A Vale tem outra Vale dentro dela. A venda de uma pedaço da unidade de metais básicos, anunciada nesta quinta-feira, 27, avalia o braço de negócios em US$ 26 bilhões – 40% do valor de toda a mineradora nesta sexta-feira (US$ 65 bilhões). E a unidade que produz níquel e cobre ainda é responsável, nos cálculos do BTG Pactual, por apenas 10% a 15% dos lucros da companhia antes dos impostos e amortizações, o Ebitda. Em meio a transição energética no mundo e o apelo dos “metais verdes”, na Faria Lima, executivos calculam que a unidade pode em pouco tempo valer tanto quanto a mineradora.
Os US$ 26 bilhões do valor da Vale Base Metals (VBM) surpreenderam o mercado. O BTG observa que a expectativa era de um número entre US$ 22 bilhões a US$ 25 bilhões. Como destaca um banqueiro de investimento, a Vale conseguiu avaliar muito bem o negócio, com múltiplos mais do que o dobro dos indicadores da própria mineradora.
Na venda, o indicador que mede o ‘Enterprise value’ (EV, valor da companhia mais as dívidas) em relação ao Ebitda da unidade de metais básicos foi de 8,6 vezes, nos cálculos do Itaú BBA, enquanto o da Vale é de 4,1. O múltiplo também supera o de concorrentes internacionais, como a Freeport e a Antofagasta, ao redor de 8x, mas ainda está abaixo da Southern Copper, com 12x. “É apenas o primeiro passo para destravar valor da unidade”, observam os analistas do Itaú BBA.
Na visão do Itaú BBA, outras alternativas para destravar valor pela frente seria, por exemplo, fazer a abertura de capital (IPO, em inglês) da VBM, vendendo uma fatia maior da unidade. O presidente da Vale (BOV:VALE3), Eduardo Bartolomeo, reconheceu nesta sexta-feira, 28, em entrevista à imprensa, que um IPO é possível em cerca de quatro anos. O múltiplo “atrativo” do negócio mostra que a companhia conseguiu demonstrar a tese do valor que havia dentro da própria mineradora, ressaltou o executivo.
Pelo potencial da unidade de metais básicos, em meio a apostas na transição energética, a venda foi bastante disputada, atraindo interessados de várias partes do mundo, entre investidores estratégicos e financeiros. Entre os finalistas do processo, além dos vencedores, estavam a Qatar Investment Authority (QIA), a japonesa Mitsui e a montadora GM, de acordo com fontes. O processo começou no fim do ano passado, mas a reta final foi em junho.
Ao fim, a entrada do investidor ativista americano Engine Nº1 foi uma “inesperada” surpresa positiva, para os analistas do BTG. Conhecidos por defenderem ativamente uma agenda a favor de práticas ESG (sigla para práticas sociais, ambientais e de governança), eles terão uma participação de 3%. Níquel e cobre têm ganhado apelo no mundo nos últimos anos justamente por serem os metais da energia limpa, essenciais para a fabricação de baterias de carros elétricos.
Nos últimos anos, assim como a Vale, grandes empresas pelo mundo recorreram à estratégia de buscar valor em unidades dentro do seu próprio negócio, o chamado “carve out”. Muitas vezes, o potencial da unidade de negócios não está totalmente refletido nas ações das empresas. Um dos exemplos recentes foi a abertura de capital da Porsche pela Volkswagen, uma operação de mais de 9 bilhões de euros. Entre as latino-americanas, a Natura vendeu a marca de luxo Aesop para a L’Oréal por US$ 2,5 bilhões.