O Comitê de Política Monetária (Copom) demonstrou especial preocupação com a deterioração das expectativas de inflação de prazos mais longos em sua última reunião, realizada entre os dias 31 de janeiro e 1° de fevereiro, quando optou novamente por manter a taxa Selic em 13,75% ao ano.
Segundo a ata da reunião divulgada nesta terça-feira (7), tal deterioração pode ter ocorrido por diversas razões, desde uma possível percepção de leniência do BC com as metas estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), até uma política fiscal expansionista, que pressione a demanda agregada ao longo do horizonte de projeções, ou a possibilidade de alteração das metas de inflação ora definidas.
De acordo com o documento, a conjuntura particularmente incerta no âmbito fiscal, com expectativas de inflação se distanciando da meta em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária. “O Comitê avalia que tal conjuntura eleva o custo da desinflação necessária para atingir as metas estabelecidas pelo CMN. Nesse cenário, o Copom reafirma que conduzirá a política monetária necessária para o cumprimento das metas”, afirma.
Os diretores do BC explicaram na ata da reunião que, para atingir as metas estabelecidas, uma vez observada a desancoragem das expectativas, é necessário se manter ainda mais atento na condução da política monetária e assim reduzir o custo futuro da desinflação.
Política fiscal
Para o Comitê, estímulos de demanda devem ser avaliados considerando o estágio do ciclo econômico e o grau de ociosidade na economia, sendo a política monetária a variável de ajuste macroeconômico utilizada para mitigar os efeitos porventura inflacionários da política fiscal.
O Comitê informou ainda que discutiu na reunião os impactos do cenário fiscal sobre a inflação. Segundo essa análise, foi enfatizado que o efeito líquido da condução da política fiscal sobre a inflação é muito dependente das condições macroeconômicas e financeiras vigentes.
“Assim, ao analisar os múltiplos canais, incluindo o movimento nas condições financeiras advindos de juros futuros, e atualizar as hipóteses de trajetória fiscal para incorporar o orçamento sancionado para 2023, o Comitê avalia que as perspectivas para a atividade não tiveram alteração relevante”, comenta a ata.
Alguns membros notaram que as medianas das projeções de déficit primário do Questionário Pré-Copom (QPC) e da pesquisa Focus para o ano de 2023 são sensivelmente menores do que o previsto no orçamento federal, possivelmente incorporando o pacote fiscal anunciado pelo Ministério da Fazenda. “O Comitê manteve sua governança usual de incorporar as políticas já aprovadas em lei, mas reconhece que a execução de tal pacote atenuaria os estímulos fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação.”
Condução da política monetária
O Copom informou ainda que optou novamente por dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente em suas projeções, mas antecipou que, para o próximo trimestre, voltará a utilizar o horizonte usual, referente aos anos-calendário, uma vez que o horizonte de seis trimestres coincidirá com o ano-calendário de 2024, não havendo assim mais efeito direto decorrente das mudanças tributárias no horizonte usual.
O colegiado iniciou seu debate avaliando se a estratégia traçada anteriormente de juros estáveis seria suficiente para a convergência da inflação para suas metas. Para tanto, analisou os principais determinantes da trajetória de inflação e como eles se comportaram no período mais recente.
Sobre o hiato do produto, foi observada uma desaceleração da atividade, do crédito e, mais recentemente, do mercado de trabalho, conforme o comitê já esperava, dadas as defasagens de política monetária. “Nesse sentido, alguns membros ressaltaram que a desaceleração deve prosseguir e é necessária para que os canais de política monetária atuem e ocorra a convergência da inflação para suas metas. Notou-se, ademais, que as perspectivas de crescimento econômico não mudaram significativamente no período recente”, diz a ata da reunião.
Para os diretores do BC, a inflação de serviços tem apresentado moderação, mas segue em nível incompatível com a meta. O foco do Comitê na inflação de serviços se deve ao fato de ela responder à inércia inflacionária e à atividade econômica de forma mais direta, e espera-se que ambos os fatores provoquem menor pressão inflacionária ao longo do horizonte.
Balanço de riscos
No balanço de riscos, a avaliação é que as pressões inflacionárias globais se atenuaram, mas ainda há bastante incerteza sobre como se dará a desaceleração da inflação e tal processo tende a ser não linear. “Os riscos devem persistir enquanto observarmos um mercado de trabalho apertado em várias economias avançadas”, diz o documento.
