Sobra de liquidez no curto prazo vai ao recorde de R$ 444 bilhões
09/09/2009 - Valor Econômico
Jornalista: Cristiane Perini Lucchesi
Apesar de uma tímida retomada na concessão de crédito para as pessoas físicas, os bancos brasileiros estão "inundados" de dinheiro como nunca. E o Banco Central é obrigado a atuar, enxugando liquidez empoçada no curto prazo, por meio de empréstimos que toma do mercado nas chamadas operações compromissadas. É a forma de evitar que essa sobra de dinheiro derrube a taxa básica Selic abaixo dos níveis desejados pela autoridade monetári...
Sobra de liquidez no curto prazo vai ao recorde de R$ 444 bilhões
09/09/2009 - Valor Econômico
Jornalista: Cristiane Perini Lucchesi
Apesar de uma tímida retomada na concessão de crédito para as pessoas físicas, os bancos brasileiros estão "inundados" de dinheiro como nunca. E o Banco Central é obrigado a atuar, enxugando liquidez empoçada no curto prazo, por meio de empréstimos que toma do mercado nas chamadas operações compromissadas. É a forma de evitar que essa sobra de dinheiro derrube a taxa básica Selic abaixo dos níveis desejados pela autoridade monetária.
Segundo os números do próprio BC até julho, último mês disponível, o saldo das operações compromissadas atingiu o recorde de R$ 444 bilhões em 15 de julho para empréstimos de até sete meses tomados pelo BC. Os números da Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro) consideram as transação de mais curto prazo, até 33 dias, e apontam no mesmo sentido: o BC enxugou R$ 357,62 bilhões no dia 23 de julho, valor que caiu para o total de R$ 344 bilhões no dia 3 de setembro. As taxas pagas têm ficado entre 8,60% e 8,70% ao ano, ligeiramente inferiores aos 8,75% da taxa básica Selic.
O excesso de liquidez se deve principalmente à política de compra de reservas internacionais do BC no mercado interno de câmbio. Na verdade, quando a fase mais aguda da crise começou, em setembro do ano passado, com a quebra da Lehman Brothers, a sobra de liquidez já se aproximava dos R$ 200 bilhões. Parte importante dela vinha das compras de dólares que o BC vinha realizando. Para se ter uma idéia, somente em 2007 foram adquiridos um total de nada menos do que US$ 80 bilhões para evitar uma apreciação forte demais no real com volatilidade no mercado de câmbio.
Ao comprar esses dólares, o BC entrega reais ao mercado, que podem ser retirados também por meio da emissão de títulos públicos do Tesouro Nacional. Acontece que o Tesouro desde meados de 2008 está atuando no sentido contrário e realizando resgate líquido de títulos públicos, o que acaba ajudando a ampliar a liquidez do curto prazo. Também a liberação dos empréstimos compulsórios a partir de outubro, em um total de R$ 100 bilhões estimados pelo mercado, contribuiu para ampliar a liquidez decorrente da política de compra de reservas do BC.
Com a crise do final do ano passado, o BC até atuou na ponta contrária e vendeu US$ 14,533 bilhões de outubro até fevereiro, enxugando os reais do mercado. Mas, desse total, US$ 10,57 bilhões já foram recomprados pelo BC no mercado à vista neste ano com a retomada do ingresso de dólares no país.
É importante destacar que os empréstimos em moeda estrangeira feitos pelo Banco Central, que chegaram a US$ 24 bilhões no caso dos lastreados em Adiantamento de Contrato de Câmbio, já foram devolvidos em mais de US$ 20 bilhões pelos bancos, mas não impactam a liquidez em reais. Também não ampliam os reais de curto prazo dos bancos as linhas em dólar com compromisso de recompra feitas pelo BC para aliviar o aperto de liquidez em dólar no final do ano passado, de US$ 10,19 bilhões, e que já foram integralmente devolvidas pelo mercado.
Os recursos que sobram no curto prazo poderiam ser direcionados para o mercado de crédito, se os bancos quisessem fazer esse tipo de ativo. Mas, ao que tudo indica, com o aumento da inadimplência das pessoas físicas e jurídicas, os empréstimos ao BC continuam mais seguros e ainda bastante rentáveis.
É verdade que a concessão de empréstimos para pessoa física tem crescido, com a média diária de novas concessões em julho chegando a R$ 2,5 bilhões, um aumento de 10,1% no ano e de 9% em 12 meses. As pessoas jurídicas, no entanto, que representam o grande volume de crédito no país, estão com a média diária de novas concessões em R$ 4,126 bilhões em julho, uma queda de nada menos do que 19,2% no ano e de 8,1% em 12 meses.
Por causa da contração no crédito para pessoa jurídica, as novas concessões de crédito no país considerando-se as pessoas físicas e as pessoas jurídicas estão em R$ 6,63 bilhões, um volume 10,1% menor no acumulado do ano e 2,3% menor em 12 meses. O crédito total está ainda em contração, portanto. O mercado prefere olhar a média diária de novas concessões, pois o saldo total de crédito muitas vezes cresce apenas pelas rolagens de dívidas e capitalização dos próprios juros dos empréstimos.
Essa sobra de liquidez no curto prazo e o crédito ainda retraído se explicam em parte pelo aumento da inadimplência da pessoa física e jurídica, segundo verificado nos dados do próprio Banco Central do Brasil. Em julho, último dado disponível, o nível de não-pagamento dos empréstimos às pessoas jurídicas atingiu 3,8%, um recorde dos anos recentes.
Não é apenas no Brasil que os bancos estão com sobra de reservas no curto prazo. A política do Fed, banco central americano, e das autoridades monetárias da Europa e Japão, entre outras, de injetar ampla liquidez no mercado, tem impactado os mercados no mundo todo. E essa ampla liquidez disponível pela política de relaxamento quantitativo, que inclui juros em recorde de baixa nos países ricos, nem sempre chega às empresas como as autoridades monetárias gostariam.
O Valor publicou recentemente um estudo confidencial que mostra que o "excesso de reservas" dos bancos dos países ricos atingiu US$ 1,222 trilhão ao final de agosto, só ligeiramente inferior ao montante do começo do ano, de acordo com o Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês). Não é à toa que o Fed passou a comprar títulos das empresas diretamente para tentar desafogá-las. Os bancos comerciais nos Estados Unidos e na Europa continuaram a reduzir créditos para as empresas e os consumidores. As instituições dos 16 países da zona euro registraram o maior fluxo negativo líquido em junho, quando emprestaram US$ 49 bilhões a menos do que receberam de pagamentos.
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