Ele explica que o modelo é o menos seguro porque a barragem é
construída em cima de rejeitos que já foram depositados. “Estamos
utilizando uma técnica de depósito de rejeitos que embute um certo
risco, principalmente quando há uma elevação muito rápida das
barragens”, afirma.
“Temos um passivo de 50 anos de construção de barragens deste
tipo. A velocidade de exploração mineral aumentou muito no Brasil,
faz parte da pauta de explorações do país, e temos sido lenientes
com o que está acontecendo do ponto de vista ambiental”, diz o
pesquisador que estima que o país tenha cerca de 130 barragens
deste tipo.
A barragem que se rompeu em Brumadinho tinha 86 metros de altura
e começou a ser construída em 1976 pela Ferteco Mineração
(adquirida pela Vale em 2001). Em comunicado divulgado neste
domingo (27), a Vale informou que a barragem estava inativa, sem
receber novos rejeitos, desde 2015.
Segundo levantamento divulgado em novembro do ano passado pela
Agência Nacional de Água (ANA), o Brasil possui 24.092 barragens de
usos múltiplos, das quais 45 foram apontadas como mais vulneráveis,
com algum comprometimento estrutural importante. Segundo a ANA, a
barragem de Brumadinho “não foi classificada como crítica”.
“Ainda é o mais utilizado no mundo porque exige menos
movimentação de terra”, afirma. Por outro lado, segundo ele, o
método perde em confiabilidade em comparação aos outros tipos de
construção.
“Outro problema é o sistema de drenagem e filtro, que é mais
complexo de se executar e monitorar”, observa Cantini, que defende
o uso de métodos de construção que permitam melhor controle dos
materiais envolvidos e monitoramento dos riscos.
O que fazer com esse tipo de barragem
Também chamou a atenção dos especialistas o fato de a barragem
que rompeu em Brumadinho já estar inativa. Ou seja, não estava mais
recebendo rejeitos da produção na mina.
“Ela não recebia mais rejeitos, o que estava contendo já era um
material mais seco, com muito menos porção líquida. Em teoria,
seria mais estável e muito menos propensa a ruptura do que uma
barragem ainda em atividade”, destacou Cantini.
Segundo a Vale, estava sendo desenvolvido em Brumadinho o
“projeto de descomissionamento” da barragem – procedimentos
técnicos para assegurar o encerramento da infraestrutura e para que
a desativação atinja condições de segurança e de preservação
ambiental. Nessa etapa, o material armazenado na barragem pode
ainda passar por um novo processamento, no qual os resíduos já em
estado sólido são armazenados em pilhas.
Martinez destaca porém que o processo de descomissionamento não
é simples e tem um custo elevado, e que portanto não representa uma
solução rápida para reduzir os riscos das barragens construídas
pelo método de alteamento a montante
“Temos um passivo de bilhões de reais. Vamos ter que entrar num
processo de descomissionamento dessas barragens e tentar mitigar
isso ao longo do longo tempo. Mas é um trabalho de 40 anos pelo
frente”, avalia.
Em entrevista na segunda-feira (28), o diretor-executivo de
Finanças e Relações com Investidores da empresa, Luciano Siani,
destacou que a companhia já não constrói novas barragens com
tecnologia a montante “há muitos e muitos anos”.
“Até então se acreditava que com o monitoramento adequado essas
barragens eram seguras, esses conceitos possivelmente terão que ser
reavaliados. Em razão disso a Vale vai apresentar um plano, eu
diria, ousado, com investimento bastante grande para fazer frente a
essas barragens (que já existem)”, afirmou o executivo, segundo a
agência Reuters. “Mesmo essas barragens antigas e desativadas, como
foi o caso dessa, vão passar por investimentos significativos para
zerar o risco”, acrescentou.
Saiba mais sobre as barragens de rejeitos
As barragens de rejeitos de minério de ferro são estruturas
construídas para armazenar resíduos resultantes do beneficiamento,
que é quando ocorre a separação do material rico, com valor
econômico, do rejeito, que é o material sem demanda de mercado.
Tipo de barragem que rompeu
A barragem que se rompeu usava o sistema “a montante”, que
cresce por meio de camadas (geralmente na forma de degraus),
chamado de alteamento (ou elevação), feitas com o próprio rejeito
que resulta do beneficiamento do minério de ferro. O rejeito é
formado basicamente por ferro, sílica e água.
Por que o método da montante é mais
vulnerável
A mineração nesse tipo de barragem geralmente faz uso de água
para beneficiar o material, valendo-se de grandes reservatórios.
Por isso, no processamento do minério de ferro, o rejeito tem alta
umidade e característica de lama. Este modelo é o mais barato e
considerado menos seguro devido a maior complexidade de controle de
drenagem e do monitoramento da estabilidade da estrutura de
contenção.