Do ponto de vista de riscos domésticos, no tema fiscal, há dois conjuntos de riscos que se interseccionam, afirma o relatório da reunião.
Em primeiro lugar, a revisão do arcabouço fiscal diminui a visibilidade sobre as contas públicas para os próximos anos e introduz prêmios nos preços de ativos e impacta as expectativas de inflação.
Em segundo lugar, no que tange aos estímulos fiscais, o Copom seguirá acompanhando seus impactos sobre atividade e inflação e reforça que, em ambiente de hiato do produto reduzido, os impactos sobre a inflação tendem a se sobrepor aos impactos almejados sobre a atividade.
“Alguns membros notaram que a execução do pacote apresentado pelo Ministério da Fazenda deveria atenuar o risco fiscal e que será importante acompanhar os desafios na sua implementação. Por fim, o risco de um hiato do produto mais estreito do que o avaliado persiste e o Comitê seguirá avaliando os dados e os modelos para um entendimento mais minucioso.”
Com relação aos riscos de baixa para a inflação, os preços das commodities internacionais em moeda local se reduziram, mas o Comitê avalia que o risco de desaceleração mais acentuada da atividade econômica global permanece no horizonte, apesar do processo de reabertura da China reduzir, em algum grau, esse risco.
“Nesse aspecto, o Comitê seguirá acompanhando de um lado o processo de retirada de estímulos fiscais e monetários nas economias avançadas e, de outro, o processo de reabertura da China.”
Assim, o Copom afirmou ter optado pela manutenção da taxa de juros, reforçando a necessidade de avaliação, ao longo do tempo, dos impactos acumulados a serem observados do intenso e tempestivo ciclo de política monetária já empreendido.
O Comitê avaliou que, diante dos dados divulgados, projeções e expectativas de inflação, balanço de riscos e defasagens dos efeitos da política monetária já em território significativamente contracionista, era apropriado manter a taxa de juros no patamar de 13,75% a.a.
“O Comitê reforçou que é necessário manter a vigilância, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por um período mais prolongado do que no cenário de referência será capaz de assegurar a convergência da inflação.”
- Haddad afirma que o Banco Central (BC) “poderia ter sido mais generoso” com o governo
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta segunda-feira, 6, que o Banco Central (BC) “poderia ter sido mais generoso” com o governo no comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) que sinalizou incertezas fiscais. Segundo Haddad, a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva herdou uma “situação fiscal delicada” do governo Jair Bolsonaro.
“Nós não vamos em 30 dias de governo resolver um passivo de R$ 300 bilhões que foi herdado do governo anterior. Mas o nosso compromisso é com o equilíbrio das contas e anunciei no dia 2 de janeiro o que vamos perseguir por resultados melhores. E nesse particular eu penso que a nota do Copom poderia ser mais generosa com as medidas que já tomamos. Eu entendo que nós vamos harmonizar a política fiscal com a política monetária”, disse.
Haddad ainda disse crer que o BC, ao citar incertezas fiscais existentes, fazia referência ao que chamou de “legado do governo anterior”.
“Eu creio que o que Banco Central disse faz mais referência ao legado do governo anterior do que as providências que estão sendo tomadas por esse governo. Vamos falar das medidas tomadas no primeiro dia de governo revogando a irresponsabilidade dos 10 últimos dias do governo anterior que tomou cinco medidas desonerando uma série de setores e prejudicando a arrecadação do primeiro ano do governo Lula. Existe uma situação fiscal que inspira cuidados, mas isso é uma herança que temos que administrar”, declarou.
Segundo Haddad, a política fiscal ajuda a política monetária. Além disso, ele declarou que a política monetária ajuda a política fiscal.
“A política fiscal ajuda a política monetária. E não podemos esquecer que a política monetária ajuda a política fiscal. É um organismo com dois braços que têm que trabalhar juntos em proveito do mesmo objetivo”, disse.
Nomes para o BC
O ministro da Fazenda voltou a afirmar que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem a prerrogativa de escolher os nomes que ocuparão as vagas em duas diretorias do Banco Central (BC). Segundo ele, indicações para os postos têm sido feitas, inclusive pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto. Entretanto, Haddad afirmou que o papel dele e Campos Neto é levar nomes que possam ser escolhidos por Lula.
Os mandatos do diretor de Política Monetária, Bruno Serra, e do diretor de Fiscalização, Paulo Souza, vencem em 28 de fevereiro.
