O mercado financeiro ainda ecoa a fala suave (“dovish”) do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, ontem, ao dizer que a taxa de juros nos Estados Unidos está apenas um “pouco abaixo” das estimativas de neutralidade. A declaração foi vista como a possibilidade de um ritmo menos agressivo no aperto monetário em 2019, abrindo espaço até para um fim do ciclo de alta.
E essa expectativa resgata o apetite global por risco, melhorando o humor dos investidores. Agora, só resta um acordo de “cessar-fogo” entre EUA e China em torno da guerra comercial para garantir um rali de fim de ano. À espera do encontro entre os líderes Donald Trump e Xi Jinping, no sábado, durante a reunião do G-20 na Argentina, a alegria dos negócios com risco com o tom suave de Powell perde força.
Os investidores voltam o foco para a reunião crucial entre as maiores economias do mundo, que irão debater os problemas no comércio internacional. Caso o impasse entre EUA e China não chegue a nenhuma conclusão, a tendência de elevações mais pontuais de juros começa a ganhar força, em meio à expectativa de uma atividade econômica com menor crescimento.
Só que o mercado financeiro espera por uma necessidade menor no ritmo de aperto ou até uma pausa no processo de normalização dos juros nos EUA, e demais países desenvolvidos, sem que haja uma desaceleração econômica e, muito menos, uma recessão. Da mesma forma, os números de inflação ao consumidor nessas regiões não devem mostrar um cenário de aceleração mais acentuada de preços.
Por isso, os ativos perdem fôlego nesta manhã, à espera de novos indícios capazes de engatar um rali de fim de ano. Os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram com um viés negativo, um dia após Wall Street registrar os maiores ganhos em um único dia desde março. As baixas nas bolsas de Xangai (-1,3%) e em Hong Kong (-0,9%) pesam, ao passo que o dólar devolve os ganhos da véspera, o que impulsiona o petróleo na faixa de US$ 50.
Hoje, o calendário econômico norte-americano traz como destaque a ata da reunião de novembro do Fed (17h). O documento, porém, deve ser visto pelo retrovisor, diante dos comentários mais recentes de dirigentes da autoridade monetária, mas pode pavimentar o caminho para uma nova alta na taxa de juros dos EUA em dezembro – a quarta deste ano.
Depois de Powell, a curva implícita de juros futuros projeta, agora, apenas mais um aumento de 0,25 ponto percentual dos juros norte-americanos em 2019, ante previsão anterior de até três apertos espaçados ao longo do próximo ano. Com isso, o rendimento (yield) do título dos EUA de 10 anos (T-note) caiu para 3%.
Entre os indicadores do dia nos EUA, saem os dados sobre a renda pessoal e os gastos com consumo em outubro (11h30), que podem dar novos sinais sobre o acúmulo de pressões inflacionários vindas do consumidor. No mesmo horário, saem os pedidos semanais de auxílio-desemprego e, depois, é a vez das vendas pendentes de imóveis em outubro (13h).
No Brasil, saem novos dados (8h) sobre a confiança dos setores industrial e de serviços em novembro, que devem mostrar um otimismo dos empresários com o cenário de retomada econômica, ainda que gradual. No mesmo horário, sai o IGP-M deste mês, que deve apagar a alta em outubro e cair 0,5%, com a taxa acumulada em 12 meses saindo dos dois dígitos.
Depois, é a vez dos dados atualizados até outubro sobre o desemprego no Brasil (9h). A previsão é de queda a 11,7%, com a taxa de desocupação renovando o menor nível do ano, voltando ao patamar visto pela última vez em julho de 2016. No fim do dia, saem dados de atividade na indústria e no setor de serviços da China em novembro.
Por aqui, os investidores seguem de olho na aprovação de pautas importantes no Congresso, mas a votação do projeto de lei de cessão onerosa do pré-sal – cujo leilão das áreas de petróleo pode gerar uma receita bilionária aos cofres do governo, ajudando no ajuste fiscal – ficou para a semana que vem. O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, reconheceu que “está difícil” chegar a um acordo entre os governo atual e eleito sobre a partilha de recursos.
O tema gera algum atrito entre o governo atual e o próximo, como já ocorreu no caso do polêmico reajuste ao Judiciário, sancionado pelo presidente Michel Temer nesta semana, com a autorização do aumento de mais de 16% nos salários dos ministros da Suprema Corte (STF), provocando um efeito cascata na magistratura. Os investidores temem por novos percalços na cena política, com a atual legislatura só vindo com “pauta-bomba” antes do governo virar, em 2019.