Os investimentos voltaram a crescer no país no 3º trimestre de 2017, após quatro anos de queda e uma sequência de recordes negativos. A volta dos investimentos reforça as apostas de que a recuperação da economia brasileira tende a ganhar um pouco mais de tração daqui para frente.
Os dados do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre foram divulgados nesta sexta-feira (1º) pelo IBGE. A economia brasileira cresceu 0,1% no período, na terceira alta seguida.
A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), taxa que apura o que se investe em máquinas, bens duráveis e construção civil, avançou 1,6% na comparação com o trimestre anterior, segundo divulgou nesta sexta-feira (1) o IBGE. A última variação positiva do indicador tinha sido registrada no 3º trimestre de 2013 (0,6%).
Com a alta, a taxa de investimentos medida em percentual do PIB (Produto Interno Bruto) subiu para 16,1% no 3º trimestre. O volume, no entanto, ainda está um pouco inferior ao registrado no mesmo trimestre de 2016, de 16,3%, e muito abaixo do patamar acima de 21% registrado no mesmo período de 2013 – nível que já era considerado aquém do necessário para uma trajetória de crescimento mais robusto.
A avaliação é que o programa de privatizações, a recuperação gradual do consumo e a taxa básica de juros caminhando para sua mínima histórica devem ajudar com que os investimentos voltem a contribuir para a retomada da economia. Os analistas ouvidos pelo G1 destacam, porém, que a elevada ociosidade da indústria, o fraco desempenho da construção civil e as limitações orçamentárias de administrações públicas ainda travam investimentos.
Quem voltou a investir?
O crescimento do volume de investimentos foi puxado principalmente pela compra de máquinas e equipamentos, incluindo as importações. Pelo termômetro do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), setembro marcou o 4º mês seguido de crescimento nos investimentos em máquinas e equipamentos, enquanto a construção civil e outros continuaram alternando altos e baixos.
“É uma recuperação tímida ainda, mas já verificamos uma reversão da tendência. É um alento”, afirma o diretor de macroeconomia do Ipea, José Ronaldo de Souza Júnior.
Uma empresa que voltou a investir foi a Neodent, especializada na produção de implantes dentários, que gastou R$ 60 milhões neste ano na ampliação e troca de máquinas da sua fábrica em Curitiba, além da construção de um novo centro logístico.
Embora a Neodent aposte no crescimento do mercado brasileiro, o grande impulso para as vendas no momento tem vindo das exportações, que passaram a representar cerca de 40% do volume vendido no país, e cuja projeção é atingir 50% em 2018.
Entre os setores que conseguiram sair à frente na recuperação estão o automotivo (a produção de veículos cresceu 28,5% no acumulado do ano até outubro) e a indústria com foco na exportação.
A Renault, por exemplo, anunciou em agosto que vai investir R$ 750 milhões para construir uma fábrica de injeção de alumínio e ampliar uma planta de motores. Já a fabricante de caminhões e ônibus Iveco vai investir US$ 120 milhões em novos produtos entre o segundo semestre deste ano e o segundo semestre de 2019, enquanto a Mercedes-Benz do Brasil vai aplicar R$ 2,4 bilhões entre 2018 e 2022 para modernizar linhas de produção e desenvolver novos carros.
Termômetro de aposta no futuro
A taxa de investimentos é considerada um dos principais termômetros para se medir o desempenho da economia e o nível de otimismo da iniciativa privada.
“Investimento nada mais é do que uma aposta que se faz no futuro. E se hoje os investimentos estão titubeando é porque ainda se tem uma visibilidade limitada e muita capacidade ociosa” – Cláudio Frischtak, sócio da Inter.B Consultoria
Para Rafael Fagundes Cagnin, economista do IEDI ( Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), a retomada do investimento ainda é pontual e voltada mais para manutenção do parque do que para expansão.
“Em períodos de crise, a última coisa que se faz é investimento. O problema é que você não consegue adiar para sempre. Depois de 3 anos seguidos de queda da atividade industrial, as empresas acabam precisando desengavetar alguma coisa, simplesmente para proteger a sua posição no mercado”, explica.
Apesar da recuperação da indústria, o nível do uso da capacidade instalada continua próximo das mínimas históricas, o que limita o ritmo de retomada do investimento.
‘Não dá para esperar o governo’
A cadeia do agronegócio, que teve safra de grãos recorde neste ano, também tem evoluído de forma descolada do restante da economia. A Cargill, dona de marcas de alimentos como Elefante e Pomarola, é uma das companhias do setor que está investindo.
A companhia aplicou aproximadamente R$ 400 milhões em 2017 na continuação de projetos em portos, um novo centro de distribuição e expansão de linhas de produção. Também comprou a Integral Nutrição Animal, primeira transação no segmento no país.
O presidente da Cargill, Luis Pretti, diz que os investimentos são focados no longo prazo e que “não dá para esperar o governo melhorar para fazer” obras de infraestrutura.
O Brasil é o maior negócio da empresa fora dos Estados Unidos. A empresa investiu R$ 3,8 bilhões nos últimos seis anos no país e prevê mais R$ 500 milhões em 2018.
“A agricultura é uma realidade no Brasil, independentemente da política”, diz .
Investimentos públicos em queda
A retomada dos investimentos também é limitada pela explosão do endividamento dos governos federal e estaduais e pelas restrições orçamentárias.
Levantamento do pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Rodrigo Octávio Orair, mostra que o volume dos investimentos públicos totais, incluindo as estatais, caiu 37% de 2014 para 2016, passando de R$ 228,2 bilhões para 143,9 bilhões.
E 2017 ainda deverá ser mais um ano de queda no volume de investimentos públicos. As estimativas disponíveis apontam para uma queda de quase 50% no nível dos investimentos públicos estaduais: de R$ 57,8 bilhões em 2014 para R$ 28,7 bilhões acumulados em 12 meses até junho.
“É uma recuperação sem setor público e, em 2018, mesmo sendo ano eleitoral, os governos continuarão sem muito espaço de manobra”, observa a economista Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro/Ibre, da FGV.
Expectativas para o futuro
O investimento, no entanto, ainda não voltará a ser o motor da economia tão cedo.
“O consumo das famílias será o direcionador da recuperação. Vamos terminar 2017 com uma taxa de investimento ainda muito baixa, ao redor de 15% do PIB”, Frischtak.
O Ipea, órgão ligado ao Ministério do Planejamento projeta que, a partir de 2018, os investimentos já voltarão a crescer acima do PIB. A estimativa é de um avanço de 4,2% nos investimentos ante uma alta de 2,6% do PIB.
A retomada dos grandes investimentos, sobretudo os da área de infraestrutura, só deverá ganhar maior impulso a partir de 2019, em razão das incertezas em relação ao andamento da reforma da Previdência e também por conta das eleições do ano que vem.
“Enquanto não houver uma definição sobre qual será o novo governo e qual será a agenda econômica será difícil criar grandes estímulos ao investimento de longo prazo”, diz Cagnin, do Iedi.
G1