Adoção de 'taxa de insucesso' cresce em
aquisições no BrasilPor Maria Luíza Filgueiras | De São PauloTaxas de insucesso ou multas por desistência
estão se tornando comuns nas operações de fusões e aquisições
no Brasil. Chamadas de "break-up fees" no jargão do
mercado financeiro e comuns nos Estados Unidos e Europa, elas
aparecem no mercado brasileiro em meio ao maior risco de veto de
reguladores e à pressa para tirar concorrentes de uma disputa.
Nessas operações, a empresa compradora assume o risco de a
aquisição não ser concluída por uma série de motivos, desde uma
mudan...
Adoção de 'taxa de insucesso' cresce em
aquisições no BrasilPor Maria Luíza Filgueiras | De São PauloTaxas de insucesso ou multas por desistência
estão se tornando comuns nas operações de fusões e aquisições
no Brasil. Chamadas de "break-up fees" no jargão do
mercado financeiro e comuns nos Estados Unidos e Europa, elas
aparecem no mercado brasileiro em meio ao maior risco de veto de
reguladores e à pressa para tirar concorrentes de uma disputa.
Nessas operações, a empresa compradora assume o risco de a
aquisição não ser concluída por uma série de motivos, desde uma
mudança nas condições econômicas, alterações na legislação do
setor ou mesmo um veto parcial ou total de órgãos de defesa da
concorrência.Na maior aquisição da história brasileira - a
venda da fabricante de celulose Fibria -, as multas propostas pelos
interessados foram agressivas. A Suzano, que venceu a disputa com a
asiática Paper Excellence, vai pagar R$ 750 milhões à Fibria se o
negócio não se concretizar. No contrato assinado, se a operação
for totalmente vetada pelo Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade), as empresas não arcam com qualquer multa. Mas, se
o Cade exigir muitas alterações no negócio, como venda parcial de
operações ou impedimento de crescer em algum mercado, e a Suzano
considerar que, no novo formato, o negócio não vale a pena, terá
que pagar.O valor negociado pela Suzano parece até pouco
perto dos R$ 4 bilhões que a Paper Excellence chegou a oferecer como
multa caso o negócio não se concretizasse, o que representava 10%
da oferta de R$ 40 bilhões. "Um dos principais motivos para
esse tipo de taxa é compensar o vendedor por perder outras
oportunidades. A cláusula é mais comum quando envolve empresas de capital aberto", diz Rodrigo
Mello, responsável pelo banco de investimento Greenhill no Brasil.Esse foi claramente o caso da proposta agressiva
da Paper Excellence. A empresa estava fazendo uma oferta que
dispensaria o processo de "due dilligence" na Fibria e o
negócio estava prestes a ser fechado com a Suzano quando a
proposta foi feita. Segundo duas fontes que participaram do negócio,
a primeira proposta da asiática, feita numa sexta-feira à noite,
previa uma taxa de US$ 300 milhões à Votorantim. Para tentar
convencer o BNDES, a companhia resolveu oferecer o mesmo montante ao
banco - que, por sua vez, pediu que também houvesse um valor
correspondente para os minoritários. "De sexta para
domingo, o valor saltou para US$ 1,2 bilhão", diz um executivo
ligado à companhia. Mas não adiantou. Essa seria a maior multa de insucesso da história
para operações brasileiras e ficaria entre as maiores do mundo nos
últimos 15 anos. No ranking global de valores absolutos, segundo
dados da consultoria Dealogic, a maior taxa já negociada em contrato
foi de US$ 10 bilhões, em 2013, na transação em que a americana
Verizon Communications comprou a participação da Vodafone na
Verizon Wireless, por US$ 130 bilhões. Entre outros destaques, está
a multa de US$ 3 bilhões que a cervejaria AB InBev se propôs
a pagar à SABMiller, em 2015 - a transação foi concluída com
sucesso.Já o valor no contrato assinado entre Suzano e
Fibria é equivalente ao que foi estabelecido, em 2015, na aquisição
da Cetip pela BM&FBovespa. Essa havia sido uma das poucas
operações no país com essa cláusula, que acabou não sendo
executada. "Historicamente, é muito pequeno o número de
contratos que incluía essa cláusula e mais raro ainda vermos a
execução dela", afirma Cesar Amendolara, sócio do escritório
Velloza Advogados. Levantamento da consultoria Dealogic feito a
pedido do Valor mostra que, de 2003 a 2015, apenas dez transações
no Brasil previam essa taxa - no período, foram mais de 2 mil
transações de fusão e aquisição.Desde 2016, no entanto, já foram pelo menos seis
em contrato (nem todas as companhias tornam a informação pública).
