"O julgamento do mensalão ajuda a definir novos investimentos"
Carla Jimenez
A redução do custo de energia, a isenção do IPI e a desoneração da folha, por exemplo, ajudam a dimensionar os planos de produção de companhias, como a multinacional Whirlpool. Mas um dos mais importantes processos políticos brasileiros, o julgamento do mensalão, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), também ganha relevância para o mundo dos negócios, avalia João Carlos Brega, presidente da Whirlpool América Latina. “Começamos a enxergar instituições fortes, e isso garante que ama...
"O julgamento do mensalão ajuda a definir novos investimentos"
Carla Jimenez
A redução do custo de energia, a isenção do IPI e a desoneração da folha, por exemplo, ajudam a dimensionar os planos de produção de companhias, como a multinacional Whirlpool. Mas um dos mais importantes processos políticos brasileiros, o julgamento do mensalão, em curso no Supremo Tribunal Federal (STF), também ganha relevância para o mundo dos negócios, avalia João Carlos Brega, presidente da Whirlpool América Latina. “Começamos a enxergar instituições fortes, e isso garante que amanhã, se alguém assumir o governo, e tentar quebrar contratos, a instituição que zela pela Constituição dirá que não pode”, diz Brega, que assumiu o comando da empresa, em março deste ano, após dois anos à frente da Embraco, a divisão de compressores do grupo. “Nos países em que essa dinâmica não existe, as companhias não investem.”
DINHEIRO – Neste ano, o setor de linha branca foi beneficiado com a isenção do IPI, desoneração da folha de pagamento e redução no preço da energia. De que modo essas medidas beneficiam a Whirlpool?
JOÃO CARLOS BREGA – Beneficia a todo mundo, como consumidor e como produtor. O custo Brasil se torna menos pesado.
DINHEIRO – Isso muda a perspectiva de investimento da companhia?
BREGA – Uma empresa nunca investe num produto ou numa planta nova apenas por um ano ou dois. Há fatores de curto prazo que geram a confiança necessária para o longo prazo. Ninguém decide investir porque a carga tributária foi reduzida, por seis meses, com uma canetada. É preciso olhar a atuação dos Três Poderes, ver como está atuando o Executivo – no caso brasileiro, ele está atuando, ao fazer parcerias público-privadas, por exemplo. A gente vê a presidenta Dilma preocupada com a greve dos servidores, e isso é positivo. E olhamos o desempenho do Judiciário.
DINHEIRO – Um episódio, como o julgamento do mensalão, no STF, influencia numa decisão de investimento?
BREGA – Sem dúvida nenhuma. Isso é bom, tanto para mim, como cidadão, quanto como líder na empresa. Com o tribunal atuando, nós percebemos que existe o julgamento certo. E se precisar, haverá punição, se alguém fizer algo errado, independentemente da classe social. Começa a existir um sentimento de realização. Então, é claro que ajuda. Começamos a enxergar instituições fortes, e isso garante que amanhã, se alguém assumir o governo, e tentar quebrar contratos, a instituição que zela pela Constituição dirá que não pode. Isso é fundamental, é bom para o longo prazo. Nos países em que essa dinâmica não existe, as empresas não investem.
DINHEIRO – Quais são os planos de curto e longo prazo da Whirlpool no Brasil?
BREGA – Nós queremos e vamos trabalhar bastante para ser líderes de mercado no Brasil, e para isso promovemos um investimento constante em inovação. Inovação é o que permite que o consumidor olhe nosso produto de modo diferente. Fico muito contente quando a dona do Magazine Luiza, Luiza Trajano, nos diz: “Quero geladeira frost free inox para vender ao público da favela de Paraisópolis” (a empresária Luiza encontrou Brega num evento no dia 20, em São Paulo, e pediu, em público, um lote extra de geladeiras). Quando colocamos a linha inox no mercado no ano passado, alguns consumidores mantiveram a ideia de que a cozinha precisava ser toda branca. E hoje a gente tem máquina de lavar inox, ou ainda, colorida. Nosso desafio é continuar investindo em inovação. Hoje, sediamos no Brasil o centro global de lavanderia do grupo, e o desenvolvimento de refrigeração, na Embraco, líder mundial no segmento. Temos o conhecimento de onde se produz o compressor. Lançamos, no Brasil, o compressor com consumo de capacidade variável, que hoje, inclusive, é produzido na nossa planta na China.
DINHEIRO – É inteligência brasileira?
BREGA – Sim, há várias inovações que nasceram no Brasil. O compressor com capacidade variável foi criado há oito anos no País. Começou com uma economia de energia de 15% e hoje já alcança 35%. Também lançamos aqui o compressor sem óleo, ecologicamente correto, que permitiu um ganho tão simples quanto importante. Agora é possível tombar a geladeira para transportá-la, por exemplo. Antes não era possível porque o óleo vazava. Outra inovação é o refrigerador bivolt, que não existia no Brasil. Esse tipo de inovação, associado à redução de IPI, faz com que o consumidor tenha várias opções.
DINHEIRO – Hoje, a companhia exporta compressores e importa insumos, certo?
BREGA – Não tanto. Tirando ar-condicionado e micro-ondas, todo o restante da nossa linha de produção tem um índice de nacionalização de 85%. É verdade que nossos fornecedores dependem mais da importação.
DINHEIRO – O pacote de infraestrutura, lançado pelo governo em agosto, deve atacar gargalos que afetam o comércio exterior. Quais serão os benefícios para uma empresa como a Whirlpool?
