isso permite que os bancos centrais mantenham políticas acomodatícias por mais tempo, levando os investidores a aumentarem a busca por retornos e o Brasil pode receber boa parte desses recursos”, explica o gestor. “E isso depende da política do (Michel) Temer, se ele vai entregar ou não.”
A pergunta, segundo Azevedo, é se Temer vai conseguir reverter a trajetória da dívida pública. Com a política econômica anterior, a dívida caminhava para atingir 90% do Produto Interno Bruto (PIB) do país em 2108, um nível de alto risco. As reformas prometidas pelo governo devem reverter esse crescimento, mas como o estrago nas contas públicas é muito grande, o ajuste vai ter de ser mais longo. Nas contas de Azevedo, o ajuste pode ir até 2020 e a dívida só se estabilizaria em 85% a 90% do PIB em 2022, passando a cair apenas depois disso. “Ou seja, a dívida só vai começar a cair no governo do presidente que for eleito depois de quem ganhar a eleição de 2018″, estima Azevedo. Portanto, não dá para definir agora se o país vai seguir o caminho certo, mas apenas fazer uma aposta. “Avaliamos que a qualidade da equipe é muito boa, o diagnóstico é correto e o governo deve conseguir implementar medidas a partir de reformas”, afirma Azevedo.
Mas tudo vai depender, porém, do Congresso, cujos partidos, em especial o PMDB, que está no governo, e seus aliados, sabem que é preciso fazer algo para ajustar o país até 2018. “Os interesses políticos estão alinhados, esses partidos são os que sempre governaram o país e refletem a sociedade brasileira, mas a questão é se a sociedade quer fazer as reformas”, alerta o ex-diretor do BC. “O governo precisa fazer um esforco para mostrar para a sociedade que será preciso fazer ajustes e que eles vão levar anos.”
Segundo Azevedo, o ajuste fiscal é crucial para a retomada da confiança na economia e na queda dos juros. E, como o processo de ajuste vai ser longo, as taxa de juros não vão poder cair tão cedo. “Mas o importante é saber se vamos ter ambiente externo favoravel e se o governo Temer vai tentar aprovar as reformas”, resume.
Ele explica que a inflação deve cair, mas como ficou alta durante muito tempo, essa queda será mais lenta, pela própria indexação da economia. “Com isso, o juro vai cair, não sei se em outubro ou novembro, mas quando começar, a queda será cautelosa”, diz Azevedo. E haverá a volta do real apreciado, reflexo do retorno da confiança no país, a melhora das contas externas e os juros internacionais baixos. Ele estima que a moeda deve ficar flutuando entre R$ 3,20 e R$ 3,30. “A queda recente tem um pouco de compensação da alta forte do ano passado”, diz o gestor.
Com a virada na economia, a renda variável fica mais atrativa, diz Azevedo. Segundo ele, apesar de o Índice Bovespa ter subido muito neste ano, depois de três anos em baixa, ainda há espaço para ganhos. “A carteira do Ibovespa mudou muito nos últimos anos, saíram papéis como OGX e, se olharmos os papéis atuais apenas, veremos que o índice não saiu do lugar nos últimos anos”, avalia. A renda variável fica atrativa também não só pelo juro baixo esperado para o país, mas também pelo risco soberano menor. “Se dermos o benefício da dúvida ao novo governo, o juro real cairá devagar, o dólar ficará onde está e a bolsa deve subir”, afirma o gestor. “Se não, é melhor vender e diversificar no exterior”, acrescenta.