“Pois bem. Inventam uma história fantástica. Que tá na nuvem. É. Tá na nuvem. Sei lá que nuvem. Sabe, eu não entendi muito bem essa história de nuvem. Tô aqui tentando apurar direitinho. Como é que uma coisa pode estar na nuvem? É muito simples estar na nuvem, não tem de provar. Que nuvem? Onde está a prova?”.
Essa foi a dúvida levantada por Dilma Rousseff em uma entrevista em 2016, mas, antes de julgar, é claro que em algum momento todos nós também já nos perguntamos a mesma coisa, afinal “nuvem” tem a ver com tecnologia, e essas coisas são bem confusas mesmo. Porém, muito antes do comentário da presidente, uma empresa já havia se tornado bastante famosa por atuar com “nuvem” e tantas outras operações tecnológicas. Mais do que isso, ela já havia ganhado notoriedade na América Latina e também em países como Estados Unidos, México e China, usando a tecnologia a favor de empresas de todos os portes.
Se você não é um investidor, pode até não conhecer essa empresa nem saber de suas operações, mas, se você é investidor do mercado financeiro – e se preside um país –, tem de conhecer as companhias de grande representatividade e que ajudam a mover o Brasil, como é o caso da TOTVS (TOTS3).
Quem é essa companhia
Embora atualmente a empresa detenha mais de 50% de market share no Brasil e mais de 30% na América Latina em sistema de gestão empresarial – ou seja, softwares que automatizam e integram os dados das empresas para as fazerem funcionar –, isso não veio de uma hora para outra. Como sabemos, existem duas formas principais de as empresas crescerem: ou por elas mesmas (o chamado crescimento orgânico), ou fazendo fusões e aquisições (o conhecido crescimento inorgânico). Para não ter dúvidas, a TOTVS investiu nas duas frentes.
Inicialmente, é preciso entender que a empresa não nasceu com esse nome. Havia a Microsiga, que começou criando soluções acessíveis para as “micro” – pequenas e médias companhias brasileiras – em 1983. Pouco tempo depois, ela foi pioneira ao criar um sistema de franquias para expandir sua atuação – e já não era mais tão “micro” assim. Em 1997, ela começou seu processo de internacionalização pela terra de los hermanos, a Argentina – e bem no ano que o país ganhou a Copa do Mundo Fifa Sub-20.
Claro que a entrada nesse mercado não teve a ver com futebol, mas sim com estratégia, afinal os países da América Latina se mostraram muito promissores por terem características semelhantes ao Brasil quanto à demanda para as operações da companhia. Havia muita pequena e média empresa, e bem poucas companhias com soluções tecnológicas de gestão para atendê-las. Solo promissor para a TOTVS.
Em 2003, a companhia foi um pouco mais longe no globo, entrando no México por meio de uma aquisição. Foi o começo de muitas – muitas mesmo, mais de 40 – e o nome precisou ser mudado. Se antes tinha tudo a ver com atender as “micro”, agora a intenção era outra.
TOTVS vem do latim e significa totalidade, tudo ou todos. Não há nome melhor. A empresa saiu comprando diversos rivais do mercado e hoje é líder em softwares no Brasil e a maior do Hemisfério Sul. Lá fora, ela está presente em mais de 40 países. Além de atuar com um portfólio de negócios baseado em soluções de gestão e recursos humanos para mais de 12 segmentos de mercado, a TOTVS também cria soluções para as companhias otimizarem processos de contato com seus clientes, por meio de produtos de e-commerce, marketing e vendas.
Mais recentemente, a companhia passou a operar também com algo que vai se tornar uma grande tendência: techfin. Invertendo a palavra, temos fintech, que você já conhece e se trata dos serviços financeiros oferecidos pelas companhias do mercado. Porém, a techfin vai além: é uma empresa de tecnologia que oferece soluções financeiras. Como mais de 25% de todos os funcionários da folha de pagamento do Brasil são cobertos por um sistema da TOTVS, integrar isso à techfin é um grande diferencial e uma linha de boa aderência.
Assim, a empresa se posiciona no mercado oferecendo em um único lugar as maiores soluções tecnológicas essenciais para os empreendedores. É claro que, para tanto, ela investe pesado também em pesquisa e desenvolvimento. Nos últimos cinco anos, foi mais de R$ 1 bilhão destinado a isso.
A primeira em diversas frentes
A grandiosidade da TOTVS não para por aí. Em 2006, ela foi a primeira companhia de tecnologia da informação (TI) da América Latina inteira a abrir capital na Bolsa, tendo suas ações valorizadas em mais de 15% no seu primeiro dia de negociações. De lá para cá, não mudou muito em termos de investidores dispostos a injetar capital na companhia, tanto que ela bateu mais um marco histórico: tornou-se a primeira de tecnologia a entrar para o Ibovespa em 2020. Exatamente, em 2020, ano da pandemia.