“Estamos recebendo, inclusive do presidente do BC, nomes que possam ser avaliados pelo presidente da República. A lei de autonomia deixa claro que é prerrogativa do presidente da República a indicação dos nomes. Nosso papel é levar ao conhecimento do presidente Lula os melhores nomes disponíveis para que ele possa eventualmente escolher”, disse.
Segundo Hadad, ele e Campos Neto já conversaram algumas vezes sobre nomes para os postos, que serão técnicos.
“Eu já conversei várias vezes com o presidente do BC sobre nomes técnicos, como sempre foi a nossa prática. Em todo o período que estivemos à frente dos governos, nós sempre indicamos para as diretorias do BC nomes técnicos que tenham condição de cumprir da forma mais apropriada os deveres e as competências do cargo que será ocupado”, disse.
- Ata da reunião do Copom do BC menciona pontos importantes do trabalho do governo e é mais amigável
A ata da reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central divulgada nesta terça-feira menciona pontos importantes do trabalho do governo e é mais amigável, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
“A ata veio melhor do que o comunicado (divulgado na última semana), uma ata mais extensa, mais analítica, colocando pontos importantes sobre o trabalho do Ministério da Fazenda, uma ata mais amigável em relação aos próximos passos a serem tomados”, disse em entrevista a jornalistas.
O ministro afirmou ainda que apresentará em fevereiro ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva uma “boa reforma” de instrumentos de crédito.
- BC comenta que pacote fiscal anunciado pelo ministro da Fazenda, pode ter um efeito benigno para as expectativas de inflação
Um aceno de trégua foi dado nesta manhã pelo Banco Central na divulgação da Ata do Copom, que detalhou as discussões do encontro realizado nos dias 31 de janeiro e 1° de fevereiro, quando o colegiado decidiu manter a taxa básica de juros em 13,75%. No parágrafo 16 da Ata, o BC comenta explicitamente que o pacote fiscal anunciado no mês passado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode ter um efeito benigno para as expectativas de inflação.
“O Comitê manteve sua governança usual de incorporar as políticas já aprovadas em lei, mas reconhece que a execução de tal pacote atenuaria os estímulos fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação”, diz o trecho do comunicado.
Uma prova disso, segundo a ata, é que alguns membros da diretoria do BC notaram na reunião que as medianas das projeções de déficit primário do Questionário Pré-Copom (QPC) e da pesquisa Focus para o ano de 2023 são sensivelmente menores do que o previsto no orçamento federal, possivelmente incorporando os possíveis resultados do pacote.
No Boletim Focus da última segunda-feira (6), a projeção de déficit primário para este ano foi mantida em -1,10%. Há quatro semanas, a projeção estava em -1,20%.
A comunicação da Ata, portanto, veio um tom abaixo do comunicado pós-decisão do Copom, que deu ênfase no balanço de riscos à “elevada incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e estímulos fiscais adicionais que impliquem sustentação da demanda agregada, parcialmente incorporados nas expectativas de inflação e nos preços de ativos”.
O recado duro foi mal-recebido tanto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como pela equipe de Haddad. Lula aumentou as críticas à política monetária. Havia um temor no mercado que as tentativas de diálogo entre os formuladores das políticas fiscal e monetária tinham voltado à estaca zero.
Provas disso foram constantes. Ontem, durante a posse de Aloizio Mercadante na presidência do BNDES, Lula disse não haver justificativa para uma taxa de juros tão ata e chamou de “vergonha” tanto o aumento de juros como a explicação que o BC tem dado à sociedade. Ele ainda reforçou o questionamento à autonomia do BC.
Haddad, por sua vez, foi um pouco mais comedido, mas afirmou também na segunda-feira (6) que o BC “poderia ter sido mais generoso” com o governo no comunicado do Copom, uma vez que a atual gestão herdou uma “situação fiscal delicada” do governo Jair Bolsonaro.
Mirella Hirakawa, economista da AZ Quest, viu essa sinalização de trégua na ata do Copom, embora o foco na desancoragem das expectativas tenha sido mantido. “O BC comenta que seu cenário base é mais conservador. Mas deixa claro que existe um risco de um cenário mais benigno, caso o anúncio feito pelo Ministério da Fazenda se materialize. Essa ressalva clara é muito importante”, comentou.
Informações Infomoney