BREGA – Com o fim do gargalo será mais eficaz em atender à demanda do varejo. O que levamos 24 horas para entregar, atualmente, poderemos atender em 12 horas. Da mesma forma, os nossos fornecedores, em vez de demorar três ou quatro dias para entregar nossas encomendas, vão demorar apenas um dia. Isso se transforma em agilidade, em competitividade e em vantagem para o cliente.
DINHEIRO – Luiza Trajano, do Magazine Luiza, brincou com o sr., cobrando a entrega rápida de um lote extra de geladeiras, e sua expectativa é entregá-lo apenas em março de 2013. Não está longe?
BREGA – Nós planejamos uma demanda, mas ela está muito acima do previsto. O segmento de linha branca vem crescendo a um ritmo de dois dígitos por ano. A Luiza está nos pedindo mais do que estávamos entregando para ela. Só posso entregar esse extra em março. Mas ela tem a geladeira para vender hoje, é claro.
DINHEIRO – A demora em entregar se deve à limitação na capacidade de produção?
BREGA – Sim, mas voltamos à cadeia de negócio. Eu informo ao meu fornecedor de aço que preciso de mais matéria-prima do que havia pedido, inicialmente. Mas ele não tem para vender agora e depende do porto, da logística etc. Meu tempo de reação é esse.
DINHEIRO – Ou seja, se os investimentos em infraestrutura já tivessem sido feitos, esse tempo de entrega seria menor.
BREGA – Com certeza. A capacidade de reação depende do meu estoque, que é limitado. O pior que pode acontecer para o nosso setor e para o varejo é perder uma venda. A venda de março é outra. A de agora foi perdida. É como uma entrevista que um jornalista deseja fazer. Se não for naquele momento, será outra conversa daqui a seis meses.
DINHEIRO – E a expectativa para o Natal?
BREGA – Nossa expectativa, assim como a do varejo, é boa. Não sei se será melhor que o Natal de 2011. Mas nossa expectativa é boa, por conta do nosso leque de produtos. Lançamos no mês passado 52 produtos novos, completando um total de 120 itens ao longo do ano. Ou seja, foram três produtos por semana. Então, posso dizer que estamos fazendo a nossa parte para movimentar esse mercado. Teremos um Natal bom? Sim. Mas em função dos nossos lançamentos.
DINHEIRO – A Whirlpool já fechou seu plano de negócios para 2013?
BREGA – Para nós, faça chuva ou faça sol, sempre continuamos investindo. Nós investimos, anualmente, 3% ou 4% da nossa receita líquida, o que equivale a algo ao redor de R$ 500 milhões. Um pouco mais, um pouco menos, é o que vamos manter no próximo ano.
DINHEIRO – Quando o governo pede às empresas que invistam mais, a Whirlpool não se sente cobrada?
BREGA – Eu não visto a carapuça quando o governo diz que as empresas precisam investir mais. Há momentos em que não estamos com 100% da capacidade de investimento, e talvez consideremos expandir nossa linha de produção. Mas ainda temos de investir em produtividade. Não necessariamente aumentando espaço físico. Agora, de novembro de 2011 a julho de 2012, contratamos mil pessoas, quando todo o setor de linha branca contratou quatro mil pessoas nesse período. Ou seja, estamos investindo.
DINHEIRO – Ao crescer dois dígitos, as empresas do setor, como Whirlpool, estão descoladas do restante da indústria, que
andou de lado ultimamente, certo?
BREGA – Dentro da indústria, estamos descolados porque há demanda reprimida por linha branca. Mas nós fazemos nossa lição de casa, investindo em inovação, em tecnologia, em produto. No nosso caso, não há nenhum produto nos Estados Unidos que não exista aqui.
DINHEIRO – Qual é o investimento da Whirlpool em inovação?
BREGA – Não abrimos esse valor por razões estratégicas, mas está incluído no investimento total de R$ 500 milhões feito anualmente. Posso dizer, apenas, que nossos produtos lançados nos últimos três anos representam mais de 20% das nossas vendas atuais.
DINHEIRO – Olhando para o futuro, um dos gargalos é a educação. Como o setor privado pode lidar com esta realidade?
BREGA – Nós, como sociedade civil, temos de nos organizar, entender onde estão os gargalos, e sentar com o governo e com o Congresso e mostrar que do jeito que está não vai dar. E não é só falar por falar. Precisamos propor o que precisa ser feito. Veja, o Brasil progrediu muito no diálogo vertical. A Eletros, por exemplo, que é a entidade que nos representa, senta com o governo e coloca quais são nossos problemas. O Instituto de Desenvolvimento do Varejo (IDV) cuida dos assuntos ligados ao comércio. O grande passo a ser dado agora é o diálogo transversal, ou seja, que atenda a todos os setores, elegendo algum tema, como o da educação. Dessa forma abre-se um diálogo permanente, até que se proponham as soluções adequadas.
DINHEIRO – O sr. acredita que o País já acordou para essa leitura transversal?
BREGA – Cada vez mais. A sociedade civil começa a se mobilizar. Foi o caso do dia sem imposto, realizado em maio, ao qual aderiram diversos setores. Foi uma iniciativa nacional. Estamos no estágio ideal? Não. Mas estamos nos mexendo. E um dado importante: o governo, principalmente o federal, escuta, dialoga.
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