Com tantas soluções integradas, a empresa conseguiu manter margens muito positivas principalmente nesse período, em que as companhias precisaram se modificar para o meio digital. As taxas de renovação com os clientes ficaram sempre acima de 90%. No segundo trimestre, o mais crítico em termos de onda pandêmica, as renovações ficaram em 99% e a TOTVS teve uma demanda de 70% de novas vendas.
De acordo com relatório do BTG Pactual, como muitos dos contratos são ajustados conforme o IGP-M, o índice inflacionário que vem crescendo consistentemente desde o segundo semestre de 2020, a tendência de margens robustas com os atuais e novos clientes pode continuar conforme os novos reajustes. Além disso, justamente devido à pandemia houve um período de carência para muitos novos clientes, portanto projetam-se receitas recorrentes derivadas disso para os próximos trimestres.
=> Veja como estão os números fundamentalistas da empresa.
Na Bolsa, enquanto o Ibovespa refletia o pessimismo dos investidores no ano, encerrando com uma leve alta de 2,8%, as ações da TOTVS mostravam alta de 35% no acumulado dos 12 meses. Veja como ficou o gráfico do período e como estava até então o desempenho das ações desde 2016.
Obs.: a última cotação data de 17 de fevereiro de 2021.
=> Confira a cotação de TOTS3 em tempo real aqui.
=> Veja cotações históricas da ação nos últimos anos aqui.
Repare que o pico de alta ocorreu em fevereiro. Enquanto o Ibovespa caía com tudo, TOTS3 – e seus investidores – estava nas nuvens, subindo na mesma proporção. O mercado repercutiu a segurança das ações TOTS3 nesse momento conturbado, o que acabou também supervalorizando o papel, mas não espantando os investidores.
Até mesmo o governo de Singapura aumentou sua participação na empresa no começo deste ano, e não foi porque o quarto país mais rico do mundo em termos de poder de compra não tinha em que gastar tanto dinheiro. Na verdade, isso ocorreu após os ótimos resultados do acumulado de 2020 da TOTVS. Quase um ano antes – quando a TOTVS mais crescia –, o governo tinha vendido uma parcela da sua participação.
Quando se olha para a composição acionária da empresa, Singapura é o terceiro maior acionista da TOTVS (com 5,21% de participação), atrás da gestora BlackRock (6,22%) e da LC EH Participações e Empreendimentos (13,89%), fundo de investimentos de Laércio Cosentino, um dos fundadores da empresa e atual presidente do Conselho de Administração da companhia.
Com tamanha atenção assim de todos os lados e ótimo desempenho, parece que a TOTVS realmente é feita para deixar os investidores nas nuvens, não é? Mas saiba que, dentro do segmento, a concorrência é acirrada. Muitos rivais a companhia já adquiriu, como comentamos anteriormente, quando começou seu processo de crescimento inorgânico. Porém, hoje em dia, SAP e Oracle são as maiores em termos de concorrência de operações.
Concorrência acirrada
Enquanto a TOTVS é líder no mercado geral de sistemas de gestão empresarial no Brasil e também a empresa mais contratada pelas pequenas e médias companhias, a SAP (empresa alemã) supera a TOTVS quando se trata de oferecer esses sistemas para as grandes empresas. A Oracle fica em terceiro lugar.
Além de haver rivalidade pelos clientes, a TOTVS também tem rivais na Bolsa, concorrendo pelos investidores com empresas como Sinqia (SQIA3), Locaweb (LWSA3) e Linx (LINX3). A Linx foi uma das que a TOTVS já quis adquirir, porém perdeu para a Stone (STNE). Isso mesmo, aquela empresa da maquininha de cartões verde.
A Locaweb ainda é novata na Bolsa, mas, como podemos observar no gráfico a seguir, não deixa a desejar em termos de valorização das ações. Aliás, recentemente ela e a TOTVS também brigaram por uma aquisição, da RD Station, que é uma empresa controlada por um dos maiores fundos de tecnologia do mundo.
Obs.: a última cotação data de 17 de fevereiro de 2021.
Como podemos observar, a briga não é nada discreta no mercado de tecnologia e também no mercado financeiro. As companhias precisam investir muito em inovação, e isso sempre se reflete nas receitas. Como é um setor com muita rivalidade, ou as empresas incorporam ou são incorporadas, portanto olhar os desembolsos envolvidos para dar margem a isso também vem muito a calhar. Vale ainda se atentar à estratégia por trás de cada aquisição, entender o que a empresa pretende com isso. Assim, pode fazer valer a pena o investimento quando se projeta retornos de longo prazo, pensando nas sinergias e no desenvolvimento de operações pós-aquisição.
E você, o que acha de tudo isso? Acredita que a TOTVS continua mantendo o investidor nas nuvens assim como fez no período mais crítico da atualidade? Comenta aqui embaixo e não se esqueça de compartilhar o conteúdo com seus amigos.
Uma empresa razoável (11% de margem e baixo endividamento). Mas acredito que já está precificada. Bem precificada para o curto prazo. Como não paga dividendos relevantes (<1%), também não é tão boa a longo prazo.