O grupo de ensino Ânima pagou R$ 46 milhões, em abril de 2016,
quando desistiu de comprar a Ilumno (antiga Whitney do Brasil), taxa
equivalente a 4% do valor da transação, de R$ 1,14 bilhão.
Enquanto aguardava a aprovação regulatória, o governo brasileiro
mudou as regras de financiamento estudantil e a operação deixou de
fazer sentido para a Ânima.O percentual está em linha com a média no
mercado internacional, mas abaixo da média brasileira. Segundo a
Dealogic, o "break-up fee" médio nos Estados Unidos é de
3,8% do valor da transação. O Brasil é que tem destoado desse
percentual, com uma taxa média de 8,2% do valor do negócio.Bancos e advogados ouvidos pelo Valor dizem que
outro forte motivo que faz com que essa tendência seja crescente é
o endurecimento do Cade nas grandes operações. Aumentou a chance de
o negócio não sair e os vendedores acabarem de volta ao mercado
para buscar outras soluções estratégicas. "A multa aparece
principalmente em operações grandes, pois é quando há risco de
concentração e, assim, uma potencial dificuldade de o negócio ser
totalmente aprovado", diz o advogado João Ricardo Ribeiro,
sócio do escritório Mattos Filho. Por isso, é comum no mercado
internacional que, quanto maior o risco de veto, maior a taxa.Uma exigência regulatória considerada inviável
para a conclusão do negócio foi o que aconteceu, por exemplo, na
aquisição da Alesat Combustíveis pela Ipiranga, do Grupo Ultra. O
Cade indicou que a compradora precisaria se desfazer de ativos que
indicavam risco de concentração, que somariam quase 65% do negócio
adquirido. Se a Ultra quisesse a aprovação, teria que vender
mais da metade do que comprou - o que a empresa não se propôs a
fazer e a aquisição foi vetada pelo Cade em agosto de 2017. O Ultra
não comenta se havia incluído um "break-up fee" nesse
contrato, mas em outra operação do grupo, vetada seis meses depois
pelo Cade, havia.A Petrobras embolsou R$ 282 milhões na venda
desfeita da Liquigás para o Ultra, correspondente a 10% do valor da
transação, de R$ 2,8 bilhões. Com o dinheiro em caixa, a empresa
avalia se tentará uma nova venda direta ou se vai fazer uma oferta
de ações. Nesse caso, diferentemente do contrato entre Suzano e
Fibria, o veto total do Cade gerava a multa.Executivos ressaltam, no entanto, que a taxa nem
sempre cobre o risco que a companhia correu. "Quando uma empresa
volta para o mercado, normalmente é com desconto sobre o que foi
fechado anteriormente", afirma um advogado societário que
trabalha nessas operações. Três fontes afirmam que a Alesat, por
exemplo, está sendo negociada por cerca de R$ 400 milhões a menos do que a oferta vetada pelo Cade.
Para empresas de capital aberto, isso pode implicar a desvalorização
das ações. "O risco é que a empresa fica parada, sem tomar
decisões relevantes como troca de equipe, cortes de custos ou mesmo
outras ações estratégicas, esperando a conclusão do negócio",
diz o conselheiro de uma empresa aberta, que prefere não ser
identificado.Foi um cenário parecido com esse o que aconteceu
no grupo de educação Estácio, enquanto aguardava a aprovação no
Cade da aquisição por parte da Kroton. A empresa tinha um
presidente novo, o executivo Pedro Thompson, que começou a executar
alguns ajustes de orçamento à espera da aprovação regulatória da
fusão - mas não adiantava demitir executivos ou buscar ganhos de sinergia em uma empresa que
nem sabiam que tamanho ia ter ou quem ia comandá-la. Um ano depois
do anúncio da fusão, o Cade vetou a operação e a Estácio
embolsou R$ 150 milhões com o veto. Os ajustes em larga escala, como
demissão de professores e mudança na oferta de cursos, começaram
depois de um ano de empresa praticamente congelada. Nesse caso, deu certo -- depois do veto, a Estácio
não conseguiu uma nova negociação, mas a operação ganhou
rentabilidade e as ações subiram.http://www.valor.com.br/financas/5395365/adocao-de...
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