O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, anunciou sua demissão do cargo nesta sexta-feira, 24. Em pronunciamento de cerca de 40 minutos, ele fez um balanço de seu trabalho à frente da pasta e relembrou que quando aceitou assumir o ministério, o presidente garantiu que ele teria “carta-branca”.
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O estopim para a decisão de sua saída foi a confirmação da demissão do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo. Em sua fala, Moro citou diversas vezes que Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal. “Avisei que seria uma interferência política e Bolsonaro disse que era mesmo”. Ele citou tentativas de acesso do presidente a investigações sigiolosas.
“Não é tanto a questão de quem colocar, mas de porque trocar e permitir que seja feita interferência politica no âmbito da Polícia Federal”, sustentou. A exoneração de Valeixo, disse Moro, é uma “sinalização que o presidente também me quer fora do cargo” e que ele não teria como aceitar essa substituição. “Isso foi ofensivo”, disse sobre não ter ficado sabendo sobre a exoneração do chefe da PF.
Moro citou, ainda, que por conta de seu passado como juiz e seu “compromisso com estado de direito”, ele acreditou que poderia ser um “garantidor da lei, da imparcialidade e autonomia das instituições” dentro do governo. O ex-juiz defendeu que sai porque “precisa preservar sua biografia”.
Para o ex-juiz, a autonomia da Polícia Federal durante os governos petistas foi essencial para garantir o trabalho da Operação Lava Jato. “É certo que o governo da época tinha inúmeros defeitos, aqueles crimes gigantescos que aconteceram naquela época. Mas foi fundamental a manutenção da autonomia da PF para que pudesse ser realizado este trabalho. Seja de bom grado, seja pela pressão da sociedade, essa autonomia foi mantida, permitindo que os resultados fossem alcançados”.
No início de sua fala, ele citou o número de mortes pelo novo coronavírus no Brasil e lamentou ter que fazer esse anúncio no meio da pandemia. Moro revelou, com voz emocionada, que a única contrapartida que fez a Bolsonaro foi garantir que sua família não ficasse desamparada, “caso acontecesse algo com ele”, já que ele iria perder a previdência que contribuiu por 22 anos de magistratura.
Sobre o seu futuro, o ex-juiz disse os 22 anos de magistratura que abandonou é “infelizmente um caminho sem volta”, que vai descansar e mais adiante procurar um emprego. “Não enriqueci no serviço público, nem como magistrado, nem como ministro”. Ao final de sua fala, ele foi aplaudido de pé por servidores.
Ainda não foi anunciado quem assumirá o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública, mas Anderson França, secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, e Alberto Fraga são nomes que estão em avaliação.
Revés
A decisão de Moro, um dos ministros mais populares do governo, é um revés para o presidente Jair Bolsonaro, já que a ida dele para Brasília foi considerada um “gol de placa” do presidente por ter na sua gestão um símbolo de combate à corrupção.
A decisão de Moro ocorre após a confirmação da demissão do diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, pelo presidente Jair Bolsonaro publicada em edição extra do Diário Oficial da União na madrugada desta sexta-feira.
Na véspera, em reunião no Palácio do Planalto pela manhã, o presidente avisou a Moro que demitiria o diretor-geral da Polícia Federal e o ministro chegou a dizer que não via motivos para continuar no cargo sem a permanência de Valeixo.
Os ministros da Casa Civil, Braga Netto, do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, começaram a atuar então para garantir a permanência de Moro e passaram a buscar uma solução que atendesse tanto ao ministro da Justiça quanto ao presidente.
Posteriormente, Moro sinalizou nos bastidores que poderia permanecer no cargo, caso fosse responsável pela escolha do sucessor de Valeixo.
A saída de Moro do governo é a segunda baixa no alto escalão de Bolsonaro em cerca de uma semana. Na quinta-feira da semana passada, Bolsonaro demitiu Luiz Henrique Mandetta do comando do Ministério da Saúde em meio à pandemia de coronavírus e colocou em seu lugar o oncologista Nelson Teich.
Histórico
Maior ícone da Operação Lava Jato, que colocou algumas das principais figuras políticas e empresariais do país na cadeia, Moro abandonou uma carreira de 24 anos como juiz federal para ser ministro.
A promessa era de que ele teria carta branca e estaria no comando de um superministério turbinado com a pasta da Segurança Pública e novas atribuições de combate à lavagem de dinheiro por meio da incorporação do Coaf.
No entanto, o período de Moro como ministro acabou sendo chamuscado por conflitos com o chefe, derrotas políticas e revelações sobre seu passado.
Mensagens privadas vazadas pelo site The Incercept em parceria com outros veículos de imprensa deixaram clara a proximidade do então juiz Moro com procuradores e revelaram episódios de parcialidade e direcionamento das investigações.
O Pacote Anticrime, principal bandeira legislativa de Moro, foi desidratado pelo Congresso, que também transferiu o Coaf primeiro para o Ministério da Economia e depois para o Banco Central.
Visto como uma espécie de seguro contra casos de corrupção ou uma possível escalada autoritária de Bolsonaro, o ministro não se colocou publicamente nos principais episódios de agravamento da tensão institucional e também evitou comentar as denúncias envolvendo os filhos e aliados do presidente.